Portugal descartou 8.927 milhões de fundos comunitários

De acordo com Eugénio Rosa, só foram usados 48,3% do total das verbas e isso vai ter reflexo na fatura a pagar: «Sem investmento público e privado não há modernização e inovação do aparelho produtivo e das infraestruturas do país, indispensável para o crescimento económico e criação de emprego e salários dignos».

Portugal só usou 48,3% dos fundos comunitários no período 2014/2018. O alerta é feito por Eugénio Rosa, no estudo Portugal é um dos países que menos investe na União Europeia e, nas contas do economista, até ao final do ano passado ficaram por utilizar 8.927 milhões de euros. «Existe, infelizmente, uma enorme diferença entre a propagando governamental sobre o investimento em Portugal e a realidade», lamentou. 

Os números são simples: segundo o programa financeiro anual aprovado pela Comissão Europeia, Portugal podia ter utilizado, até dezembro de 2018, 17.263 milhões de euros de fundos comunitários, mas só executou 8.335 milhões de euros. Segundo o economista, esse «desperdício» ainda é mais grave quando analisado o programa Portugal-2020 (em vigor entre 2014/2020), uma vez que até ao final do ano passado, ou seja, após cinco anos do início do programa foi utilizado apenas 33,6% do total da verba que, ao todo, disponibiliza 24.793 milhões de euros. 

Essa falta de aposta também é visível no desenvolvimento dos programas operacionais, uma situação considerada «ainda mais grave» por Eugénio Rosa. E dá exemplos: no Programa Operacional Competitividade e Internacionalização (POCI) – que dá apoio à modernização e internacionalização das empresas portuguesas – foi executado até ao final do ano passado cerca de 46% da verba programada para o período 2014/2018. Já no Programa Operacional Inclusão Social e Emprego (POTISE) foi utilizado apenas 40,2%, enquanto no Programa Operacional Sustentabilidade e Eficiência de Recursos foi usado 28,6% do total. Por seu lado, nos Programas Operacionais Regionais (Norte, Centro, Lisboa, Alentejo e Algarve) o que foi executado, até dezembro de 2018, variou entre 23,5% e 29,4% do total programado. 

«Este atraso significativo na execução dos Programas Operacionais do Portugal 2020, revelado pelos dados de ‘despesa validada’ (apresentada pelas entidades que executam o investimento), tem consequências dramáticas para o país, já que a utilização dos Fundos Comunitários induz (alavanca) investimento privado e, em alguns programas operacionais, também o investimento público», diz.

Um cenário que sai caro ao país: «Sem investimento público e privado não há modernização e inovação do aparelho produtivo e das infraestruturas do país, condição indispensável para que haja crescimento económico e desenvolvimento, e criação de emprego e salários dignos».

E os problemas não ficam por aqui. O economista afirma ainda que, apesar do atraso do país quando comparado com a média da União Europeia, o investimento total, medido em percentagem do Produto Interno Bruto (PIB) continua a ser muito inferior à média dos países europeus.

Vamos a números: tendo como base os dados do Eurostat, Eugénio Rosa chama a atenção para o facto de, em 2009, o investimento total em Portugal corresponder a 21,1% do PIB português, enquanto a média na UE correspondia a 20,6% do PIB. E, a partir desse ano, verifica-se um «afundamento do investimento total no nosso país», tendo-se verificado o valor mais baixo – 14,8% do PIB – em 2013 com o Governo de Passos Coelho. Só a partir daí é que se assiste a uma ligeira recuperação até 2018, altura em que representava 17,1%, quando a média da UE, no mesmo ano, era 21,8%. 

«É evidente que Portugal com este nível de investimento, a manter-se, nunca alcançará a média do desenvolvimento da União Europeia e os portugueses terão de continuar a emigrar para encontrar empregos e salários mais dignos. Portugal é e será um país de salários mínimos e baixos funcionado isso como atrativo para turistas», diz o economista no estudo.

Aposta pública fica para trás

Também em matéria de investimento públicos, os dados não são animadores. Eugénio Rosa lembra que, segundo os dados do Eurostat, em 2009, esta aposta correspondeu a 4,1% do PIB, quando a média na União Europeia era 3,7%. No entanto, a partir dessa altura, o cenário alterou-se até atingir 1,8% do PIB em 2018, quando a média na União Europeia foi, em 2018, 2,7%. 

Números que merecem críticas por parte do economista. «A obsessão em reduzir o défice a zero está a estrangular ó crescimento e o desenvolvimento do país, e rapidamente se refletirá em baixas taxas de crescimento económico e desenvolvimento», refere o documento. E deixa uma garantia: «Um dos problemas mais graves que o país enfrenta, e que dificulta uma recuperação económica efetiva e sustentável é o facto do investimento total (público mais privado) continuar a ser insuficiente não só para substituir os equipamentos gastos perlo uso e pelo tempo consumo de capital fixo) mas também para ampliar e inovar a capacidade produtiva do país». 

O primeiro-ministro já em fevereiro defendeu que Portugal tenha uma «visão inovadora» no acesso aos fundos comunitários, disputando cada vez mais as verbas da ciência e investigação de gestão centralizada e concorrencial, para além dos montantes da coesão. «É essencial que Portugal continue a beneficiar dos fundos de coesão, mas também temos de reconhecer que, para darmos o salto em frente, tendo em vista que os próximos anos sejam de continuidade em termos de convergência com a União Europeia, temos de reforçar a nossa competitividade H e só a reforçaremos com mais investimento em ciência e em conhecimento e na sua transferência para o tecido empresarial», disse António Costa.