«O caminho muda o sentido do poema»

Esta fotografia de uma frase poética colada num vidrão, que me foi enviada pela Francisca, avisa os transeuntes de que «O caminho muda o sentido do poema».

Ora, o caminho muda tudo. Muda o sentido do poema, assim como muda o sentido da vida. E muda-nos a nós próprios interiormente; o modo como vemos o mundo e como nos vemos a nós. 

O caminho dá, assim, sentido à própria vida e à forma como a sentimos. Como diz Yvette K. Centeno: «não quero a pedra / quero a flor dentro dela». E não há maior poesia do que esta, de ver a beleza dentro do que, aparentemente, nada tem de belo. É, pois, a poesia que nos ampara e nos ajuda a ver um rumo; daí que o sentido do poema mude conforme o caminho que seguimos.

Como diz o poeta espanhol José Ramón Ripoll: «Quanto ao sentido da poesia, creio que nos configura e ajuda a descobrir a identidade perdida como seres humanos. Convida-nos a saber mais quem somos e a conhecer o outro, o que não é pouco, permitindo-nos discernir a realidade para além da sua aparência. O poeta é então um buscador de estrelas, aquelas que nos assinalam o caminho da experiência verdadeira». São as estrelas que nos guiam e nos levam a optar por um caminho em detrimento de outros, de entre os vários rumos que podemos tomar.

E assim como o sentido do poema muda o caminho, também o caminho muda o sentido do poema, porque, dependendo do caminho que o poeta escolher, assim mudará o poema que escreve. Da mesma forma, dependendo do caminho que o leitor escolher, assim também mudará o sentido que atribui ao poema. É o leitor que dá novos sentidos ao que é escrito, em função da interpretação que faz daquilo que lê. Aquilo que, para mim, não passa de uma pedra, mesmo que me esforce por ver a flor que encerra, para outra pessoa poderá ser a mais bela flor, despida de pedras, espinhos ou folhas. Onde eu vejo o exterior, alguém vê o interior. E há também quem nada aí veja, porque, recorrendo às palavras de Jamón Ripoll: «Nada aparece / nenhuma forma nem aparência, / nenhum borrão de tinta, / nenhuma mancha, / nada».

É exatamente por isso que a poesia é tão rica. Porque nos permite seguir vários caminhos e mudar de sentido, porque nos permite, a cada instante, reinventarmo-nos, tal como no conhecido poema de Robert Frost: «num bosque amarelo dois caminhos se separavam, / E lamentando não poder seguir os dois / E sendo apenas um viajante, fiquei muito tempo parado / (…) / Em algum lugar, daqui a muito tempo: / Duas estradas bifurcavam numa árvore, e eu /Trilhei a menos percorrida, / E isso fez toda a diferença».

É escolhendo o caminho que decidimos ser mais ou menos felizes, mais ou menos jovens, mais ou menos sonhadores. Porque não são só as crianças que sonham…

 

Maria Eugénia Leitão

Escrito em parceria com o blogue da Letrário, Translation Services