A pós-verdade é fácil de condenar quando se fala da América de Trump, mas no nosso Portugal paroquial, o querer descobrir a verdade é coisa de forças interessadas em conspirar contra o Governo. É natural que militantes mais excitados embarquem em teorias da conspiração, até porque a busca da verdade não é um valor nacional – é preciso reconhecê-lo.
Temos exemplos recentes: depois de várias trapalhadas sobre Sócrates terem já vindo a lume na imprensa, o grosso do PS preferia ignorar as suspeitas, quase entoando em coro o poema de Sophia ao contrário: «Não vemos, não ouvimos, não lemos/Podemos ignorar».
Em sequência do regresso da polémica sobre as responsabilidades de Mário Centeno relativamente à isenção da entrega de declarações de rendimentos e património dos gestores da Caixa, um académico, investigador do Instituto de Ciências Sociais, autor da História Económica de Portugal, Pedro Lains, escrevia o seguinte no Facebook: «Com os 2,3, Mário Centeno deu a volta a tudo e todos, PSD, jornalistas, OCDE, tudo (ao FMI não, que esse sabia mas não dizia). Agora, claro, é alvo a abater. Domingues foi a primeira arma de arremesso. O resto, vai-se inventado, com mais ou menos jeito, à la Fox News. Estamos nisto. É pena que os meios de comunicação façam oposição. Mas é assim. Paciência».
Infelizmente, Pedro Lains é um retrato das nossas elites, que se consolarão sempre com os factos alternativos se vierem do seu campo político, enquanto rasgarão as vestes contra os seus adversários. Jornalismo que questione as falhas do seu campo político é sempre «oposição». Cada país tem o que merece. É uma pena que as nossas elites desvalorizem os valores da ética e verdade. Mas é assim. Paciência. Aliás, o caso Sócrates explica-se em parte por este karma nacional.