Um Natal minimalista. Quando menos é mais

Natal é sinónimo de consumismo sem significado, mas… pode não ser. Joana Guerra Tadeu, autora do blogue “A Minimalista”, dá workshops sobre o mote de um Natal Minimalista. Em conversa com o i, revela dicas para uma festa com muito espírito, menos despesa e consciência ambiental. Da decoração à ementa, basta cortar no acessório e…

Decoração

Da árvore, aos enfeites e apontamentos natalícios pela casa, a imaginação é a única peça obrigatória

Comecemos por um dos principais símbolos do Natal – a árvore. Joana diz que “a maneira mais minimalista e sem desperdício é não ter uma árvore”. Mas, para quem não abdica da tradição, há alternativas ecológicas. A primeira é “fazer uma árvore com o que se tem em casa”: pegar em objetos como livros, por exemplo, e fazer uma montagem em forma de árvore e colocar luzes. Outra hipótese é fazer a árvore “reutilizando coisas que seriam lixo”: rolos de papel higiénico ou revistas, fazendo origamis. Para uma versão mais natural, pode arranjar um ramo caído no chão e decorá-lo, colocando-o num um vaso ou num balde. Para os afortunados com jardim ou um sítio para plantar, uma árvore natural com raiz – “que não venha do estrangeiro, porque tem uma pegada ecológica muito grande”, avisa Joana – é uma ótima solução. Este ano, a minimalista optou, porém, por um “Pinheiro Bombeiro”, uma iniciativa de aluguer de pinheiros cortados para prevenir incêndios e cuja receita reverte para os bombeiros. Por que não árvores artificiais? “O problema é que são feitas de plástico e um dia vão para um aterro. Não são recicláveis e libertam imensos microplásticos – e neste momento há plásticos que já estão entranhados na terra e na água; a vida humana, animal e vegetal está a consumir plástico e isso tem graves consequências para a saúde”, resume Joana. Quanto a enfeites, não faltam ideias. “Apanhei pinhas e sementes de magnólia e pus no forno para secar e não aparecerem bichos ou fungos. Desidratei rodelas de laranja e limão. Pus um fio em tudo e coloquei na árvore”. Para o resto da decoração, é seguir a mesma regra: keep it simple. Uma coroa natural de cedro na porta de casa e uma árvore de natal de croché no quarto da filha completam a receita minimalista.

Presentes

Esqueça as filas nas lojas e nas bancadas de embrulhos. Experiências ou consumíveis podem ser os melhores presentes

“Para mim, o mais grave do Natal é darmos presentes completamente ao lado, que as pessoas educadamente fingem que adoram”, diz Joana.
Numa sociedade em que tudo é cada vez mais efémero e instantâneo, para um minimalista “o melhor presente que se pode oferecer a alguém é tempo”. Na hora de escolher os presentes, Joana sugere ideias tão simples como “um passeio na praia, uma tarde algures ou um jantar”. Admite, contudo, que “a maior parte das pessoas tem medo de chegar e oferecer um postal que diz ‘ofereço-te uma hora do meu tempo para usares como quiseres’ e a outra pessoa achar a prenda ridícula”. Assim, “oferecer experiências” – workshops, bilhetes para teatro, concertos, festivais – pode ser uma escolha segura, diz. “São coisas de que as pessoas vão usufruir e que não ficam no planeta para sempre”. Para quem tem tempo, bolachas, geleias ou doces são outras lembranças que “há sempre alguém que come”. Para as crianças, Joana sugere que os pais escrevam com elas uma carta ao Pai Natal. “Põe as crianças a refletir sobre o que realmente querem, sem ser objetos”. Nas situações em que os familiares querem oferecer presentes, a solução pode ser pedir antes dinheiro que poderão guardar para o filho usar mais tarde ou produtos de que precisem mesmo. Brinquedos que estimulem o desenvolvimento são uma hipótese, claro – sempre com o ambiente em mente, em versões de madeira –, mas sem exagero, para quê acumular? Para embrulhar, a minimalista recomenda um frasco de vidro com um raminho a decorar se forem consumíveis, e tecidos para o resto, recorrendo à técnica tradicional de embrulho japonês furoshiki. “Há vários tutoriais na Internet e o resultado final é lindo”, diz.

Comida

Não fazer comida em demasia é o princípio a ter em conta. Evita-se desperdícios e gastos desnecessários

No Natal, quanto mais melhor. Ou, pelo menos, essa é a ideia que está instituída. Quem não gosta de ver uma mesa cheia, qual banquete? Ano após ano, terminada a festa, surge invariavelmente um problema – as sobras. Por que não repensar o paradigma e não fazer à partida demasiados pratos? Essa é a proposta de Joana. Em primeiro lugar, “não deve ser só a família da casa que recebe a fazer o jantar”. A ideia é delinear-se um orçamento em família. As pessoas que dão o jantar recebem dinheiro das restantes e são elas que fazem depois as compras, propõe a minimalista. “Isto diminui grandemente não só a quantidade de comida que se faz, como também o dinheiro que se gasta”, argumenta Joana. O que costuma acontecer na generalidade das situações é que, por exemplo, “num natal com sete pessoas, todas trazem comida para sete”. E o resultado é que, em vez de haver comida para sete pessoas, no fim da festa ainda há comida para 50 pessoas.

Para além de fazer um orçamento, é determinante impor regras como, por exemplo, cortar nas quantidades das receitas. “Um ótimo truque é diminuir as receitas de doçaria para um quarto” – um quarto de sonhos, um quarto de filhoses, um quarto de fatias douradas, um quarto de rabanadas, um quarto de bolo rei, um quarto de bolo rainha, um quarto de lampreia de ovos…

No caso de Joana, as quantidades natalícias lá de casa já se conhecem de cor. “Comemos Bacalhau com Todos e já sabemos que as pessoas mais velhas e as crianças comem meia posta de bacalhau cada uma, por isso não vale a pena estar a cozinhar mais do que isso…”

E depois?

Dar à natureza o que vem da natureza é o mote a seguir no final. E, quem sabe, talvez leve outro presente para casa…

Terminada aquela que é, para muitos, a época preferida do ano, há que voltar a despir a casa e voltar à normalidade.

O que fazer à árvore de Natal? Caso seja uma árvore verdadeira, devolvê-la à natureza é a melhor opção. Se tiver raiz, plantá-la de forma responsável e informada é um bom caminho, diz Joana.

Se houver uma árvore artificial lá em casa e não quiser guardá-la – ou, querendo, não tiver espaço para tal –, deitá-la para o lixo deve ser o último cenário… ou não ser de todo uma possibilidade, uma vez que, como Joana sublinha, “o plástico das árvores artificiais não é reciclável” e o seu destino acaba por ser um aterro.

Nesse cenário, dá-la ou vendê-la a alguém que precise de uma árvore pode ser uma boa solução.

Quanto aos enfeites, a solução é fácil – vieram da natureza, voltam para a natureza. As pinhas podem ser colocadas num jardim. Por sua vez, as rodelas de laranja e limão podem servir de alimento a animais. “Os meus pais têm uma quinta com animais e se calhar vou dar-lhes esses enfeites como alimento”.

Outra opção é guardá-los para o(s) ano(s) seguinte(s), caso não queira uma decoração totalmente nova.

A comida também pode ter um destino muito melhor, sem ser o caixote do lixo. Joana defende um pensamento proativo e, antes da consoada, sugere que os donos da casa comprem frascos de vidro para oferecerem os restos no final do jantar. “Se for uma família de sete pessoas, quem faz o jantar pode comprar 14 frascos de vidro – sete para salgados, sete para doces”. No fim, enche sete frascos com as sobras de bacalhau ou do prato principal e os restantes sete com doces, distribuindo pelos familiares presentes. “É mais uma prenda que levam para casa!”, nota.

 

 

*Joana Guerra Tadeu, 28 anos, Lisboa 

 Autora do blogue, “A Minimalista”