Motards. Guerra entre gangues rivais preocupa autoridades

Desacatos em plena luz do dia no Prior Velho são descritos como algo pouco habitual. Investigações procuram identificar participantes e motivos. À partida não houve armas de fogo envolvidas

Os desacatos deste sábado no Prior Velho, alegadamente entre um grupo ligado aos motards Hell’s Angels e o novo grupo de motards de Mário Machado – que estará a ser reconhecido por um clube rival dos Hell’s Angels, os Bandidos –, fizeram soar os alarmes. Fonte oficial da PSP admitiu ao i preocupação com o aumento da crispação entre grupos. 

Para já decorrem investigações ao incidente no restaurante no Prior Velho, a Brasa do Prior, para perceber exatamente quem esteve envolvido e quais as motivações. As investigações estão a cargo da Polícia Judiciária e, ontem, os indivíduos que ficaram feridos, alguns com gravidade, continuavam hospitalizados. A análise das viaturas envolvidas e das armas é uma das componentes do trabalho, mas à partida não foram usadas armas de fogo na agressão.

A preocupação das autoridades prende-se com o facto de os Hell’s Angels terem uma postura discreta em Portugal, o que não foi o padrão seguido no sábado num incidente que envolveu marretas, facas e barras de ferro e chegou a bloquear a circulação na Rua de Moçambique. Há uma década que não havia um incidente público tão notório atribuído aos Hell’s Angels. Em julho de 2008, o final da Concentração Internacional de Motos de Faro ficou marcado por uma agressão numa esplanada na Fuzeta, em Olhão, na altura também associada a este grupo.

No incidente deste sábado, uma das suspeitas é que as agressões no interior do restaurante terão sido uma resposta dos Hell’s Angels a uma alegada oficialização da presença em Portugal do grupo rival Bandidos, através do clube Red & Gold, iniciado em Portugal pelo ex-dirigente de extrema-direita Frente Nacional e dos Hammerskins.

O facto de entre os feridos no interior do restaurante estar um indivíduo de nacionalidade alemã alegadamente ligado ao movimento a nível internacional pesa nessa tese. “Dos vários gangues de motards que existem a nível mundial e europeu, os Hell’s Angels eram, para já, o único que tinha presença no país. Havendo o reconhecimento de um grupo ligado aos Bandidos, é um desafio à hegemonia dos Hell’s Angels em Portugal”, explicou fonte próxima do caso.

Segundo o i apurou, para já não há um reforço do policiamento na zona do Prior Velho, até porque nada indica que o ataque fosse dirigido ao restaurante em particular ou àquela zona de Lisboa, mas sim a Mário Machado e ao grupo Red & Gold, não obstante o estabelecimento estar ligado a um amigo do ex-dirigente da FN.

“Ninguém me demoverá dos meus objetivos” 

Ao final do dia de sábado, depois do incidente, Mário Machado, que se encontra em liberdade condicional depois de cumprir uma pena de prisão de dez anos por vários crimes – entre os quais o envolvimento na morte de Alcino Monteiro, português com origem cabo-verdiana espancado no Bairro Alto em 1995 –, deixou no ar que as agressões vão ter consequências. “A mim, ninguém me demoverá dos meus objetivos”, disse. “Vão ter notícias em breve. Isto foi uma festa e agora vamos para intervalo”, continuou, apontando a roupa com as cores do Red & Gold.

“Keep calm we’re here to stay!!”, lia-se ontem numa das páginas conotadas com o clube em Portugal. Segundo a TVI, terão sido publicações nas redes sociais a dar conta da “festa do Motorcycling Club que estamos a trazer para Portugal”, marcada para este sábado, a revelar o almoço.

A atuação de alguns membros de grupos de âmbito internacional como é o caso dos Hell’s Angels ou dos Bandidos é encarada como uma forma de controlo territorial, para permitir o domínio de redes ilícitas de tráfico de armas, estupefacientes ou prostituição. Em Portugal tem havido alguma aproximação entre os clubes e claques não oficiais.

Segundo o i apurou, os Hell’s Angels são próximos do grupo 1906 de adeptos do Sporting. E aqui haverá mais um ponto de fricção com Mário Machado, que pertenceu à Juve Leo, com quem tem procurado recentemente melhorar relações.

Quanto à extrema-direita, o Relatório de Segurança Interna de 2015 reconheceu um aumento de ativismo político e social de contestação às políticas migratórias, ressalvando porém que a atividade não se traduzia em ações violentas. Situação semelhante foi descrita no RASI de 2016, divulgado no ano passado. 

Com Ricardo Cabral Fernandes