Robôs vão pagar imposto?

A automação e inteligência artificial no mercado de trabalho são uma realidade crescente. A robótica tem estado a substituir pessoas, o que coloca vários desafios às sociedades.

O trabalho feito por robôs é uma realidade crescente. De acordo com a consultora de tecnologia Gartner, até 2025 um em cada três empregos terá sido substituído por robôs ou inteligência artificial. Esta perspetiva cria pressão sobre a sociedade, quer em termos de emprego quer por exemplo em termo da sustentabilidade da segurança social.

Há quem defenda a taxação das empresas que substituem humanos por robôs. Mas estas dizem que a introdução da automação tem criado empregos. O Parlamento Europeu considera que a ascensão dos robôs deve ser regulada, mas rejeita impostos para financiar a formação de quem tenha perdido o emprego para os robôs.

Numa entrevista recente ao Quartz, Bill Gates defendeu esta opção, argumentando que os impostos sobre os robôs poderiam financiar empregos para cuidar de idosos ou trabalhar com crianças nas escolas, funções para as quais as necessidades são maiores que a oferta e para os quais os humanos têm especial apetência. 

«Devemos estar dispostos a aumentar os impostos ou mesmo a reduzir a velocidade» da automação diz o co-fundador da Microsoft Gates. 

Ao SOL, Pedro Rocha Silva considera que a posição de Gates «terá de ser entendida como um aviso à navegação» na perspetiva em que a sociedade «terá de encontrar novas formas de ocupar as pessoas cujas funções poderão vir a deixar de ser necessárias». 

O partner da Neves de Almeida lembra que o emprego já passou por «várias (r)evoluções no passado, em que inúmeras funções que eram desenvolvidas por humanos passaram a sê-lo por máquinas e por computadores, e isso não implicou que se tivesse de taxar o uso dessas máquinas ou computadores». 

O gestor da consultora de recursos humanos acrescenta ainda que a evolução criou  «inúmeras novas funções que anteriormente não existiam e essas sim continuaram a ser taxadas».

Criação de empregos

Um estudo da Metra Martech revela que a robótica será uma das principais responsáveis pela criação de empregos em indústrias como por exemplo a eletrónica de consumo ou a energia solar e eólica. «Em termos mundiais, não existiriam três a cinco milhões de empregos se a automação não tivesse sido desenvolvida e permitido a redução dos custos de produção de milhões de produtos eletrónicos», lê-se no relatório da consultora  e citado pela Federação Internacional de Robótica (IFR). 

Segundo o estudo, «a robótica vai progredir nos serviços, em especial nos cuidados de saúde, nos quais as populações em envelhecimento vão precisar de apoio», argumenta o estudo.

No entanto, nesta temática há  ainda uma «outra questão que é a definição de robótica», diz Carlos Pereira Silva ao Sol. «São só os robots que têm mobilidade ou também todas as formas automáticas de substituição de trabalho humano por tecnologias?», questiona o professor. 

O especialista em Segurança Social dá como exemplos a «automatização das fábricas de automóveis, os call centers, a automatização das comunicações, dos serviços bancários, as caixas automáticas dos supermercados» para perguntar se «são ou não robótica?».  

O professor de Economia e Finanças aponta que a ideia de Bill Gates «faz sentido» mas que «é preciso ter em conta que ao pagar a contribuição sobre o produto gerado pelo robô esta é destinada a financiar a eventualidade de velhice» e  pergunta como serão financiadas «outras eventualidades como «invalidez, morte e sobrevivência e desemprego». O professor universitário lembra que o «robô não morre, não se invalida,  não fica desempregado, nem tem filhos».

Sobre a pressão deste desenvolvimento na Segurança Social, o especialista considera que esta «já se põe atualmente» e dá o exemplo de «empresas de trabalho intensivo que pagam contribuições calculadas sobre os salários dos trabalhadores comparadas com as empresas de capital intensivo cujo valor acrescentado é gerado, na sua maior parte, por máquinas automatizadas». Também Pedro Rocha Silva alerta que «a pressão não advém do desenvolvimento tecnológico, mas antes de outros temas que se prendem com aspetos mais estruturais da sustentabilidade da Segurança Social». 

Alteração profunda

O partner da Neves de Almeida    considera que a inteligência artificial «virá alterar profundamente a forma como trabalhamos, eliminando muitas funções até hoje desempenhadas por pessoas e que poderão ser assumidas com ganhos de produtividade e redução de custos por outras vias». Ao mesmo tempo cria «novas oportunidades e novos mercados que antes não existiam». 

Carlos Pereira Silva considera que, para o mercado de trabalho, «o perigo é não acompanhar o desenvolvimento da tecnologia e da robótica a fim de manter artificialmente o emprego» e que o grande desafio está em «preparar com antecedência a sociedade para um mundo com melhores produtos, melhores serviços, melhores empregos e maior bem estar». 

Já o gestor da consultora de Recursos Humanos aponta que «os perigos surgirão se não houver um ajustamento natural da sociedade e da economia às oportunidades que seguramente irão aparecer, como têm aparecido em todas as evoluções verificadas até agora». 

Sobre o papel do Estado no processo, o gestor defende que «deve estar atento e vigilante, procurando criar soluções para que o avanço tecnológico prossiga». 

Legislação

A ideia de taxar as empresas donas dos robôs para financiarem os seus empregos não é académica. Na semana passada o Parlamento Europeu  (PE) votou para que a Comissão Europeia produzisse legislação para regular a ascensão dos robôs, incluindo um enquadramento ético para o seu desenvolvimento e a definição de responsabilidades sobre as ações dos robôs. 

No entanto, os eurodeputados rejeitaram a proposta para a criação de um imposto sobre as empresas de inteligência artificial   para financiar a formação de pessoas que perderem o seu emprego para um robô.  A resolução –  que teve os votos favoráveis de 396 eurodeputados, 123 contra e 85 abstenções – é um a recomendação para a Comissão Europeia.  Esta não é obrigada a acatá-la mas tem de justificar porque o faz.  

«A UE tem de assumir a liderança na definição destes padrões para não ter de seguir aquelas que outro países estabeleçam», argumenta o PE em comunicado, citado pela agência Reuters. 

A decisão foi aplaudida pela indústria da robótica, que diz que um impostos destes iria paralisar a inovação.  Já Bill Gates defende que as empresas devem pagar impostos pela utilização robôs precisamente como forma de atrasar temporariamente a ascensão da automatização . 

A FIR «acredita que a introdução de um imposto robô teria um impacto muito negativo na competitividade e emprego». A federação realça a  correlação entre a densidade dos robôs e o emprego nos países industrialmente desenvolvidos, como por exemplo a indústria automóvel alemã. 

As estatísticas maia recentes da FIR revelam que o comércio global de robôs industriais aumentou 15% em 2015 e valia mais de 45 mil milhões de euros.  A procura de robôs para serviços médicos, domésticos e pessoais está também a aumentar.