O lugar de Assunção Cristas

Até hoje nunca ouvi críticas à estratégia solitária do CDS. Essa é a questão, tudo o resto são pormenores…

Assunção Cristas precipitou-se», escrevi nesta coluna em fevereiro de 2017, num artigo que mereceu logo na altura viva contestação de muitos centristas. Artigo que foi lembrado na noite das eleições autárquicas, quando a líder do CDS-PP arrancou o melhor resultado de sempre do partido em Lisboa (excetuando a vitória já longínqua de Krus Abecasis).

Ora, o que escrevi em fevereiro de 2017 acerca das eleições autárquicas de 1 de outubro desse ano que motivou essas reações? Escrevi o seguinte: «Os media puxam muito por Assunção Cristas. É uma candidata muito acarinhada pela comunicação social, sobretudo para chatear os ‘laranjinhas’. Escreve-se que terá uma votação na casa dos dois dígitos. Ora, isso é altamente improvável. Os candidatos dos partidos normalmente têm as votações dos seus partidos. Assunção Cristas vale em urna o que o CDS vale. Muito dificilmente chegará aos 7.5% que Paulo Portas teve em 2001. A última vez que o CDS teve um candidato que ultrapassou largamente a respetiva fasquia foi com Lucas Pires». Mas escrevi mais: «Defende-se que o PSD estava obrigado a apoiar o CDS. Assunção Cristas adotou a atitude de ‘Eu vou, quem quiser venha também’. Ora, essa atitude impositiva e voluntarista não facilitou nenhum entendimento partidário com o PSD. Assunção Cristas precipitou-se».

O exercício de prognose estava errado – e tal facto foi devidamente assinalado na noite das eleições autárquicas em que o CDS chegou aos 20%, tornando-se a principal força de oposição na capital.

Depois de uma fase inicial de euforia com Lisboa, Assunção Cristas desinteressou-se. Apesar de ter eleito quatro vereadores, onde o PSD só elegeu dois, e do brilhante resultado, portou-se como uma criança que rapidamente perdeu o interesse pelo brinquedo novo. Tanto é assim que, pouco tempo depois, deu uma muito falada entrevista em que declarava que queria ser primeira-ministra, mas não declarou que ambicionava ser presidente da Câmara de Lisboa. 
E ainda a tinta da entrevista estava fresca, já se punha ao caminho para preparar as eleições europeias. Ou seja, Assunção presidente do CDS, Assunção líder da oposição em Lisboa, Assunção candidata a primeiro-ministro e Assunção nas europeias.

Embora possa ter parecido uma estratégia política genial, creio que declarar que se quer ser primeiro-ministro quando se é líder de um partido que vale entre 6 a 10% em qualquer circunstância já seria pouco avisado, mas naquele momento deitou fora o capital que tinha acumulado em Lisboa. 

As europeias, com o candidato Nuno Melo, foram dececionantes. Elegeram só um candidato, deixando duplamente de fora Pedro Mota Soares (as listas para as legislativas já estão fechadas). 

Escreveu-se, por isso, que Assunção Cristas teria problemas na liderança após as legislativas. Mas olhemos com cuidado: aquilo que definiu a sua acção política, desde o momento em que deixou de governar com o PSD e passou à oposição, foi uma radical autonomia do CDS. Daí o lançamento à Câmara de Lisboa como candidata sozinha. 

Portanto, para se falar de uma alternativa real à liderança de Assunção Cristas, esta teria de passar pelo abandono da radical autonomia do CDS e pela adoção de políticas de aliança com o PSD. 
Alguém as quer no CDS? 

Até hoje, porém, nunca ouvi críticas face à estratégia solitária. Essa é a questão, tudo o resto são pormenores…