“Número de casos confirmados tem aumentado dentro da curva estimada”, diz matemático

Pergunta e Resposta com Óscar Felgueiras, Matemático, investigador na área de doenças infecciosas d. Faculdade de Ciências da Universidade do Porto

Tendo em conta as previsões dos modelos matemáticos, como está a evoluir a epidemia? 

O número de casos confirmados tem aumentado dentro da curva estimada, que apontam para um crescimento na casa dos 40% por dia até começar a sentir-se o efeito de medidas de restrição social, o que poderá acontecer na próxima semana. De acordo com os relatórios da DGS, que referem data de início de sintomas, é possível fazer a análise para o tempo entre início de sintomas e momento de diagnóstico, e parece estar mais baixo em Portugal do que na China. Estimo em cerca de cinco dias cá, contra cerca de oito dias. Isso significa, na prática, que uma medida eficaz cá pode ter um efeito mais rápido nos números confirmados do que lá. O importante, crucial mesmo, é manter-se a guarda e não facilitar. 

Ter fechado todos os serviços não essenciais como fez Macau, com dez casos, teria ajudado?

Sinceramente, não acredito que num regime democrático houvesse capacidade de replicar o que Macau fez, no momento que fez. Teria ajudado? Certamente. Ainda que também exista o outro lado da medalha. Em Macau continuam vulneráveis. Basta o mínimo deslize e não estão livres de o vírus aparecer. Vão ter de se manter bastante tempo em permanente estado de alerta. 

Qual é o atraso de cada país em relação a Itália? 

A estimativa do atraso relativamente a Itália depende uma vez mais de alguns fatores. No entanto, pode assumir-se que a estimativa avançada por Jorge Buescu terá algum fundamento teórico, 18-19 dias. Mas, ressalvo, o facto de tomarmos medidas tão mais cedo poderá fazer com que tenhamos um cenário bem melhor em termos de número de estabilização do número de pessoas infetadas.

A epidemia começou a crescer mais depressa em Portugal do que noutros países? 

O nosso ritmo inicial de 45% é elevado. Aparentemente, somos dos mais rápidos. Mas mais do que a capacidade de aceleração inicial, temos de estar atentos à travagem. É possível travar. Essa tabela diz que Itália está com um crescimento médio de 20%, mas isso não quer dizer necessariamente que o nosso caso vá ser pior. A Bélgica, que lidera a tabela, está a travar muito rápido e poderá ser dos países mais bem-sucedidos. 

Qual é o efeito de uma quarentena geográfica como a que foi decidida em Ovar? 

É mais uma medida que faz sentido. Se se identifica um determinado local onde a situação fica descontrolada, ele merece particular atenção. Todo o país deve ser constantemente monitorizado de forma a identificar focos que causem preocupação. No entanto, continuo a defender que o ideal será aplicar uma restrição tão alargada quanto possível, pelo menos enquanto não houver sinais nítidos de melhoria.