#NoLongerChurches

Encontro em Roma debateu que destino dar às igrejas ‘desativadas’. Diretrizes deverão ser conhecidas nas próximas semanas, mas há algumas conclusões: espaços não deverão dar lugar a pubs e discotecas, mas continuar a ser ativos para um projeto pastoral integrado na comunidade. 

Bares, restaurantes, livrarias. Por todo o mundo, e Portugal não foge à regra, não faltam exemplos de templos religiosos que deram lugar a espaços completamente diferentes. Insólito para uns, arrojado para outros, a igreja italiana quis envolver-se no debate e criar diretrizes para que o destino de lugares dispensados de culto não se separe totalmente daquela que era a vocação inicial dos edifícios. As conclusões do encontro, que teve lugar em Roma na semana passada, deverão ser conhecidas em breve, mas para já foram partilhadas algumas mensagens gerais. Mais do que pubs e discotecas, a igreja quer passar a trabalhar com a sociedade civil para criar espaços que sejam um ativo para os dois lados. Em sintonia com as novas ferramentas digitais, foi criada uma hashtag para reunir bons exemplos espalhados pelo mundo – #NoLongerChurches.

‘Deus não habita mais aqui?’ A pergunta foi o mote dos trabalhos na conferência internacional que teve lugar na Pontifícia Universidade Gregoriana, que tem como reitor o jesuíta português Nuno Gonçalves. Os trabalhos começaram com uma mensagem do Papa, que reconheceu que hoje existem muitas igrejas abandonadas, «seja por falta de fiéis e de clero, seja por uma distribuição diferente da população nas cidades e nas zonas rurais». 

Defendendo que a redução do número de igrejas abertas à população deve ser a última opção, Francisco sublinhou que o destino a dar aos templos que seja incontornável dispensar de culto deve ser inserido na programação pastoral, sempre com a população devidamente informada, para evitar o «escândalo». E embora as diretrizes aprovadas pelos participantes ainda não sejam conhecidas – deverão ser publicadas nas próximas semanas pelo Pontifício Conselho para a Cultura – os comunicados que foram sendo libertados pela organização dão algumas pistas, fruto da contribuição de representantes de diferentes países. Museus, salas de convívio e até experiências de residência artística com autores contemporâneos são algumas das propostas para manter vivos os templos. Pubs e discotecas deverão ser desaconselhados.

Sandra Costa Saldanha, diretora do Secretariado Nacional para os Bens Culturais da Igreja, da Conferência Episcopal Portuguesa, falou no encontro da importância de preservar o património cultural e histórico das igrejas e de haver pessoas com formação envolvidas nos projetos. Um novo manual preparado pelo secretariado com metodologias que ajudam a fazer o inventário de bens culturais, lançado este ano, foi um dos contributos portugueses para os trabalhos.

Estima-se que milhares de igrejas tenham sido fechadas ao culto nos últimos anos. Só em Itália terão sido desativados e destinados a outros fins 600 a 700 templos. Já na Alemanha estima-se que tenham sido enceradas 515 igrejas na última década.  Em Portugal, embora não haja números conhecidos, nos últimos anos houve alguns projetos a ocupar igrejas antigas. Em Óbidos, a conversão da igreja de São Tiago numa livraria foi um dos primeiros gestos que viria a transformar a vila num dos bastiões literários do país. No Porto, uma antiga capela deu em 2016 lugar a um bar – Capela Incomum. Em Dublin, uma igreja do século XIII convertida em pub é hoje uma das atrações turísticas da cidade. 

Por agora, e enquanto se aguardam as novas diretrizes da Santa Sé, as balizas estão no Código de Direito Canónico, que prevê que, quando uma igreja deixa de ter culto divino, o bispo diocesano pode «reduzi-la a usos profanos não sórdidos». No encontro em Roma, foram divulgados os vencedores de um concurso fotográfico com exemplos de igrejas reutilizadas na Europa, onde o divórcio não foi total. Uma das imagens vencedoras (em cima, ao centro) mostra o Museu Arqueológico do Carmo, em Lisboa.