Pedrógão. O que pode ter falhado?

O que aconteceu ao SIRESP? Os bombeiros não tinham ordens para avançar? O corte das estradas foi eficaz? Afinal, o que falhou no combate ao fogo de Pedrógão Grande?

Cortes na EN 236

Uma mulher que fugiu do carro depois de ter sido apanhada pelo fogo na Estrada Nacional (EN) 236 disse à comunicação social que foi encaminhada para aquela via pela GNR. Questionada pelo primeiro-ministro sobre o encerramento da via, a GNR explicou que o fogo chegou à estrada «de forma totalmente inesperada, inusitada e assustadoramente repentina, surpreendendo todos, desde as vítimas aos agentes da Proteção Civil». O documento explica que, face à evolução do incêndio, os guardas foram obrigados a recuar para a zona de confluência do IC 8, via que já tinha sido cortada pelas autoridades, e a EN236, estrada onde morreram 47 das 64 vítimas. A GNR referiu ainda que não existia «qualquer indicador ou informação que apontasse para a existência de risco potencial ou efetivo em seguir por esta estrada em qualquer dos sentidos». A GNR salvaguarda que decorre «um processo de inquérito mandado instaurar pelo Comando Geral».

Falhas no SIRESP

O jornal i avançou na sexta-feira que a rede de comunicações de segurança e de emergência (Sistema Integrado de Redes de Emergência e Segurança de Portugal, SIRESP) não funcionou entre as 19h00 de sábado e as 09h30 de domingo, horas em que se deu o pico dos incêndios. Isso fez com que bombeiros, GNR e Proteção Civil  tivessem dificuldade em comunicar no teatro de operações durante 14 horas e meia. O bloqueio nas comunicações pode explicar a dificuldade que a GNR teve em coordenar-se e o facto de não ter encerrado a circulação na EN236. O SIRESP só foi restabelecido depois de ter chegado ao local um carro de apoio, com antenas para emitir sinal de comunicação, que partiu de Lisboa. Tanto a Proteção Civil como o Ministério de Administração Interna afirmam que houve apenas falhas durante um curto período e que estas não comprometeram as operações no terreno.

As falhas no SIRESP foram ontem confirmadas pela Proteção Civil em resposta ao pedido de esclarecimento feito pelo primeiro-ministro. De acordo com o documento, «as primeiras falhas ao nível das comunicações são registadas pelas 19h45». O bloqueio nas comunicações resultou de terem ardido três antenas colocadas na zona – na Serra da Lousá, Malhadas e Pampilhosa da Serra – e que se arrastou até terça-feira, dia 21.

O MAI escusou-se a comentar a informação divulgada pela Autoridade Nacional da Proteção Civil.

Bombeiros parados

O SOL esteve em Pedrógão Grande e em Góis a acompanhar as operações no terreno, com os bombeiros na frente de fogo, e apercebeu-se da frustração destes profissionais. Vários bombeiros mostraram-se descontentes com a desorganização, queixando-se do facto de estarem horas sem receberem ordens. «Estou no posto de comandos há 12 horas. Já comi, dormi, fumei uns cigarros… Já não sei o que fazer. Estou aqui como voluntário e não me deixam combater o fogo», disse ao SOL um bombeiro em Avelar. Outro bombeiro mostrou-se frustrado com as decisões tomadas por superiores hierárquicos: «Não sei por que não nos deixam avançar. Tenho de ficar aqui a aguardar ordens». Os homens passaram horas à espera de instruções. Os Sapadores de Lisboa chegaram a estar 14 horas no teatro de operações à espera de ordens. Confrontado com esta situação, o comandante operacional António Dias disse não ter conhecimento de ocorrências como as descritas.

O jornal espanhol El Correo Gallego avançou esta semana que um grupo de 60 bombeiros da Galiza terá sido impedido de entrar no país. Os homens chegaram a Valença do Minho e as autoridades portuguesas mandaram-nos parar por não existir «capacidade para receber tanta gente».

Mistério do Canadair

Eram 17h00 de terça-feira quando soou o alarme: tinha caído um avião Canadair na zona de Ouzenda, em Pedrógão Grande. A notícia tinha sido dada à agência Lusa por fonte da Proteção Civil. Também o Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários (GPIAAF) disse à agência de notícias que tinha sido informado desta situação e que tinha enviado uma equipa para o local. Mais tarde, as autoridades admitiram que não tinha caído qualquer aeronave e que estavam a ser apuradas responsabilidades. Os primeiro rumores davam conta da queda de uma aeronave espanhola, mas a Força Aérea daquele país desmentiu tal situação 50 minutos depois. As autoridades portuguesas só avançaram com um esclarecimento cerca de duas horas depois.

O SOL tentou saber junto do comandante da Proteção Civil António Dias o porquê de terem sido precisas duas horas para explicar o que (não) se tinha passado, em vão.

Alerta do IPMA

Dois dias antes dos incêndios em Pedrógão Grande, o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) alertava para um cenário desfavorável em termos de incêndios florestais – colocando nove dos 18 distritos do continente com risco extremo de incêndio. Pedrógrão Grande e o distrito de Leiria não faziam parte dessa lista.

Fase Charlie antecipada

A fase Charlie, período crítico de resposta aos fogos, foi ativada nesta quinta-feira, oito dias antes da data prevista (1 de julho).