Pedrógão Grande. Comissão de Proteção de Dados trava divulgação de relatório

Capítulo que até hoje tem sido omitido, só poderá ser consultado em três exceções. Xavier Viegas prefere não se pronunciar para já sobre decisão

A Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) não autorizou que seja do conhecimento público a totalidade do relatório sobre os incêndios de Pedrógão Grande. Segundo aquela comissão, no capítulo mais importante conseguem identificar-se as vítimas e as circunstâncias em que as mesmas terão morrido. Assim, a CNPD considera que só em determinadas exceções poderá ser facultado o acesso à íntegra do referido documento.

Por deliberação, a comissão admite “o esforço de anonimização” de quem elaborou o relatório ‘O Complexo de Incêndios de Pedrógão Grande e Concelhos Limítrofes, iniciado a 17 de junho de 2017’ (“versão destinada a ser tornada pública”), mas  considera que ainda assim existe a possibilidade de “relacionar os factos e as situações descritas com as vítimas, testemunhas e sobreviventes, e com isso, identificar a quem diz respeito”._

A CNPD justifica ainda que uma divulgação pública da versão apresentada iria expor as vítimas e as famílias “num grau muito elevado, afetando significativamente os direitos fundamentais ao respeito pela vida privada e à proteção de dados pessoais”.

Este capítulo do relatório – feito pelo Centro de Estudos sobre Incêndios Florestais (CEIF) da Universidade de Coimbra, liderado por Xavier Viegas – foi o mesmo que o Ministério da Administração Interna, então liderado por Constança Urbano de Sousa, decidira omitir aquando da divulgação do relatório. Na altura o governo defendeu que a publicação do capítulo 6, em que se relata com especial detalhe o que aconteceu a cada uma das vítimas, poria em causa a privacidade dos envolvidos.

As páginas que nunca foram conhecidas são a parte mais extensa do relatório e descrevem falhas graves no socorro às vítimas.

Quando o atual ministro tomou posse, e na sequência das exigências da Associação de Vítimas do Incêndio de Pedrógão Grande, o Ministério da Administração Interna pediu um parecer à CNPD.

A comissão esclarece que apesar da proibição da divulgação, existem três situações em que a sua disponibilização deve acontecer: “O acesso pelos titulares dos dados pessoais à informação a eles especificamente relativa”; a autorização para que “os familiares diretos das vítimas dos incêndios [possam] ter conhecimento parcelar do descrito no capítulo 6”; e por fim decidiu que o acesso à íntegra do capítulo só deverá acontecer ao abrigo “do regime jurídico de acesso aos documentos administrativos com dados pessoais, portanto, se for demonstrado um interesse constitucionalmente protegido e o acesso se revelar adequado”.

No dia 10 deste mês, o professor universitário e investigador Xavier Viegas, que liderou a equipa que levou a cabo este relatório, tinha dado um mês ao governo para que fosse disponibilizado ao público a íntegra do documento, garantindo que se o executivo de António Costa não o fizesse, ele próprio o faria.

Xavier Viegas defende que nas setenta páginas agora vetadas não existem nomes ou dados pessoais. O i contactou o investigador, que disse não querer pronunciar-se para já sobre a decisão daquela comissão, adiantando que só dentro de dois ou três dias é que decidirá se vai ou não revelar o capítulo, que diz ser o mais importante de todo o documento.

Já o Ministério da Administração Interna afirmou ao i que “dará cumprimento à deliberação da CNPD [ontem] conhecida”.