EDP acelera venda 
de ativos

Elétrica vendeu seis barragens e encaixou 2,2 mil milhões. A operação ficou 200 milhões acima das expectativas de mercado e vai ao encontro do plano estratégico anunciado em março.

Avenda de seis barragens da EDP por 2,2 mil milhões de euros ao consórcio constituído por Engie (com participação de 40% do capital), Crédit Agricole Assurances (35%) e Mirova – Grupo Natixis (25%) vai alterar por completo, nos próximos anos, o panorama da produção energética hídrica em Portugal. A EDP detinha, desde sempre, a totalidade da quota de mercado nesta área. 

Esta alteração é aplaudida pelos analistas contactados pelo SOL, que reconhecem que irá trazer maior concorrência ao setor, já que a quota de mercado da EDP irá cair para os 64%, ficando as restantes fatias divididas pelo novo consórcio (21%) e pela Iberdrola (15%).

«A EDP perderá o monopólio da produção hídrica em Portugal, com a sua quota a descer dos 100% para os 64%. O setor entrará assim no mercado da concorrência, o que poderá trazer alteração ao preço e ao nível do serviços prestados», refere Nuno Caetano, analista da corretora Infinox.

Reduzir a dívida do grupo e minimizar os riscos são algumas das razões apontadas pelo CEO da elétrica para justificar a alienação. Mas a verdade é que a operação vai ao encontro do plano estratégico da empresa até 2022, anunciado em março, que assentava no reforço na energia renovável e na venda de ativos. 

No entanto, António Mexia, anunciou que esta operação «permite, desde já, antecipar em 74% as metas definidas no plano». Mas o presidente da empresa esclareceu que «não há intenção de ir para além dos objetivo anteriormente definidos» e, nesse sentido, a EDP não vai vender mais unidades do seu portefólio.

Nuno Caetano recorda que a dívida da empresa rondava os 14 mil milhões de euros, em meados do ano, e também irá permitir reduzir riscos, num período em que se avizinha menos chuva. Ainda assim, lembra que o capital encaixado poderá também servir para o pagamento de dividendos numa altura em que o resultado líquido tem vindo a descer. «A médio prazo, o payout ratio superior a 100% é impossível ser sustentável, fator que já aconteceu este ano», salienta.
Também André Pires, analista da XTB, recorda que o objetivo da empresa liderada por António Mexia ao se desfazer de alguns ativos «é o de melhorar o perfil de risco da empresa, reduzindo a exposição ao mercado de energia e à sua volatilidade. Em geral, uma maior diversificação é que diminui o risco, e não o contrário». No entanto, recorda que essa «alteração na estratégia da empresa poderá servir para a focagem da empresa em áreas com maior rentabilidade, em ativos em que tenha maiores capacidades de desenvolvimento, e aí sim, reduzir o risco». 

Governo dará ok

De acordo com as contas da elétrica, a venda das seis barragens – três de fio de água (Miranda, Bemposta e Picote) e três de albufeira com bombagem (Foz Tua, Baixo Sabor e Feiticeiro) – irá refletir-se no EBITDA da EDP que, neste segmento, cai de 18% para 13%. A capacidade produtiva fixa-se em 5,5 GW, o que permite à energética manter a liderança no mercado português e ocupar a segunda posição na Península Ibérica.

A oficialização do negócio entre a EDP e o consórcio entra agora numa fase formal. No início do ano,a elétrica vai criar uma nova entidade, com o objetivo único de gerir e oficializar o contrato de compra e venda. Os passos finais ficam apenas dependentes da aprovação do Governo, com o aval das entidades reguladoras, como a Associação Portuguesa do Ambiente, a Direção-Geral de Energia e Geologia e também da Autoridade da Concorrência, o que deverá acontecer só no segundo semestre de 2020. Uma situação que não preocupa os responsáveis. António Mexia garantiu ter «confiança na aprovação do negócio», recordando, aliás, que «vários responsáveis políticos já se manifestaram interessados em ver aumentar a concorrência no setor da energia». 

Uma expectativa que vai ao encontro das declarações dos analistas contactados pelo SOL. Nuno Caetano não tem dúvidas: «Creio que o Governo não irá dificultar a operação. Irá dar como justificação o aumento do nível de concorrência do mercado, no entanto, a pressão do Governo Chinês como maior da acionista da elétrica, não daria a António Costa outra alternativa que não dar luz verde à operação». Uma opinião partilhada por André Pires, que admite que o negócio deverá ter luz verde por parte do Executivo, recordando que «o acordo obtido com a Engie foi num valor superior ao avaliado pelo mercado», ou seja, em cerca de 200 milhões de euros.

As negociações prolongaram-se por vários meses, despertando o interesse de várias outras empresas e fundos de investimento, como, por exemplo, a Iberdrola, a Endesa, a Enel, a Verbunda, a Brookfield e a Macquarie. O presidente António Mexia confessou que o processo ficou fechado apenas na véspera do anúncio e a escolha acabou por recair no consórcio liderado pela francesa Engie, uma parceira da EDP em diversos projetos – e com a qual criará em breve uma nova empresa dedicada à produção de energias renováveis offshore (ver coluna ao lado) – e que agora será simultaneamente uma concorrente.

Menos 2 mil milhões de dívida e dividendos de 3 mil milhões 

Só em Portugal e em Espanha, a empresa pretendia encaixar mais de dois mil milhões de euros. 
As contas são simples: a EDP prevê uma geração de recursos financeiros de 12 mil milhões de euros nos próximos quatro anos, ou seja, 2,9 mil milhões de euros por ano, dos quais sete mil milhões serão canalizados para novos investimentos. 

A empresa liderada por António Mexia revelou ainda que cerca de 75% do investimento previsto para os próximos quatro anos será em energias renováveis, sendo os Estados Unidos o principal destino (40%), seguidos pela Europa (35%) e o Brasil (25%). 

Ao mesmo tempo, a elétrica acredita que irá distribuir três mil milhões de euros em dividendos e usar cerca de dois mil milhões de euros para baixar a dívida até 2022.