1.ª LIGA Um dia de solenidade

No dia 20 de janeiro de 1935 disputou-se a primeira jornada do primeiro campeonato nacional. Um mundo novo no futebol português.

Em janeiro de 1935, o futebol não merecia o espaço que tem hoje nas páginas dos jornais, mas o acontecimento obrigava a alguma reflexão. Afinal, era a primeira vez que se disputava entre nós um autêntico campeonato nacional, em forma de ‘poule’, como se dizia lá por fora, ou seja, todos contra todos e não em sistema de taça, como acontecia com o Campeonato de Portugal, que, por causa disso mesmo, passou a chamar-se Taça de Portugal por deliberação do Congresso da Federação Portuguesa de Futebol.

Leia-se: «Começa amanhã a disputa dos Campeonatos das Ligas – competição que interessa o país pois nela participam 42 clubes. O molde é estrangeiro. A sua adoção, entre nós, aceita-se como desejo de melhorar a classe do ‘association’. Dará resultado na prática? – A verdade é que se trata de uma tentativa, mas tentativa séria, de estudo rigoroso, com probabilidades de atingir o fim em vista. Tem, sobretudo, uma grande qualidade – movimenta o ‘football’».

Disputavam-se, portanto, o Campeonato da 1.ª Liga e o Campeonato da 2.ª Liga. O primeiro tinha oito participantes: Belenenses, Benfica, União de Lisboa, Sporting, Académico do Porto, FC Porto, Académica de Coimbra e Vitória de Setúbal. O segundo dividia-se em quatro zonas, cada uma delas subdividida em dois grupos de quatro equipas.

Acrescentava-se: «O dia de amanhã terá solenidade. Em todos os terrenos, de norte a sul, antes do começo dos desafios, os diretores da Federação ou os seus delegados, lerão uma mensagem – elevado documento desportivo – do professor Cruz Filipe, presidente da FPF». Elevado ou não, esta parte já cheirava a estucha. Mas não seria por causa da arenga que o povo deixaria de comparecer nos estádios em quantidade muito razoável.

 

A primeira jornada!

Sorteio realizado, seria no dia 20 de janeiro que se disputaria a primeira jornada do primeiro campeonato nacional de futebol. E não houve grandes surpresas.

Jogo de maior cartaz, o das Salésias, seguramente, entre Belenenses e FC Porto. Era uma equipa portista poderosa, de tal forma que viria a conquistar essa edição da prova, com o guarda-redes Soares dos Reis e os avançados Waldemar Mota e Artur de Sousa, o Pinga, vindo da Madeira e figura maior do futebol nacional. Apesar da popularidade de ambos, a imprensa sublinhou a sua exibição com um epíteto nada convencional: «fracativo».

Empate final, um a um. José Luiz dá vantagem ao Belenenses mas, no segundo tempo, logo a abrir, Nunes marcou de cabeça. Depois foi Bernardo a chutar «anemicamente» um penálti. Soares dos Reis defendeu. 

O FC Porto foi campeão com 22 pontos (duas derrotas, fora, com o Benfica e Vitória de Setúbal), seguido de Sporting (20) e Benfica (19). O Belenenses ficou em quarto, com 18 pontos. 

Na época seguinte manteve-se a fórmula: os oito primo divisionários pertenciam aos quatro campeonatos regionais considerados mais competitivos – Lisboa, Porto, Coimbra e Setúbal: o pior classificado dos lisboetas, União, desceu (embora tivesse ficado acima de Académico do Porto e Académica de Coimbra), subindo o Carcavelinhos.

Mas regressemos ao dia 20 de janeiro. 

Nas Amoreiras, o Benfica venceu o Vitória por 3-1. Rogério de Sousa e Valadas eram as peças mais importantes do ataque encarnado. Valadas apontou dois golos nessa primeira jornada e acumularia 13 no final da época. O melhor marcador do torneio foi manuel Soeiro do Sporting que, logo para começar, fez um hat-trick na vitória leonina no Campo de Santa Cruz, em Coimbra, frente à Académica. Mourão (2) e Ferdinando rematam a goleada por 6-0. Inequívoca!

Encerrou-se a ronda com aquele que foi, provavelmente, o mais emocionante dos encontros que se disputaram: no Porto, o Académico recebeu o União de Lisboa e o resultado foi sofrendo voltas e reviravoltas até terminar em 3-3.

Estava em marcha uma competição que teve, nos seus primeiros anos, o carimbo de «experimental», mas que não podia faltar no calendário nacional, tal como acontecia um pouco por toda a parte onde o futebol passara para outra fase de evolução.

O Campeonato de Portugal, que se disputava simultaneamente, passaria a ser designado por Taça de Portugal, quatro anos mais tarde, tal como sempre se devia ter chamado por via da sua fórmula de disputa, em eliminatórias. O troféu, aliás, manteve-se inalterável e com o nome dos vencedores cravados na base. No fundo, era apenas aceitar a modernidade.