Medina Anti-Trump compra nova guerra

Fernando Medina continua a gerar polémicas. Acusado de provocar o caos no trânsito por causa das obras na cidade, está agora a ser criticado pelos outdoors afixados na zona da Expo, à boleia da Web Summit em Lisboa

O presidente da Câmara Municipal de Lisboa envolveu-se em nova polémica, para já circunscrita às redes sociais, com a oposição de direita, PSD e CDS. Depois das críticas às obras em curso na cidade e da anulação do concurso para remodelação da Segunda Circular, chegou a hora dos outdoors. No dia em que o mundo ficou a saber que Donald Trump foi eleito 45.o presidente dos Estados Unidos, Fernando Medina mandou fazer e afixar pela cidade 25 cartazes, em inglês, nos quais se diz que em Lisboa se constroem pontes, e não muros.

Os críticos leem nesta frase uma alusão indireta à polémica declaração do presidente eleito dos EUA quando, ainda em campanha eleitoral, anunciou que, caso fosse eleito, iria mandar construir um muro na fronteira com o México para impedir a entrada de ilegais no país. Nos cartazes pode ler-se a mensagem: “In the free world you can still find a city to live, invest and build your future. Making brigdes, not walls. We call it Lisbon #startupinlisbon (“Num mundo livre ainda pode encontrar uma cidade onde viver, investir e construir o seu futuro, construindo pontes e não muros. Chamamos-lhe Lisboa”).

À parte o erro ortográfico, entretanto corrigido, na palavra “bridges” – e não “brigdes”, como aparecia escrito no cartazes –, vereadores do PSD e CDS criticam a oportunidade e o teor de uma mensagem que foi colocada na zona da Expo onde decorreu, até ontem, o evento Web Summit, que trouxe a Lisboa várias dezenas de milhares de estrangeiros.

O vereador do PSD António Prôa nem quer acreditar que Medina tenha desenhado a mensagem como uma crítica à eleição democrática do novo presidente dos Estados Unidos da América. “Prefiro pensar que se trata de interpretação abusiva e que a intenção de Medina não foi a de desrespeitar a escolha democrática do povo americano, que não foi uma demonstração de arrogância ideológica, que não foi uma precipitação oportunista em resultado do deslumbramento pela atenção internacional”, escreveu Prôa no Facebook. O vereador social-democrata defende que o presidente da câmara venha “esclarecer” a intenção dos cartazes.

Isto porque Prôa diz que Lisboa tem de ser uma “cidade que respeita a democracia, para além dos humores”.

O vereador do CDS, João Gonçalves Pereira, também não gostou da campanha e disse lamentar que sejam “os lisboetas a pagar estas criancices de Medina”. “Medina cria uma polémica para tirar atenção às inúmeras queixas contra todas estas obras – ao mesmo tempo – que ele inventa para a Cidade”, defende Gonçalves Pereira no Facebook, num post que não poupa sequer as falhas ortográficas dos cartazes.

“Entendo que criar gratuitamente conflitos diplomáticos é pura criancice…. e devia haver maior cuidado e rigor quando se escreve em inglês: ‘brigdes’ não existe”, avisa o vereador do CDS na sua conta no Facebook.

 

mensagem com atualidade O pedido de Prôa ficou, para já, sem resposta do presidente. Contactado pelo i, Fernando Medina disse que não fazia qualquer comentário a este caso. Mas o departamento de comunicação do município já respondeu: “Os cartazes e esta mensagem têm em conta a Web Summit e o posicionamento de Lisboa face ao mundo. Uma mensagem que tinha atualidade a semana passada e tem atualidade para o futuro. Lisboa tem orgulho na sua longa história como ponto de encontro de culturas, povos e religiões, e posiciona-se hoje como uma cidade cosmopolita, aberta e tolerante”, lê-se numa resposta enviada ao i.

Na mensagem lembra ainda uma passagem do discurso de Fernando Medina na abertura da Web Summit, ainda antes das eleições americanas: “Estamos muito conscientes dos riscos do que se passa no mundo, do que se passa em França, do que se passa na Grã-Bretanha, do que se passa nos EUA com as eleições. Sabemos os riscos de uma sociedade fechada. A primeira baixa numa sociedade fechada é a inovação; as primeiras vítimas de uma má política são precisamente aquilo que todos vocês representam.”

Para o gabinete de comunicação da câmara, “os muros são uma referência aos sinais políticos de isolamento e protecionismo acima referidos. A campanha já estava pensada, o resultado das eleições reforçou a sua oportunidade”.

Por último, confirma que foram produzidos 25 pequenos outdoors e três telas de três metros.

Por sua vez, o vereador independente José Sá Fernandes começou por dizer que desconhecia a situação, mas acabou por considerar que o objetivo da mensagem “não foi, com certeza”, uma crítica à eleição de Trump. “É muito pouco provável”, acentuou.

esquerda não comenta Do lado dos vereadores do PCP e do “Movimento Cidadãos por Lisboa” também não houve disponibilidade para comentar o cartaz e a mensagem ali inscrita.

O grupo municipal do Bloco de Esquerda também disse ao i que não fala sobre o tema. Já Pedro Sales, assessor da Câmara de Lisboa, comentou a situação através da sua página no Twitter. “Foi construído um muro (literal) em Calais entre França e Inglaterra, o Brexit é um muro, como é que entendem o cartaz [da] CML apenas como Trump?”

O politólogo André Freire publicou um post em que deixa uma alerta ao centro-esquerda: “É precisamente por andarem só com conversas de startups e de websummits, e todo esse linguajar trendy…, descurando completamente falar para (…) as classes baixas (…), que o centro-esquerda tem aberto o flanco ao triunfo da direita radical, na América como na Europa.”

O presidente da concelhia do PSD de Lisboa, Mauro Xavier, deixou também uma mensagem na sua conta no Facebook: “Um dia, Fernando Medina aprenderá a colocar os Lisboetas Primeiro. Hoje não foi o dia. Felizmente, faltam menos de 330 dias para termos um Presidente que o faça! Vindo de um presidente não eleito, questionar a eleição noutro país não me parece sensato.”

O antigo dirigente do PS António Galamba, crítico da atual liderança do PS, escreveu na sua página: “Há uma coisa chamada Democracia, em que os Povos se pronunciam sobre as lideranças e o seu futuro. Por regra, quem ganha governa.”

Com Margarida Davim