Ao ler nos jornais a detenção do alegado hacker dos emails do Benfica – verdadeiros, falsos ou truncados –, só me surpreende a ‘surpresa’ de muitos comentários sobre o tema.
As pessoas esqueceram facilmente o episódio do Wikileaks e Julien Assange, e parece que nada retiveram desta realidade.
Depois, com alguma notoriedade, houve o Football Leaks (ao qual aparentemente este jovem agora preso também está ligado, e que constitui, ao que li, argumento essencial da sua defesa). E, pelo meio, saíram diversas notícias sobre ataques informáticos a centrais de IT de diversas empresas nacionais ou mundiais (recentemente, uma sociedade de advogados com notoriedade em Portugal) e, até, de departamentos de segurança de alguns Estados.
Onde quero chegar? Muito simples: conhecendo desde há muito a existência destes crimes informáticos, qual a razão para continuarem a subsistir entidades que acham que eles apenas se passam com os outros? Claro que ‘casa arrombada, trancas à porta’. Os que foram vítimas começaram finalmente a investir milhões na segurança dos seus sistemas informáticos. E aqueles que veem ‘as barbas do vizinho a arder’ colocam as deles ‘de molho’. Assim, se outro mérito não houvesse, todas estas notícias talvez contribuam para o reforço da segurança informática de forma geral.
Por razões profissionais, este tema sempre me preocupou. Mas a verdade é que em Portugal apenas as muito grandes empresas, sobretudo as cotadas e as internacionais, não precisaram de ver as devassas alheias para tomarem as precauções devidas.
Roubar informação é sempre crime! Partindo desta premissa, ainda ouso dizer que só assim se ficaram internacionalmente a conhecer muitos esquemas fraudulentos ou no mínimo ‘menos éticos’.
A relevância pública da informação assim recolhida – e da forma como o foi – gera discussões jurídicas intermináveis que nem me atrevo a comentar. A privacidade é indiscutivelmente um direito, mas muita da informação exposta de forma ilegal também não pode ser ignorada quando contraria outros padrões, sejam legais ou fiscais.
Daqui até aos julgamentos populares vai um pequeno passo. Sucedeu isso com o Benfica, com ou sem razão. Pode perfeitamente suceder a quem tiver a sua informação confidencial exposta na praça pública.
Falando de crimes, muito se fala sobre a corrupção em Portugal. Segundo a imprensa, o ministro Siza Vieira veio lamentar a notoriedade que lhe é dada «como fator estrutural de deterioração da competitividade portuguesa», em relatório da OCDE ainda não divulgado.
Tem razão em lamentar essa situação. Mas o cerne da questão nada tem a ver com a OCDE mas com o nosso país. Joana Marques Vidal não falou nisso? Na sua tomada de posse em outubro passado, a nova PGR, Lucília Gago, não falou nisso? Marcelo também o referiu nesta cerimónia da abertura do ano judicial. Que tal se o Governo combatesse o flagelo, seguindo as recomendações sugeridas ou outras, em vez de se lamentar do assunto? Parece que seguem a velha máxima de ‘matar o mensageiro’ em vez de resolver o problema.
Claro que é chato o rascunho do relatório mencionar a Operação Marquês, dar recomendações para criar um tribunal contra a corrupção ou sugerir a revisão do sistema de recursos.
Mas o problema é a perceção generalizada, a nível interno e internacional, de que existe corrupção em Portugal.
Internamente, todos contam ‘estórias’ comezinhas de como A, B ou C facilitou isto ou aquilo. Internacionalmente, como não haveria de dar brado um julgamento envolvendo um ex-primeiro-ministro? Estas são as realidades a combater, e ‘tapar o sol com a peneira’ nada ajuda, apenas fomenta a perceção internacional. Era mil vezes preferível que o Governo agradecesse esta contribuição valiosa para fomentar a mudança absolutamente necessária – e que considero ser prioridade absoluta da nossa sociedade. Como, de resto, também o entendem as principais figuras nacionais em matéria de Justiça.
P.S. – Rui Rio ganhou obviamente a votação no Conselho Nacional, realizada ‘em casa’, no Porto, e por voto secreto. Mas o PSD não ficou unido e não se vai unir enquanto Rio não fizer oposição ‘forte e feia’. Os seus militantes e simpatizantes esperam isso. Luís Montenegro apenas veio dar voz púbica ao que em surdina se vai comentando: «com Santana na Aliança a fazer oposição pura e dura ao Governo, e Rio a dourar a pilula a Costa, até onde o PSD vai descer nas eleições?».