Um dia destes, a falar com uma amiga sobre os últimos acontecimentos em que o Governo Costa tem sido protagonista, a minha amiga interrogava-se sobre se tudo o que se tem passado não seria, no fundo, uma estratégia de António Costa para provocar eleições antecipadas.
O facto de Costa ter sido reconhecido como grande estratega, tanto da Câmara de Lisboa como na constituição da solução de Governo, eram fortes argumentos para que essa minha amiga, apoiante da solução governativa, achasse que o conjunto de erros crassos teriam como corolário algo que, tal como aconteceu durante a constituição da ‘geringonça’, nos estaria a escapar. Ou seja, o volte-face nas rendas da energia pondo em causa dois ministérios e o acordo com o Bloco de Esquerda, a confusão com a mudança de sede do Infarmed, o episódio da comemoração do segundo aniversário em que o Governo gastou mais de 84 mil euros para um happening com um focus group e por aí fora… seria tudo parte de uma estratégia para provocar a queda do Governo e obrigar à realização de eleições antecipadas num momento em que o PS ainda tem, segundo as sondagens, um bom score e o PSD ainda não se definiu.
Embora tenha discordado, percebo o raciocínio. Qualquer apoiante entusiástico do Governo tende a acreditar que o que está a acontecer não é uma desorientação total – tem que ser a velha conhecida inteligência estratégica de Costa a funcionar nas catacumbas do seu cérebro. ‘O’ Costa que os socialistas apoiam não é isto. Tem que existir qualquer coisa por trás. Se ele inventou o que ninguém acreditava que pudesse existir – um Governo PS a sobreviver à conta do apoio parlamentar do Bloco de Esquerda e do PCP – então estará agora a inventar outra coisa qualquer e seguramente salvífica para o PS.
Confesso que não acredito que seja de propósito (mas tenho que reconhecer que nunca me passou pela cabeça que Costa conseguisse formar Governo sem ser o partido mais votado). O que está a acontecer com Costa, e que remonta aos incêndios de junho, já aconteceu a muitos primeiros-ministros antes dele. Começam a viver numa realidade paralela, só falam com os mesmos fiéis que nunca lhes dizem que não, deixam aliás de conseguir ouvir a palavra ‘não’ e perdem a relação com as pessoas comuns. Quando se entra neste ciclo, que já aconteceu a todos os ex-primeiros-ministros, o final não costuma ser feliz.