‘Não há áreas territoriais ou intelectuais em que a PJ não entre’

Polícia Judiciária deteve suspeitos das agressões fatais a Luís Giovani. Os cinco homens foram ontem presentes a tribunal. Diretor da PJ deixou uma mensagem de conforto à família do jovem e à comunidade cabo-verdiana. 

A Polícia Judiciária deteve cinco homens suspeitos de terem a agredido em Bragança a 21 de dezembro Luís Giovani Rodrigues, o estudante cabo-verdiano que veio a morrer dez dias depois, ou seja no último dia do ano. E em causa, concluíram os investigadores, não esteve qualquer crime racial, mas sim um homicídio cometido por motivos fúteis. «Não se trata de um crime entre nacionais de um país ou de outro, de raças, não se trata de nada disso.Trata-se de um crime cometido por gente violenta, num determinado contexto e, portanto, algumas das notícias veiculadas de uma forma minoritária não têm qualquer consistência», assegurou ontem Luís Neves, diretor nacional da Polícia Judiciária.
As detenções aconteceram após na última quinta-feira as autoridades terem levado a cabo buscas domiciliárias, inquirições e interrogatórios de vários suspeitos. «Na sequência desta ação operacional [foram ainda] apreendidos elementos probatórios relevantes», esclareceu fonte oficial da PJ. Os detidos, com idades entre os 22 e os 35 anos, que serão o núcleo duro do grupo suspeito das agressões fatais a Luís Giovani, foram ontem presentes a tribunal.

A mensagem de conforto e o agradecimento à PSP
A direção nacional da Polícia Judiciária entendeu, de forma inédita, fazer ontem um esclarecimento por reconhecimento ao trabalho dos homens daquela polícia que investigaram a morte do jovem Luís Giovani. Segundo Luís Neves os inspetores e os peritos trabalharam nestes dias «com grande entrega para apresentar um resultado e uma resposta a um problema que além de ser uma questão de investigação criminal era um problema que extravasava essa investigação, sobretudo na questão do alarme social». 

«Hoje durante a manhã transmitimos a nossas condolências ao pai do Giovani, demos-lhe uma palavra de conforto, porque perder um filho nestas circunstâncias e com este alarme social [é muito difícil]. Havia que se dar uma resposta. E falámos também com o senhor embaixador de Cabo verde, a quem transmitimos igualmente uma palavra de conforto».

Mas durante a intervenção de Luís Neves houve ainda destaque para o apoio prestado pela Polícia de Segurança Pública na investigação. Depois de ter sido noticiado que uma fonte da PJ considerava que esta polícia tinha chegado tarde ao caso (uma vez que a PSP só comunicou a ocorrência a 31 de dezembro quando o jovem morreu e o caso passou a ter contornos de homicídio), o diretor nacional da PJ deixou claro que foi dado «um grande apoio por parte da PSP» neste caso: «O comando da PSP de Bragança, os seus homens e as suas mulheres, entregaram de alguma forma o seu melhor, para que pudessem colaborar connosco e respondessem a todos os pedimos que fizemos». Algo que mais à frente, Luís Neves viria a sublinhar: «Uma palavra de reconhecimento e gratidão à PSP».

Comunhão de povos continua e PJ não tem medo de nada
Rejeitando qualquer motivação racista no ataque, o diretor nacional explicou que os suspeitos estão agora indiciados por homicídio qualificado e por três crimes de tentativa de homicídio – relativamente às outras vítimas que sobreviveram. 

A investigação vai agora continuar e não está fechada a porta a mais detenções, ainda que para a PJ seja já claro nem todas as pessoas do grupo inicialmente referido, composto por cerca de 15 pessoas, terão participado nas agressões.
«Entendemos que o núcleo duro que perpetrou as agressões são os elementos que foram detidos», explicou Luís Neves, acrescentando que apesar disso os suspeitos, todos residentes em Bragança, não têm antecedentes criminais conhecidos.

Ontem foi ainda revelado que os elementos probatórios são sobretudo assentes em prova testemunhal e nas declarações dos próprios arguidos, havendo outros factos relevantes que a PJ prefere não comunicar por enquanto.
«Na base dos factos [está] uma desavença que ocorreu no interior de um espaço lúdico e que teve consequências no seu exterior. Acontecimentos que muitas vezes sucedem e que não acabam com um resultado de morte, como infelizmente neste caso aconteceu», continuou o responsável, lembrando que Portugal e concretamente Bragança são territórios onde os estrangeiros são bem-vindos: «Este crime extravasou aquilo que é a investigação criminal, há questões sociais, de integração e há esta palavra para dar: Bragança e o nosso país é um território de grande acolhimento, de grande irmandade, neste caso com o povo de Cabo verde, um povo fraterno, ligado a nós pela lusofonia, com grande afinidade cultural e um povo irmão a quem queremos expressar […] uma palavra de conforto».
Mas na sua inédita intervenção de mais de dez minutos, Luís Neves também disparou alguns avisos em tom de crítica: «A Polícia Judiciária não tem medo de qualquer atuação, entra em todos os cenários, entra onde tem de entrar, da forma que tem de entrar, porque vivemos num estado de direito democrático e porque não existem áreas sejam territoriais ou intelectuais onde não consigamos entrar. Estamos preparados para isso e para sofrer em silêncio o tempo que for preciso».

Luís Giovani tinha chegado dois meses antes das agressões a Bragança para estudar no Instituto Politécnico da cidade. Naquela noite foi com amigos a uma discoteca onde se terão desentendido com um grupo que estava no interior. À saída, Giovani e os amigos eram esperados pelos agressores tendo sido alvo de diversas agressões.Dez dias depois o jovem cabo-verdiano não resistiu aos ferimentos e morreu no hospital.