Marcas que ficaram para a história mas que não sobreviveram no mercado

Há muitas marcas que tocaram gerações mas acabaram por desaparecer pondo fim à sua comercialização. Ainda assim, há ícones que continuam a sobreviver e a existir na memória de muitos portugueses

As marcas dependem de modas e de ciclos, mas se algumas sobrevivem “a quase tudo”, outras não têm o mesmo sucesso. Daí termos assistido, nos últimos anos, ao desaparecimento de várias marcas portuguesas que ditaram modas e atravessaram o imaginário de muitas gerações. Quem não se lembra das canetas de feltro Molin, das motas Casal, das calças de ganga Mako Jeans ou dos jipes UMM?

Mas se há marcas que desapareceram, há outras que reaparecem ou sobrevivem porque se transformaram em “ícones da identidade portuguesa”, assegura Carlos Coelho, presidente da Ivity Brand Corp. Exemplos não faltam, dos chocolates Regina à pasta de dentes Couto. Representam um negócio residual em termos de volume, mas significam um “movimento muito importante no plano da recuperação da identidade”, explica o especialista em criação e gestão de marcas.

O responsável lembra ainda que para assistirmos a este “renascimento” as marcas têm de ser suficientemente fortes para permanecerem no mercado e ter simultaneamente abertura para “ir buscar ao passado alguns pilares para o futuro”. Essa “retromania”, no entanto, só acontece em momentos muito especiais, avisa o especialista. “Geralmente ocorre em períodos de crise de identidade, quando queremos encontrar-nos com a nossa zona de conforto. Mais que uma questão de moda é um recuo de identidade e uma busca de ícones passados”, salienta.

Orgulho nacional Há também uma geração mais nova que tenta reconciliar-se com o passado: “Estamos a assistir ao renascimento de um certo orgulho nacional.” Na maior dos casos, porém, o consumo acaba por ser feito pelo objeto e não pelo produto, esclarece Carlos Coelho.

Foi a pensar nesse nicho de mercado revivalista que Catarina Portas investiu no projeto A Vida Portuguesa. Presente em várias lojas em Lisboa e no Porto, aposta na oferta de produtos portugueses antigos. “Aqueles que conhecemos há várias décadas, aqueles que mantiveram as suas embalagens originais ou ainda se inspiram nelas, aqueles que ainda se fabricam com uma dose importante de manufatura”, lê-se no site da empresa.

Nestas lojas é possível encontrar um sortido de produtos que, mais que úteis, são bilhetes para uma viagem de regresso à infância: sabonetes Ach. Brito e Confiança, andorinhas Bordalo Pinheiro, lápis Viarco, cadernos Emílio Braga e Serrote, entre muitos outros artigos.

“Nascemos a acreditar que os produtos antigos portugueses têm futuro. As inúmeras lojas que hoje, por todo o país, se inspiram no nosso conceito e redescobrem as marcas antigas portuguesas são a prova de que estávamos certos. Ainda bem, pois alargar o mercado e garantir a sobrevivência destas fábricas foi sempre o nosso objetivo primeiro”, remata a empresa.

Moviflor

Em 2014 a marca ameaçou desaparecer para sempre. A Moviflor declarou insolvência, em novembro de 2014, mas antes disso já tinha apresentado oito pedidos de insolvência, mesmo depois de ter recorrido ao processo especial de revitalização (PER). Mas apesar dos problemas financeiros, o recheio das lojas, material de armazém, camiões e empilhadores acabaram por ser leiloadas para ajudar a pagar as dívidas deixadas pela empresa, rendendo cerca de 330 mil euros, muito aquém do valor desejável para pagar dívidas. Certo é que não só a marca como o logótipo também foram a leilão e acabaram por ser rematados por um empresário de Aveiro por menos de dez mil euros. No verão passado, José Manuel Reis anunciou o relançamento da marca com a abertura de lojas em vários pontos do país.

Brandy Mel

Criada há mais de 60 anos, a marca algarvia viu-se obrigada, em 2014, a mudar o seu nome para Dom Cristina e sair do Algarve. Tudo porque a família de Portimão que produzia o brandy ignorou a obrigação de renovar o pedido do registo, que foi entretanto reclamado por outro empresário. Os netos do criador desta bebida, a partir de uma fábrica de Castelo Branco, lançaram um licor igual ao original, mantendo a garrafa, o rótulo, mudando apenas o nome. A verdade é que todas as outras características se mantiveram: uma tradicional mistura de mel e medronho, aromatizada com plantas serranas. Também a escolha criteriosa do melhor mel, medronho, e brandy para a manutenção de um elevado padrão de sabor e qualidade se manteve até aos dias de hoje.

Laranjina C

Teve um período de ouro, com publicidade constante na televisão, e chegou até a patrocinar a equipa de ciclismo do Sporting. Criada em 1926 pela empresa Francisco Alves e Filhos – que começou por vender pirolitos, além de outros refrigerantes – na Venda do Pinheiro , mas a marca acabou por desaparecer em finais da década de 80. Em 1990 a empresa da família Alves foi adquirida pelo grupo Cadbury-Schweppes Portugal, SA.

A sua forma também conquistou fãs, primeiro apareceu a tradicional garrafa, larga e baixa, mas mais tarde optou por mudar e apostar numa nova linha, aparecendo assim uma garrafa mais estreita e alta, certamente numa adaptação ao formato então mais vulgar e para reduzir custos de fabrico e de comercialização, nomeadamente ao nível do embalamento e distribuição.

Farinha Amparo

Alimentou as crianças entre as décadas de 50 e 70. Nesse período ganhou popularidade entre os mais novos por oferecer brindes mistério – bonecos monocromáticos que podiam ser coloridos. A marca ficou também associada à incompetência, sobretudo aos maus condutores, que ao fazerem uma asneira na estrada levavam com o insulto tradicional: “Saiu-lhe a carta na farinha Amparo.” Também famosa ficou a expressão “trigo limpo, farinha amparo”. Esta expressão terá nascido de um slogan de um anúncio comercial radiofónico: “Uma vez que a farinha é feita de trigo e que sai sempre um brinde, é tão simples como trigo limpo, farinha amparo”.

UMM

Fundada em 1977, a União Metalomecânica fabricou os jipes 4×4 para a agricultura, indústria e serviços. Em 1986, o modelo UMM Alter foi apresentado. A marca ainda projetou um novo modelo em 2000, apostando na mecânica do Peugeot CRDI mas, no entanto, devido a dificuldades financeiras, não foi possível lançá-lo no mercado, o que resultou na desistência da própria marca no mercado português. Em 2001 deixou de fabricar modelos 4X4. Atualmente são distribuidores e representantes de variadas marcas e peças para a indústria automóvel e importadores de artigos para tuning. Nos dias de hoje ainda é possível encontrar jipes UMM à venda nos mais variados sites.

Molin

Desapareceram em meados de 1990 mas coloriram a vida de várias gerações, sobretudo nos anos 80. Ter um estojo com 24 canetas Molin era um luxo e quem levava para a escola o estojo com 48 – que se desdobrava e tinha uma panóplia enorme de cores – praticamente não precisava de fazer mais nada para ter o estatuto de aluno mais popular. Apesar do sucesso, o fundador da empresa, Mário Lino, não conseguiu impedir o encerramento da histórica empresa portuguesa de material de escrita ditado por vários infortúnios sucessivos, acabando por entrar em processo de falência em 2011. As instalações ainda existem, mas foram compradas por um grupo empresarial.