Ou muito me engano… ou ele vai fazê-la

António Costa vai impor a regionalização como impôs uma nova lei da greve sem sequer lhe tocar.

Se António Costa tiver maioria absoluta ou uma maioria à Guterres que lhe permita ir governando como melhor entender – com negociação à vista com um deputado de qualquer outra bancada, tipo deputado limiano ou ‘do queijo’ -, o mais certo é daqui a um par de anos termos o país regionalizado, sem termos dado muito bem por isso, porque sem referendo algum e sem sequer grandes alterações legislativas.

Basta-lhe estar no poder e continuar a gerir o poder, arte em que, de facto, é realmente exímio.

A lei – para ele – não é problema.

António Costa demonstrou-o bem na questão da greve dos motoristas de matérias perigosas, em que foi muito além dos limites que, na interpretação de qualquer partido ou organização de esquerda, incluindo o PSD de Rui Rio, a lei da greve impõe.

Aliás, de tal forma que o próprio ministro adjunto e da Economia, Siza Vieira, da ala menos à esquerda do PS, tendo começado por assumir de viva voz que era necessário rever a lei da greve, logo foi aconselhado a atalhar que se tratava de uma mera opinião pessoal sobre um assunto que manifestamente não estava em cima da mesa, até porque, afinal, não havia urgência alguma.

Mas António Costa foi mais longe, convictamente afirmando que não há necessidade de alterar a lei da greve coisa nenhuma, uma vez que a lei, tal como está, pelos vistos permite a convocatória de militares para garantirem o trabalho de grevistas ou a contratação de trabalhadores no estrangeiro (em Espanha, por exemplo) para compensar os serviços por aqueles não prestados.

E fê-lo com a maior das tranquilidades, enaltecendo a legalidade de todo o processo de requisição civil e não só e a desnecessidade de alterações legislativas manifestamente supérfluas.

E as suas decisões anulando quase por completo os efeitos de uma greve legítima tornaram-se factos consumados, sem apelo nem agravo e com a complacência dos parceiros de ‘geringonça’ e nomeadamente das suas extensões sindicais – as centrais por eles controladas.

Extraordinário!!!

Ora, imaginando-se com maioria absoluta ou com uma maioria suficientemente substancial (dependendo apenas de um ou dois deputados que pode arregimentar avulso e em qualquer bancada parlamentar consoante os interesses e a oportunidade), Costa avançará para uma progressiva descentralização, ao ponto de tornar a regionalização também facto consumado, sem referendo nem revisão constitucional ou coisa alguma.

É sabido que Costa é um acérrimo defensor da descentralização e da regionalização. 

E se nesta legislatura a Comissão Cravinho lhe fez o favor de dar sustentação e legitimidade à recuperação das regiões como forma (a melhor, dizem eles) de reorganizar o Estado, basta olhar para o programa do PS para perceber como o seu líder tenciona fazê-la na próxima.

Aos poucos e indiretamente.

Tomemos por exemplo o caso dos passes sociais metropolitanos. A medida mereceu aplauso generalizado – quase unânime – e a verdade é que, como consequência, teve de ser aprovado um ‘diplomazinho’ para permitir a criação de uma empresa regional para gerir a bilhética metropolitana. Foi só uma nova lei, que ninguém criticou ou sequer questionou – e a verdade é que abriu a porta à criação de empresas regionais, até aqui inexistentes. Mas já era imperativa, porque indispensável para concretizar os passes sociais metropolitanos.

E assim se fará a regionalização. Não pela calada do verão, como escreveu Miguel Sousa Tavares, a propósito da Comissão Cravinho e das suas conclusões impulsionadoras da criação das regiões, mas nas costas do povo e por uma ação continuada do próximo Governo de Costa – absoluto ou quase absoluto, socialista, descentralizador e regionalista.

António Costa nunca deixou marca nos vários cargos públicos inscritos no seu já vasto currículo – e a única que fica para a História desta legislatura é dramática: as mais de cem mortes nos incêndios de 2017. 

A regionalização será a sua grande oportunidade. E não vai desperdiçá-la. 

A não ser que me engane. Pode ser que sim. Oxalá que sim.

Portugal não precisa de mais Estado, de mais burocracia, de mais um patamar na administração pública, de mais aparelho, de mais clientelas, de mais divisões.

Poupem-nos!