Em 2007, ficava para a pequena história o “porreiro, pá” de José Sócrates, apanhado pelos microfones, a rejubilar desta forma pelo sucesso da missão que, com Durão Barroso, tinha cumprido. Estava assinado o Tratado de Lisboa e o futuro parecia risonho. O Lehman Brothers não tinha caído, a troika não tinha chegado a Portugal e parecia quase exótica a cláusula inscrita no artigo 50 do documento que entraria em vigor a 1 de dezembro de 2009.
Pela primeira vez na história da União Europeia, essa construção que parecia avançar apenas em sentido positivo, estava previsto num dos seus tratados que um dos seus membros a abandonasse.
Na altura, ninguém ligou muito ao artigo 50, que hoje muitos ingleses consideram muito vago e que é a chave para o Brexit decidido ontem nas urnas pelos eleitores do Reino Unido.
O artigo 50 diz que “um Estado-membro que decida retirar-se deverá notificar o Conselho Europeu”. Esse será o primeiro passo a ser dado. E há agora a dúvida se a notificação partirá já de David Cameron ou se o anúncio da sua saída para daqui a três meses fará com que seja já um seu sucessor – eventualmente saído de novas eleições gerais – a comunicar formalmente o desejo do Reino Unido de sair da União Europeia.
A partir do momento em que a notificação se concretize, inicia-se um processo de negociações sobre os termos e as condições da saída. E aqui o artigo 50 não diz nada sobre o que poderá acontecer. Não há guia. Tudo terá de ser negociado.
O acordo permitirá, entre outras coisas, definir os termos da relação futura entre o Reino Unido e a União Europeia, não estando completamente excluída a hipótese de o país de Sua Majestade continuar no Espaço Económico Europeu. Tudo dependerá do acordo a que se chegar.
O que o artigo 50 diz é que há um prazo de dois anos para o desenrolar deste processo. O mesmo prazo que fez hoje Mariano Rajoy apelar à calma dos espanhóis que vivem no Reino Unido ou com ele têm relações comerciais, para explicar que o Brexit não é coisa para hoje nem para as próximas semanas.
No entanto, o mesmo artigo prevê que o prazo máximo de dois anos possa ser prorrogado, caso haja unanimidade nesse sentido do lado do Reino Unido e do Conselho Europeu.
O Conselho Europeu, liderado por Donald Tusk, que já veio dizer ser importante deixar claro aos restantes países que uma saída não ser fará sem consequências, é aqui a peça chave. Será a instituição que vai negociar e celebrar o acordo da saída em nome da União Europeia, após a sua aprovação pelo Parlamento Europeu e com maioria qualificada.