Fragas de São Simão. Um oásis no Pinhal Interior, em todos os sentidos

A praia fluvial convida a mergulhos e escapou aos fogos de junho, protegida pela natureza e pela ribeira de Alge. Ali perto, o Casal de São Simão é outra lufada de ar fresco

O calor aperta mas, à medida que se desce a encosta, a paisagem desoladora dos fogos de junho vai dando lugar a nichos verdejantes refrescados pela sombra. Do miradouro, a vista para as Fragas de São Simão é imponente – há quem nem se aproxime muito por causa das vertigens, mesmo que a fotografia seja quase obrigatória. Lá em baixo, a ribeira de Alge oferece um pequeno oásis a quem gosta de descansar no meio da natureza.

Para quem não conhece a zona, este é um dos segredos bem guardados do concelho de Figueiró dos Vinhos que importa ter vagar para descobrir.

Nos últimos tempos, a aldeia mais próxima, Casal de São Simão, tem tido maior visibilidade, e os motivos não são menos retemperantes quando tanto se fala da desertificação e abandono do interior. Nas últimas décadas, o lugar foi aos poucos remodelado pelos moradores e por gente ligada à terra, já que ali só vivem permanentemente quatro pessoas: um casal que trocou a vida na cidade pelo retiro na serra e um casal de ingleses que se apaixonou pela aldeia, conta-nos um dos elementos da associação de moradores Refúgios de Pedra. “Foi um projeto de autorregulação que permitiu dar uma nova vida à aldeia”, diz o proprietário da casa A Lura, uma das moradias típicas de pedra reconstruídas e que pode ser alugada, com espaço para cinco pessoas. O terraço é de ficar rendido, pela vista e pelos recantos pitorescos.

A história é contada no site da aldeia – www.casaldesaosimao.com. Aníbal Quintal, que costumava passar por ali a caminho do trabalho, sentiu-se atraído pelo lugar, que há 30 anos estava praticamente em ruínas. Amigo puxou amigo e começaram aos poucos a reconstruir casa a casa, procurando uniformizar o traçado com uma composição harmoniosa de pedra e madeira.

Hoje, à entrada da aldeia, o orgulho coletivo está patente num cartaz amarelo que atesta que conseguiram fazer de um lugar votado ao esquecimento um ponto de paragem na rota das Aldeias do Xisto. “Um casal numa rua”, lê-se, porque é pouco mais do que isto, se se descontar a vista larga a toda a volta. “Nesta aldeia há um novo sentir coletivo feito de pessoas que recuperaram as casas com as suas próprias mãos.”

Ao fogo, que não foi também a primeira vez que andou por ali, escaparam também assim, com as mãos de quem quis ajudar e carrinhas pick-up carregadas de depósitos de água. Os cabos derretidos à entrada da aldeia atestam a violência das chamas de junho. A história seria contada pela agência Lusa ainda o fogo lavrava sem piedade ali à volta. Dois amigos do casal de Leiria, que estava fora, acabaram por ir de propósito ajudar a combater o fogo, que parou na estrada que vai dar ao ex-líbris do lugar, o Restaurante Varanda do Casal. O projeto resultou de financiamento comunitário, proporcional ao investimento privado que os amigos da aldeia ali fizeram. A tiborna de bacalhau é o prato mais cotado, mas a vista panorâmica sobre a aldeia é outro atrativo. Em baixo, uma loja de artesanato vende casinhas de pedra a imitar as da aldeia, doces e licores de produtos regionais.

Mas o motivo para serem falados não é apenas a remodelação de encher o olho. O Casal de São Simão, que está a 15 minutos das Fragas por um caminho pedestre e tem perto uma capela dedicada a São Simão – que o fogo rodeou mas não engoliu –, está na lista de finalistas do concurso “7 Maravilhas de Portugal”, que a 20 de agosto vai eleger as aldeias mais bonitas do país. A aldeia, que promete continuar a dar que falar, já terá despertado a sensibilidade dos locais há mais de cem anos. Pensa-se que serve de enquadramento à tela “O Batismo de Cristo”, de José Malhoa, que decora o altar da igreja matriz de Figueiró dos Vinhos. “Para matar o vício cá ando pintando uns pequenos estudos, e com um modelo vestido com a túnica de Christo, por montes e valles a vêr se encontro sítio que lembre o Jordão, o que não é fácil por sêr quasi tudo coberto por vegetação: o meu Christo é quem me leva o cavalete, tella e a caixa, e se percebo que ele se amua prego-lhe com a cruz às costas!”, escreveu o pintor em 1901, citado pela revista cultural online “Velho Critério”.

Depois de visitar a aldeia e se o tempo pedir um mergulho, é tornar a descer às Fragas, onde há uma esplanada de serviço com gelados ou um bom prato de caracóis, que as tradições de verão, essas, não há que enganar, são iguais pelo país fora. Muda a paisagem, e esta é das que valem a pena.