Três anos depois. Vítimas da legionella lamentam falta de prevenção

Surto de legionella no S. Francisco Xavier já matou um homem de 77 anos e uma mulher de 70 anos. Sobe para 30 o número de infetados

A legionela volta a matar em Portugal. Sobe para 30 o número de infetados no surto do Hospital S. Francisco Xavier, em Lisboa, e aumenta para três o número de doentes nos cuidados intensivos. A bactéria já roubou a vida a duas pessoas: um homem de 77 anos e uma mulher de 70 anos. De acordo com a diretora-geral da Saúde, Graça Freitas, o homem estava internado num hospital privado e a mulher em Sta. Maria.

E no dia em que passam três anos da deteção do surto de legionela em Vila Franca de Xira, que viria a afectar 375 pessoas e causar 12 mortes, a associação que representa as vítimas promete não baixar os braços para que aumente a prevenção. Joaquim Ramos, da Associação Apoio às Vitimas de Legionela, revelou ao i que é essa a mensagem que pretendem deixar hoje no parlamento numa audição com o Bloco de Esquerda, o único que aeitou receber a associação. Em causa está a legislação que, desde 2013, deixou de exigir auditorias obrigatórias e periódicas a edifícios de serviços com climatização e revogou medidas que estavam previstas desde 2006 para prevenir a doença do legionário, nomeadamente a pesquisa de colónias da bactéria. Depois do chumbo de uma iniciativa semelhante em 2014, em março do ano passado o parlamento aprovou um projeto de resolução do Bloco que recomendava ao governo a reintrodução das auditorias. Até agora, porém, não houve desenvolvimentos legislativos.

Joaquim Ramos admite que associação está disponível para ir até às últimas instâncias para que a legislação mude e seja reforçada a proteção da população, deixando em aberto a hipótese de recorrerem ao Tribunal Europeu dos Direitos do Homem. Nos últimos dias, o surto de legionela no Hospital de São Francisco Xavier reavivou memórias. “Estive 17 dias internado, dois dos quais em cuidados intensivos precisamente em São Francisco Xavier”, recorda o motorista, hoje com 46 anos. “Foram dois meses de baixa e até aí nunca tinha faltado um dia ao trabalho. Continuo a ter ataques de tosse. Temos vítimas que andam com botija de oxigénio e outras que tiveram de deixar de trabalhar”, continua Joaquim Ramos, que acredita que deixar a manutenção a cargo das empresas ou organismos públicos não chega: o Estado tem de fiscalizar com maior regularidade se as entidades, públicas e privadas, cumprem as boas práticas. No surto de São Francisco Xavier, não é ainda certa a fonte de contaminação, sendo que o contágio com legionela ocorre por inalação e pode acontecer por diferentes sistemas que produzem aerossóis (gotículas de água), do sistema de climatização a torres de arrefecimento ou chuveiros. A rede de água do hospital, onde foi confirmada a bactéria, já foi descontaminada.

Numa altura em que o surto em São Francisco Xavier está dado como controlado e a tutela deu duas semanas à Direção Geral da Saúde e Instituto Ricardo Jorge para esclarecer o sucedido, as vítimas do surto de há três anos continuam à espera de justiça. Em março foi conhecida a acusação do Ministério Público mas aguarda-se ainda a abertura da fase de instrução. Sete pessoas e duas empresas (a Adubos de Portugal e uma firma responsável pelo tratamento de água) foram indiciadas pelos crimes de infração de regras de conservação e ofensas à integridade física. Mas o Ministério Público só conseguiu apurar nexo de causalidade entre as torres de arrefecimento contaminadas e 73 vítimas, entre as quais oito pessoas que morreram.