Seleção: houve taça, festa, Nani e Bernardo. E alguns rapazes do outro lado

Gibraltar não era um opositor complicado: Portugal sabia-o e jogou ao mesmo ritmo pachorrento. Quando acordou, chegou o bom futebol e os golos – vieram de mãos dadas

“Não somos 11, somos 11 milhões!” Tantas vezes repetida entre junho e julho, a frase nunca sai da cabeça – e se calhar, nunca irá sair. Tal como o “hino” não oficial, mas oficialmente de todos os portugueses desde a fase final do Europeu de França: o tal do “Pouco importa, pouco importa.” Eles cantaram, eles prometeram e eles cumpriram: a Taça veio mesmo e foi levantada por Nani ainda antes do apito inicial, perante um Bessa em apoteose. No relvado, ostentando o símbolo de campeão europeu no centro da camisola, os jogadores fizeram questão de respeitar o cântico celebrizado em França: perante um adversário honesto, mas modesto, a exibição foi do aborrecido ao cintilante. O resultado, esse, voltou a ser positivo. E é assim que nós gostamos.

Prémios para quase todos Sempre altruísta, Fernando Santos elaborou um onze pleno de escolhas para o prémio. De peito feito após chegar ao Chelsea, Eduardo mereceu a titularidade após passar mais de um mês a fazer bom balneário em França. João Cancelo, a maturar em Valência há dois anos, “roubou” o lugar ao consagrado Cédric, com Bruno Alves em detrimento de José Fonte, que tem andado com a cabeça à roda – o sonho de se juntar a José Mourinho no Manchester United não passou disso mesmo: um sonho. Quaresma voltou a assumir o lugar de Cristiano Ronaldo, como fez – e muito bem – na final de França, e o herói nacional só podia ser titular. Nunca é demais dizê-lo: obrigado, Éder! Agora, voltemos ao jogo.

Fé em deus e chuta, Éder A ala direita começou cheia de fé. Quaresma com o toque habitual, Cancelo com a pica própria de um estreante que quer ficar de vez. Ao primeiro corte, os gibraltinos mostraram ao que vinham: no seu meio-campo defensivo, e virado para a linha lateral, Payas chutou sabe Deus para onde. No seguimento da jogada, Quaresma cruzou e Éder assustou o defesa, que limpou para canto. As bancadas quase foram abaixo logo ali.

Foi assim, aliás, em qualquer lance onde o avançado interveio – inclusive naquele, aos 30’, onde atirou para o terceiro andar das bancadas quando tinha a baliza escancarada –, com o público a recriar o imortal “Chuta, Éder!”. O estado de graça do avançado nascido na Guiné-Bissau mantém-se – até um calcanhar tentou –, e só um cataclismo (leia-se, uma série de terríveis exibições) o fará desaparecer. Quem diria há três meses…

Poucos fogos para apagar Por esta altura, falta dizer que na baliza de Gibraltar estava um herói. Mas verdadeiro, daqueles que salvam vidas e assim: é que Jordan Pérez é bombeiro de profissão. Ontem, porém, o guardião de 29 anos nem teve de se esforçar assim tanto: basta dizer que, aos 25 minutos, Portugal tinha oito remates efetuados… mas nem um à baliza adversária. E eis que do céu – literalmente – caiu o golo: um chutão para o ar de Bruno Alves encontrou Nani sem marcação e o homem do Valência, ontem capitão, nem hesitou. No remate e no salto mortal pelo qual tem tanto apreço.

Da primeira parte, ficou mais um canto direto de Quaresma que quase entrava, uma carambola de Éder ao poste e uma boa intervenção de Pérez a remate de William Carvalho – sim, ele subiu no terreno e fez mesmo um remate.

Deixem passar o gang dos Silvas Para a segunda parte, apareceram três novos guerreiros. Adrien Silva, Bernardo Silva e André… adivinhou: também é Silva. O hino começou a entoar nas bancadas do Bessa, enquanto no relvado se sucediam os hinos saídos dos pés de Bernardo, o tal que falhou a glória por lesão. Como ao minuto 55’, quando fez um cruzamento mais que perfeito para Nani – o penteado do capitão fez o resto. 2-0 e já chega. Não, afinal ainda há mais: aos 73’, Cancelo correu pelo flanco direito e, assistido por André Silva, fuzilou o frágil suplente que agora guardava a baliza de Gibraltar. Estreia de sonho.

Antes, o milagre deu-se: os gibraltinos remataram. Se é que se pode chamar remate ao que Yome fez, depois de trocar por completo as voltas a Bruno Alves. A alegria durou pouco: um remate frouxo de Bernardo Silva encontrou as mãos ainda mais frouxas do guarda-redes Robba. 4-0. Mas ainda não chegava: de cabeça, e já sem qualquer discernimento do outro lado, Pepe aumentou sem dificuldades. Agora sim: 5-0, está feito.