Michael Phelps: o Tarzan volta à selva

O maior colecionador de medalhas da história passou os trials americanos e assegurou a quinta presença nos Jogos Olímpicos. No Rio 16 vai participar nos 200m estilos, 200m mariposa e 100m mariposa. Dos 15 aos 31 anos, vão 22 medalhas e cinco recordes mundiais. Foi ao fundo e voltou

Michael Phelps: o Tarzan volta à selva

ohnny Weissmuller conquistou cinco medalhas de ouro nos Jogos Olímpicos de 1924 e 1928. O atleta, nascido ainda no império austro-húngaro e de ascendência alemã, estabeleceu 67 recordes mundiais de natação e ganhou 52 campeonatos nacionais – é ainda hoje considerado um dos melhores nadadores de todos os tempos. Mas seria a sua viagem para os Estados Unidos e o cinema a darem-lhe (ainda) mais fama quando, em 1934, imortalizou no cinema a personagem de Tarzan. O cinema transformou Tarzan, já conhecido através dos romances de Edgar Rice Burroughs, num mito universal e deixou Weissmuller feito uma estrela planetária: fez doze filmes como o homem da selva e celebrizou um dos mais famosos gritos do cinema (oh-oh-oooooooooooooooooooh).

Quase cem anos depois a história esteve quase a repetir-se. No novo filme “A Lenda de Tarzan”, Michael Phelps, o maior colecionador de medalhas da história, foi o nome escolhido para interpretar a personagem principal. O produtor Jerry Weintraub acreditava que o melhor nadador de sempre era a pessoa ideal para viver Tarzan na mais recente adaptação. Seria uma espécie de encerrar de ciclo com o novo Weissmuller. Novamente, seria um atleta (e de natação) a ficar com o papel. Só que a participação de Phelps no “Saturday Night Live” desanimou Weintraub, achou que o nadador americano não tinha jeito absolutamente nenhum, e desistiu de Phelps. “Por que é que ninguém me disse que ele não prestava?”, perguntou o produtor ao final de dois minutos de visionamento.

Entretanto Weintraub morreu (com 77 anos), Alexander Skarsgård ficou com o papel e Michael Phelps voltou aos mergulhos. Mas mesmo assim não saiu da televisão, das notícias. A sua vida dá um filme (não sobre Tarzan mas sobre ele próprio).

Não é a primeira vez que a vida parece pregar uma partida a Phelps. Nunca nenhum nadador passou tanto tempo debaixo dos holofotes como ele, com tanto dinheiro e atenção global. A sua experiência nas piscinas passou por um momento dramático em 2014 quando, um ano depois de ter regressado à competição após a queda a seguir aos Jogos de Londres 2012, deu entrada num centro de reabilitação para ser tratado depois da sua segunda detenção por ter sido apanhado a conduzir embriagado. No primeiro dia de tratamento, contou depois, enquanto via televisão com os outros doentes – todos sem saberem quem ele era – apareceu o seu nome no rodapé do ecrã com a notícia a dizer que ele dava entrada num estabelecimento de recuperação.

“Eu fiquei ‘Yeah, that’s me’”, sim sou eu, confessou Phelps. Agora, com 31 anos, saiu do buraco para atingir de novo a glória. Conseguiu a qualificação para os próximos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, será a sua quinta presença. O nadador de Baltimore (quebrou também 37 recordes mundiais), ultrapassou a suspensão que lhe foi imposta pela federação americana em 2014 – esteve castigado seis meses – falhou os Mundiais de 2015 em Cazã, na Rússia, e esteve prestes a abandonar de vez a natação. Nem ele próprio pensou que conseguiria permanecer ao mais alto nível depois dos 30 anos.

Para trás está toda uma história de sucesso ao estilo de Hollywood. Os Jogos Olímpicos de 2004 e 2008 mostraram-no ao mundo com um combinado de 14 medalhas de ouro e duas de bronze – o recorde de oito ouros em Atenas destronou o recorde de sete de Mark Spitz. Foi aí que Phelps começou a ficar cada vez mais isolado, era um homem só. “Estava tão focado que só treinava, comia e ia para o seu quarto. Era ele praticamente sozinho a preparar-se para conseguir aquilo que nunca ninguém tinha conseguido”, conta Bob Bowman, o homem que está à frente da equipa olímpica masculina de natação dos EUA e treinador de Phelps há muitos anos.

Em 2012 apareceu em Londres e ficou com quatro medalhas de ouro e duas de prata. Saiu carregado de glória, mas cansado e à beira do fim (Phelps chamou-lhe “a really dark place”, um sítio bastante negro). Entrou em rotura, desistiu, entregou-se ao álcool. Até esta semana, depois de um largo deserto. Nos trials americanos de qualificção aos Jogos do Rio – venceu todas as provas em Omaha. Nos 100m mariposa acabou com 51 segundos, ficou à frente de Tom Shields e Seth Stubblefiend por 20 e 24 centésimos. Venceu esta prova pela terceira vez consecutiva nos trials desde 2008, mas a sua marca não o deixou satisfeito. Porque sabia os tempos dos rivais nos Mundiais a que não pôde estar presente, há um ano e meio, ficaram abaixo: o sul-afircano Chad le Clos (50,56s), o húngaro Laszlo Cseh (50,87s) e Joseph Schooling de Siungapura (50,96s) baixaram todos dos 51s.

Phelps sabe que consegue fazer melhor. Para já mostrou-se ao mundo com a sua quinta presença nos Jogos Olímpicos, feito nunca antes alcançado por um nadador masculino. Competiu pela primeira vez em 2000, aos 15 anos. Quando chegar ao Maracanã daqui a cinco semanas terá 31 anos – o seu filho Boomer nasceu há dois meses e está mais próximo da idade de Phelps quando se estreou nos Jogos de Sydney do que o próprio Phelps. Como vencedor de 22 medalhas olímpicas, 18 de ouro e detentor de recordes do mundo em cinco provas, é o mais condecorado olímpico de sempre e sairá como o maior atleta olímpico de sempre. Agora volta à selva, não para fazer de Tarzan, mas de Phelps.