CDS vai optar pelo ‘líder natural’ ou pela ‘surpresa’?

João Almeida é o candidato com mais apoios declarados antes do Congresso de Aveiro, mas existem vários fatores que podem tornar a corrida à liderança do partido bem mais renhida.

CDS vai optar pelo ‘líder natural’ ou pela ‘surpresa’?

São cinco os candidatos à liderança do CDS-PP. Se uns apostam em assumir-se como herdeiros do legado deixado pelos mais recentes líderes do partido (nomeadamente, Paulo Portas e Assunção Cristas), outros preferem ‘cortar o mal pela raiz’, regressar às origens e à verdadeira identidade democrata cristã. Apesar dos resultados desastrosos, as apostas parecem mais inclinadas para a continuidade do que para a novidade. Mas a vitória não está garantida e pode não ser assim tão fácil.

João Almeida segue e soma apoios. Nomes fortes, como Nuno Magalhães, Adolfo Mesquita Nunes e Francisco Mendes da Silva já fizeram saber que apoiam o porta-voz da direção de Assunção Cristas. João Almeida representa uma continuidade da linha assumida até aqui pelo CDS-PP, com uma posição mais moderada em relação a questões fraturantes e com uma maior abertura ao centro-direita. Este é não só o caminho trilhado por Cristas, mas também a estrada aberta por Paulo Portas, que liderava o partido quando este integrou a coligação Portugal à Frente, com o PSD.

Mas o Congresso pode trazer muitas reviravoltas: na reta final da campanha, surgiram figuras proeminentes da política portuguesa a apoiar outros candidatos. o ex-dirigente centrista Luís Nobre Guedes revelou que apoia Filipe Lobo d’Ávila e Francisco Rodrigues dos Santos recebeu o apoio de Bagão Félix. «É muito aliciante que o CDS tenha um líder que faça o aggiornamento, que provoque uma corrente de ar, um refrescar de ideias», disse ao Público o ex-ministro das Finanças.

Mas não são só estes novos apoios que podem vir a baralhar as contas e a tornar a corrida pela liderança mais renhida. Não seria, aliás, a primeira vez que o partido lidava com uma reviravolta de última hora – em 2005, quando Paulo Portas se demitiu, Telmo Correia, considerado por muitos como o portista candidato ‘natural’ à sucessão, confirmou apenas na véspera do congresso que iria avançar. E a verdade é que o antigo líder da bancada parlamentar centrista – que reunia a quase totalidade dos apoios das mais destacadas figuras do partido – acabou por perder para Ribeiro e Castro no Congresso de Lisboa.

Alianças negativas

‘Chicão’  e Lobo d’Ávila não seráo os únicos obstáculos que João Almeida terá pela frente – a hipótese de surgir uma aliança negativa não é totalmente descabida. Vamos por partes: a votação das moções – vão ser debatidas 23 – será feita por 1160 delegados. É difícil perceber para onde pendem os seus apoios, mas deverão distribuir-se principalmente entre João Almeida, Francisco Rodrigues dos Santos e Filipe Lobo d’Ávila. Ora, se os apoios se dividirem muito entre as moções destes candidatos, o vencedor continuará muito fragilizado. 

Até porque a votação das moções funciona como uma espécie de primeira volta.  Quem vence esta fase apresenta uma lista candidata à comissão política nacional e aos restantes órgãos. Ora, os dois derrotados mais fortes podem unir-se e formar uma ‘aliança negativa’, conseguindo assim mais votos do que o vencedor. 

Lobo d’Ávila e Rodrigues dos Santos disseram em entrevistas que não entrarão neste esquema, mas há quem não descarte a hipótese: Carlos Meira assumiu mesmo que está disponível para, durante o Congresso, chegar a acordo com um destes candidatos para impedir a vitória de João Almeida. A verdade é que quando tanto um como outro foram confrontados por Meira com esta hipótese, num debate na RTP, não deram uma resposta concreta sobre o assunto.

Outro dos problemas que podem fragilizar João Almeida são os maus resultados obtidos nas últimas legislativas. Foram os piores resultados de sempre do partido, tanto em percentagem como em número de votos.  Foram ainda piores do que a crise de 1987/1991, quando Adriano Moreira viu o grupo parlamentar passar de 18 para quatro representantes, ficando com o epíteto de ‘partido do táxi’. Ora, sendo Almeida o candidato da continuidade, nada garante que o Congresso não o penalize como co-responsável. Veremos.

 

João Almeida – O Herdeiro

Além de ter integrado o Governo de Pedro Passos Coelho, na altura em que este se uniu a Paulo Portas para formar a coligação Portugal à Frente, João Almeida foi também porta-voz da última direção do CDS-PP – e daí que seja visto por muitos como o herdeiro do legado  Portas/Cristas. 
Quanto ao futuro, quer que o partido assuma a sua identidade, mas não descarta acordos com outros partidos. Aliás, um apoio a uma recandidatura de MarceloRebelo de Sousa à Presidência da República ainda não foi descartado.
Além disso, defende que o CDS deve começar a sair mais de Lisboa e a apostar numa política local, garantindo uma maior aproximação ao eleitorado. Defende também que o partido deve concentrar-se na luta contra a legalização da eutanásia, mas acha não é altura para alterar a lei do aborto. 
«Farei um congresso virado para o futuro, quero discutir a estratégia que devemos seguir para fazer com que o CDS-PP cresça e volte a merecer a confiança do eleitorado», garantiu em entrevista ao SOL.

Filipe Lobo d'Ávila – O Rebelde

Durante os últimos anos, tem sido uma das vozes mais críticas do trabalho desenvolvido por Assunção Cristas e sua direção.De tal forma que acabou mesmo por abandonar o seu lugar de deputado na Assembleia da República, em total divergência com a liderança do partido. «Do meu ponto de vista, o partido seguiu uma estratégia errada, foram cometidos demasiados erros, não se quis ouvir quem divergia e não fomos competentes a corrigir o rumo», criticou numa entrevista ao SOL.
Agora, defende que o partido tem de recuperar a credibilidade e a confiança do eleitorado. Diz que o CDS não deve ter medo de assumir a sua posição em questões fraturantes – daí defender que o partido deve pedir a «reversão gradual» da lei do aborto. Quanto a ligações com outros partidos, acredita que o CDS deve afirmar-se como partido da direita democrática e moderada e, por isso, não deve tentar replicar o Chega ou a Iniciativa Liberal. Amigo de João Almeida, afstou sempre a hipótese de desistir da corrida a favor de qualquer dos seus concorrentes. E vai à luta no Congresso de Aveiro.

Francico Rodrigues dos Santos – O Jovem

‘Chicão’, como é conhecido, já está há vários anos à frente da Juventude Popular. É essa experiência, defende, que o ajudará a trazer novidades para o CDS-PP e a torná-lo um partido mais jovem e irreverente. Aliás, a revista Forbes considerou-o, em 2018,  um dos 30 jovens mais brilhantes, inovadores e influentes da Europa com menos de 30 anos, na categoria de Direito e Política. 
Mas ser jovem não é sinónimo de inexperiência ou de posições pouco convictas. Sem descartar alianças, Francisco Rodrigues dos Santos defende que o CDS  «não servirá de muleta ao PS, nem a nenhum outro partido. Não nos vamos fundir, nem vamos permitir que nos lancem nenhuma OPA para que o CDS se dilua em qualquer outro partido. Se o CDS achar que tem de ser igual à Iniciativa Liberal, então aí, ponto final. Se o CDS achar que tem de ser igual ao Chega para ser politicamente forte, então chega. Se o CDS achar que tem de ser como o PSD aí acho que perde a sua  razão de ser e de existir» – como afirmou em recente entrevista ao SOL.

Abel Matos Santos – O Contoverso

É, provavelmente, o mais polémico dos candidatos à liderança do CDS-PP. O fundador do TEM – Tendência Esperança em Movimento quer quebrar com a linha que o partido seguiu nos últimos 20 anos e voltar às verdadeiras questões defendidas pela democracia cristã: a restrição do divórcio unilateral, a reversão da lei do aborto, a suspensão da adoção por casais do mesmo sexo são algumas das questões que apresenta na sua moção. «Não são questões fraturantes, são questões essenciais. São temas que resultam de um modelo de sociedade que se propõe e que defendemos», defendeu numa entrevista ao SOL. 
O psicólogo acredita que, para retomar a sua identidade, o CDS-PP tem de assumir as bandeiras certas e não ter medo de se expor enquanto partido de direita. «Não podemos ser um projeto credível de poder, sem antes sermos um projeto credível de defesa de ideias, causas, valores e princípios. É preciso afirmar um CDS de direita, sem complexos, afirmativo e convicto», afirma.

Carlos Meira – O Outsider

Até à derrota desastrosa do CDS-PP nas legislativas do ano passado, poucos eram os que tinham ouvido falar em Carlos Meira. Mas a sua ligação à política já vem de trás: além de ter sido presidente da concelhia do CDS-PP de Viana doCastelo, é neto de um antigo deputado da UniãoNacional, como fez questão de frisar no último congresso do partido. Defende que o CDS-PP não deve funcionar apenas no Largo do Caldas e assume-se como o candidato que defende os interesses dos militantes que vivem e trabalham no interior do país. 
Durante a campanha, foi autor das intervenções mais efusivas, pedindo «baldes de lixívia» para limpar a sede do partido e acusando quem lá está de ter levado o CDS à bancarrota.  No entanto, foi o único candidato a assumir que está disponível para alianças neste congresso: «Posso confirmar que almocei com o Francisco Rodrigues dos Santos e o Filipe Lobo d’Ávila. Fiz uma tentativa de nos unirmos os três para ganharmos ao João Almeida. Posso confirmar que poderemos, no congresso, tentar essa união para conseguirmos ganhar e lutarmos contra o sistema», disse à Lusa.