Depois de noticiado pelo SOL que a RTP tinha comprado dois trabalhos à Produções Fictícias por mais de 400 mil euros e que tinham em cima da mesa outro projeto de 600 mil – neste caso a empresa criada pelo atual secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media pretendia, ao que se diz, o apoio de 400 mil euros do Instituto do Cinema e do Audiovisual (ICA) –, o canal público deu uma resposta a 21 de fevereiro algo inédita. Que havia um programa que tinha sido comprado pela RTP2 e que já tinha sido exibido em dezembro último e que havia uma série humorística de 13 episódios que estava em estudo. Ah! E negava categoricamente o terceiro trabalho do pacote.
Esta semana, confrontada pela comissão de trabalhadores, a administração reconheceu que o primeiro trabalho já foi emitido, que o segundo será transmitido em 2021 e que o terceiro foi retirado pela própria Produções Fictícias. Pergunto, se o SOL, o i e a comissão de trabalhadores da RTP não tivessem questionado a administração da TV pública ficaríamos a saber que os dois negócios estão pagos e que o terceiro foi retirado depois da RTP_ter sido questionado publicamente?
Sobre os benefícios que Nuno Artur Silva tirará desta trapalhada é algo que a Assembleia da República deverá apurar, já que o secretário de Estado está muito ansioso de lá ir esclarecer tudo. Mas um homem que anda a brincar com isto tudo desde que foi administrador da RTP até aos dias de hoje ainda têm a distinta lata de se manter no cargo? Não se percebe como é possível o canal público estar envolvido em tantas polémicas nos últimos meses e ninguém pôr travão a tais demandas.
Mas a comunicação social vive momentos conturbados em várias frentes. Ontem, Francisco Teixeira da Mota dava conta no Público de um processo que só não acabou mal porque o Supremo Tribunal de Justiça, «pelas mãos da juíza-conselheira relatora Maria Clara Sottomayor e do juiz-conselheiro Alves Velho, num notável acórdão», restaurou «a ordem e a sanidade no processo». Processo esse onde o Correio da Manhã e quatro jornalistas seus tinham sido condenados a pagar 50 mil euros por terem noticiado que o juiz Rui Rangel tinha ficado a dever mais de dois mil euros a uma clínica. E quem foi o juiz que, apesar de se ter provado que a notícia era verdadeira, condenou o jornal e os jornalistas? O relator foi o juiz desembargador Orlando Nascimento, o tal que se demitiu há dias do cargo de presidente do Tribunal da Relação de Lisboa. Recorde-se que o CM tinha sido absolvido em primeira instância.
Voltando ao Supremo Tribunal de Justiça que decidiu que o CM e os quatro jornalistas nada têm a pagar a Rui Rangel, diga-se que houve um terceiro juiz-desembargador que votou vencido, Sebastião Póvoas, que, como escreve Teixeira da Mota, entendeu que «os jornalistas deviam ser condenados pela grave ofensa à honra de Rui Rangel» e que deveriam pagar 10 mil euros ao juiz que foi expulso da magistratura. O advogado escreveu ainda: «Deve ter sido por esta pérola do pensamento jurídico no campo da liberdade de expressão que Sebastião Póvoas está agora à frente da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC)». A mesma que avaliará, por exemplo, se Maria Flor Pedroso escondeu ou não um programa prejudicial à imagem do Governo e que terá dado cabo de uma investigação da sua equipa de jornalistas, pois prejudicava a instituição onde Flor Pedroso lecionava. Siga o baile que a festa está ao rubro.
vitor.rainho@sol.pt