Cristas. De líder da oposição para líder da direita?

Assunção Cristas assumiu perante as câmaras da RTP que quer ser primeira-ministra. Depois de conquistar o partido (neste congresso não terá oposição), quer conquistar o país

De laranja. Se o simbolismo político conta, Assunção Cristas fê-lo valer esta semana. A presidente do CDS, que será reeleita sem oposição para segundo mandato no congresso que começa amanhã, levou a cor do maior partido do Parlamento para a entrevista que deu à televisão pública, a RTP.

Mas mais do que referências cromáticas, Cristas levou para a conversa um objetivo habitualmente mais próximo do PSD do que do CDS: ser o maior partido numa maioria parlamentar de centro-direita. Isto é: o CDS ter mais votos que o PSD, de forma a passar de liderar a oposição para liderar um governo. Só faltou mesmo dizer as palavras: “Quero ser primeira-ministra de Portugal” – ainda que tenha respondido sem problemas, e afirmativamente, quando a questão lhe foi colocada.

E Assunção não levou só expressões de vontade para esse objetivo. Levou também argumentos, como a vitória improvável nas autárquicas (“era impossível chegarmos onde chegámos em Lisboa e nós chegámos”) e o alegado “fim do voto útil” depois de a “geringonça” ter feito António Costa primeiro-ministro sem este ficar em primeiro nas legislativas de 2015. “Agora, o que conta é quem consegue eleger os 116 deputados que representam uma maioria absoluta no Parlamento”, é a frase mais repetida pela ex-ministra da Agricultura ultimamente.

Os “independentes” são também uma causa constante no discurso de Assunção Cristas (“um caminho não só feito por nós mas por todos os portugueses”), e a iniciativa Ouvir Portugal, semelhante à auscultação à sociedade civil lisboeta feita no ano passado, é diversas vezes evocada pela líder centrista. A sua moção ao congresso, que se realizará em Lamego este fim-de semana, é a conjugação de tudo isso: emancipação do PSD, oposição ao PS, ambição eleitoral e abertura do partido para uma vertente mais “popular” – como até a sigla PP presume.

Não deixa, claro, de haver críticos. Mas deixou de haver críticos mais diretos, pelo menos para esta reunião magna. O grupo liderado pelo deputado Filipe Lobo d’Ávila e pelo ex-deputado Raul Almeida (ver pág. 31), que elegeu duas dezenas de conselheiros nacionais no último congresso, apresentando também uma moção, não apresentará moção em Lamego e a apresentação de nova lista alternativa ao conselho nacional está ainda, ao que o i apurou, por decidir.

Lobo d’Ávila manteve, nestes primeiros dois anos de liderança de Assunção, solidariedade institucional máxima, sem confronto na praça pública – em particular durante o período eleitoral autárquico. Esta semana, o parlamentar democrata-cristão deu uma rara entrevista ao “Público”, pedindo um partido não centrado “na imagem” da atual líder, o que representou a marcação das devidas distâncias.

O eurodeputado Nuno Melo, que deverá este fim-de-semana ser anunciado como recandidato às eleições europeias de 2019, é um dos conservadores – e dos mais queridos entre estes – a apoiar Cristas. Ao i, na semana passada, o vice-presidente do partido descreveu este congresso como aquele que a “consagra como líder”, na medida em que no último “foi eleita presidente”. 

Conservadores mais distantes da antiga liderança de Paulo Portas, que descobriu Cristas, como Filipe Anacoreta Correia, também apoiam a reeleição da deputada na Assembleia da República e vereadora na Câmara Municipal de Lisboa. Essa diversidade entre apoios, de Diogo Feio (federalista) a Melo (distante do federalismo), de Anacoreta (conservador) a Mesquita Nunes (liberal), é um garante de estabilidade interna que sustenta a atual liderança. Por mais distante que esteja do “aparelho” e de algumas matrizes ideológicas do CDS, os resultados de Assunção garantem-lhe essa unanimidade. Resta ver se o objetivo – de fazer do PP o maior partido do centro-direita português – consegue passar da capital para o país.

Ontem, na reunião do grupo parlamentar com o PSD, Rui Rio desdramatizou as ambições centristas, dizendo que o CDS “não capitalizou” o tempo em que o PSD esteve mais ausente, devido à transição de lideranças. “O perigo não vem por aí”, defendeu Rio, ao que o i apurou junto dos sociais-democratas presentes. 

Em 2019, veremos quem tinha razão.