A Associação Mutualista Montepio Geral, dona a 100% do banco, não vai para já sofrer qualquer alteração legislativa para alterar o seu estatuto de forma a retirar a supervisão do Ministério do Trabalho para a Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (antigo Instituto de Seguros de Portugal).
A garantia foi dada pelo ministro das Finanças e acaba por contrariar as declarações do ministro Vieira da Silva que esta semana já tinha admitido que a mudança de tutela da dona do Montepio estava a ser estudada. «Essa dimensão está a ser estudada pelo ministérios responsáveis e quando o governo tiver que tomar uma decisão tomará essa decisão, se for necessário haver alguma mudança», garantiu o ministro.
Um impasse que poderá prejudicar os mais de 360 mil associados que têm investido 3500 milhões de euros em produtos de poupança da associação. O número foi avançado ao SOL pelo vogal do conselho geral e de supervisão do Montepio, Eugénio Rosa.
Isto porque grande parte desse investimento está canalizado em produtos mutualistas que não estão salvaguardados pelo Fundo de Garantia – que protege aplicações até 100 mil euros por depositante – e outra parte em produtos de capitalização. Ou seja, em caso de falência da associação esses investimentos estarão seguros apenas pelas reservas da associação.
Um risco considerado demasiado elevado pelo economista porque acredita que as reservas poderão não existir por estarem a ser mal aplicadas. «O problema da Associação Mutualista não é ter reservas, é saber como é que elas estão a ser aplicadas. Se estiverem mal aplicadas pode haver um dia em que não há reservas nem o capital investido para os mutualistas», confessa.
Eugénio Rosa crítica ainda a falta de supervisão que tem existido por parte do ministério de Vieira da Silva e que também ocorreu no mandato anterior com Mota Soares. Essa ausência de fiscalização leva, no seu entender, a que a associação esteja «em autogestão e sem prestar contas a ninguém, nem mesmo aos seus associados».
Um problema que também é admitido pelo economista Filipe Garcia, ao admitir que a Associação Mutualista poderá ter problemas sérios de liquidez se existir uma desconfiança maior por parte dos mutualista. «Ainda não houve uma séria corrida aos produtos porque muitos deles têm fortes perdas, incluindo de capital e, por isso mesmo, muitos dos investidores estão à espera do que vai acontecer ou simplesmente à espera que o prazo desses produtos termine daqui a um, dois ou três meses», refere ao SOL.
Lesados do Montepio
Mais chocado com a situação que vive o Montepio está João Duque ao referir que não fica espantado «se daqui a um tempo começarmos a ouvir falar dos lesados do Montepio», se nada se fizer. Daí considerar que é urgente mudar a supervisão dos produtos mutualistas por considerar que não faz sentido ser o ministério de Vieira da Silva a tutelar esta entidade.
«O que me arrepia é termos uma instituição como a associação mutualista que tem instrumentos financeiros que são colocados nos balcões do Montepio e são supervisionados pelo Ministério do Trabalho e da Segurança Social. Isso mete-me muita impressão», confessa João Duque ao SOL, acrescentando ainda que «isso é espantoso e inaceitável. Tirem-me novamente deste filme», refere.
Ainda assim, o economista admite que a hipótese de mudar agora de tutela já parece ser uma medida tardia. «Vão mudar agora para fazerem melhor as contas às perdas?», questiona.
A juntar a estes problemas há que contar ainda com a acusação feita a Tomás Correia pelo Banco de Portugal (BdP) de ter financiado o Grupo Espírito Santo (GES) quando a instituição bancária já apresentava notórias dificuldades financeira, juntamente com mais oito antigos responsáveis do Montepio Geral/Caixa Económica.
Perante esta acusação Tomás Correia recusa demitir-se do cargo e garante que vai levar o seu mandato até ao fim. Ainda assim, «se alguma vez se colocar a possibilidade de transitar em julgado algo a meu desfavor, em qualquer tribunal, quaisquer atos ilícitos», abdicará. No entanto, afirma que está «profundamente convicto e seguro de que isso não vai acontecer».
Segundo o BdP, o processo resulta da infração de regras de concessão de crédito e de irregularidades a nível de controlo interno, bem como de normas e limites no financiamento a partes relacionadas.
Aumento de capital
Mas se o cenário não é animador para a dona do banco, para a instituição financeira também não é melhor. Filipe Garcia admite que a Caixa Económica venha a necessitar urgentemente de aumentar o capital, contrariando as declarações do presidente do banco Félix Morgado, ao garantir que o Montepio tem capital assegurado até ao final do ano. «Acho muito difícil que se aguente assim até ao final do ano, acredito mais que vá necessitar de injetar capital nos próximos meses», revela.
Para o economista, a ideia de transformar a Caixa Económica em sociedade anónima é já a pensar nisso. Desta forma, a instituição liderada por Félix Morgado poderá ter novos investidores.
A verdade é que a ideia da transformação numa sociedade anónima já era antiga. A hipótese chegou mesmo a ser colocada quando foi criada, ainda pelo anterior executivo, a legislação que aprovou o novo regime jurídico das caixas económicas.
Já em 2015, altura em que assumiu a presidência do Montepio, Félix Morgado admitia que ter mais acionistas era uma «vantagem» para a instituição financeira. Ainda assim, defendeu que o objetivo era ter sempre «a melhor performance possível» e que estavam em aberto todas as possibilidades.