João Cutileiro: ‘O Cristo-Rei também parece um pirilau’

Viveu no Afeganistão, estudou em Londres e assinou duas das obras mais polémicas das últimas décadas em Portugal.

Viveu no Afeganistão, estudou em Londres e assinou duas das obras mais polémicas das últimas décadas em Portugal. Aos 79 anos, acaba de receber um doutoramento honoris causa pela Universidade Nova de Lisboa. Mas não liga às honrarias e detesta que lhe chamem mestre.

Quando lhe pedimos que nos faça uma visita guiada pela sua casa-ateliê, João Cutileiro escusa-se. «Ainda estou de ressaca», justifica o escultor de 79 anos, «… de uma operação».

À vista desarmada, a quinta que ocupa em Évora há perto de três décadas é composta por um vasto pátio repleto de pedras e de esculturas, um barracão, que deve servir de armazém e local de trabalho, e a casa propriamente dita, uma construção típica alentejana de rés-do-chão e primeiro andar, onde o artista reside com a mulher, a também escultora Margarida Lagarto.

Como uma sentinela de guarda, a escultura metálica de uma mulher coroada segurando um bebé nos braços flanqueia a porta de entrada. «Fiz essa há cinquenta anos, quando nasceu o meu filho. Chamei-lhe o Pequeno Príncipe», explica Cutileiro.

Já no interior, a sala de estar tem as paredes forradas de objetos que lhe transmitem caráter, história e conforto: quadros, esculturas, fotografias, desenhos e outros objetos, como uma tábua de cardar de Trás-os-Montes ou uma coleção de pequenos crucifixos de madeira, muitos deles mutilados. Mas o elemento que mais se destaca, até pela sua forma enigmática, é um móvel antigo de madeira que parece um sarcófago e que ninguém sabe dizer para que serve.

O espaço é partilhado com animais domésticos, como um gato que se aninha num dos sofás ou um cão que passeia, indeciso, entre a sala e a cozinha. Cutileiro, que veste de forma confortável – com uma t-shirt e um blusão polar que deixam entrever um tufo de pêlos brancos no peito –, senta-se perto da lareira.

Aquele móvel é muito original. Que função tinha?

É tão original que ninguém sabe o que é. A Simonetta Luz Afonso foi a única pessoa que me deu um vislumbre. Na época – isto é do fim do século XIV, princípio do século XV – houve uma moda de fazer móveis esquisitos. É o mais próximo que cheguei.

Há quanto tempo está aqui em Évora?

Há 31 anos, vai para 32. Vivi em Lisboa até aos 18, depois em Londres e no Algarve, em Lagos – passava temporadas num lado, temporadas no outro. Depois perdi o ateliê em Londres e os miúdos entraram em idade escolar, então tive que me fixar de um lado e fixei-me no Algarve. [Com ironia] Depois a maré começou a encher, a encher, o turismo começou a invadir. Eu saía de casa, dizia à minha mulher ‘Vou comprar pão’ e voltava três horas depois sem pão – de modo que saímos.

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