Um homicídio na desordem de Malta

Assassinato à bomba da jornalista e blogger que liderava as investigações aos Panama Papers no país está por explicar. FBI e especialistas holandeses participam nas investigações e a Europol pode juntar-se na procura dos homicidas. Governo maltês está a oferecer um milhão de euros a quem partilhar informações relevantes para o caso.

Às 14h35 do passado dia 16 de outubro, Daphne Caruana Galizia publicava no blog Running Commentary aquele que viria ser o seu último post. Vinte e cinco minutos mais tarde, o seu Peugeot 108, estacionado à porta de casa, na pequena localidade de Mosta, em Malta, desfazia-se em pedaços, consigo no interior, por culpa de um engenho explosivo aí colocado de véspera.

«Nunca esquecerei como corri em volta das chamas e tentei abrir a porta do carro, enquanto ouvia a buzina. Olhei para o chão e vi restos da minha mãe», descreveu o filho, Matthew, também jornalista, numa publicação no Facebook.

O assassinato brutal da responsável pela liderança das investigações aos Panama Papers no país deixou a pequena ilha em estado de choque e colocou nas autoridades a pressão de encontrar o mais rapidamente possível os responsáveis pelo crime. Essa pressão, no entanto, não resulta apenas das obrigações exigidas a um Estado de Direito e membro da União Europeia ou na cada vez maior influência do crime organizado e da máfia italiana no país. De acordo com Caruana Galizia, entre a cúpula política e económica de Malta não faltam nomes de alegados envolvidos em esquemas de lavagem de dinheiro, relacionados com os paraísos fiscais que os mais de 11,5 milhões de documentos vazados da sociedade Mossack Fonseca trouxeram à baila, e onde se destacam o do primeiro-ministro, Joseph Muscat, ou o do líder da oposição, Adrian Delia. «Toda a gente sabe que a Sra. Caruana Galiza era uma dura crítica da minha pessoa – quer politicamente, quer pessoalmente – mas nada justifica este ato bárbaro», lamentou o chefe do Governo de Malta, citado pelo Guardian.

A necessidade de afastar fantasmas e suspeitas de qualquer ligação com o crime levou Muscat a convidar especialistas do Instituto Forense da Holanda e agentes do FBI para ajudarem nas investigações. Para além disso, anunciou uma recompensa de um milhão de euros para «quem apresentar informações que possam levar à identificação dos responsáveis» pelo homicídio da jornalista. O caso também causou preocupação junto das entidades europeias e o presidente do Parlamento Europeu, Antonio Tajani, pediu mesmo o apoio da Europol.

Caruana Galiza constava da lista das ‘28 personalidades que irão mudar o mundo em 2017’ concebida pelo site Politico, que a descrevia como «uma Wikileaks inteira dentro de uma só mulher, líder de uma cruzada contra a falta de transparência e a corrupção em Malta». Aos 53 anos, deixa um marido e três filhos, que querem agora mudar o mundo por ela. «Quando há sangue e fogo à nossa volta, trata-se de guerra. Estamos em guerra contra o Estado e o crime organizado, que já não se distinguem um do outro», escreveu Matthew nas redes sociais.