Irrelevância democrática, estratégia e responsabilidades

Verificámos que a narrativa das organizações internacionais pode estar errada e que o facto de seguir os manuais internacionais de procedimentos cegamente não é mais que uma desculpa para não se tomar decisões em função da realidade concreta.

Uma das questões relevantes desta pandemia é a irrelevância dos regimes políticos na definição das estratégias e nos resultados da resposta.

A maior evidência do pós-Covid 19 é exatamente a constatação que quer regimes democráticos quer regimes totalitários tiveram resultados equivalentes e que a alegada superioridade dos regimes ditatoriais na implementação de efetivas estratégicas de controlo da disseminação, com Apps tecnológicas, não teve rigorosamente nenhum efeito extraordinário.

Verificámos que países democráticos, como Portugal, seguiram a mesma estratégia que as ditaduras, no discurso ideológico e na propaganda, pagando aos órgãos de comunicação social, contratando figuras mediáticas para fazerem a “lavagem ao cérebro” diariamente nas televisões, apresentando opiniões e cenários unilaterais e sem contraditório como evidencias científicas indiscutíveis, num serviço lamentável prestado à ciência, à verdade e à democracia.

Verificámos que a narrativa das organizações internacionais pode estar errada e que o facto de seguir os manuais internacionais de procedimentos cegamente não é mais que uma desculpa para não se tomar decisões em função da realidade concreta. Isto significa que, não fora a manobra ideológica de controlo da opinião pública, o descrédito da classe política teria sido generalizado nas democracias ocidentais, o que provocaria revoltas sociais violentas. Admito, contudo, que, no desconfinamento, regiões como Paris ou Barcelona, onde, como evidencia Emmanuel Todd, sempre existiu maior flexibilidade no que respeita à propriedade, possa ainda haver complicações.

Verificámos que os países democráticos que fecharam as economias, seguindo a matriz de confinamento da OMS, como França, Espanha, Itália ou Portugal, não tiveram melhores resultados que países democráticos como o Japão, a Suécia ou a Austrália que não confinaram a economia.

Verificámos, finalmente, que os países com maior igualdade social foram os países onde o vírus teve menor efeito e os resultados foram mais efetivos, independentemente do grau de confinamento. Tivemos o Japão, a Suécia, Singapura e a Coreia do Sul com excelentes resultados, independentemente da pirâmide etária, do rendimento per capita, da estratégia adotada, do sistema político ou das Apps tecnológicas.

Destas constatações nasce uma necessidade crítica para o discurso político: o grande objetivo das políticas sociais tem que ser a redução das desigualdades e a coesão social se quisermos responder às próximas crises. E isto implica todo um programa económico – que vai muito para além da discussão do ato administrativo de nacionalizar ou privatizar, da legiferação distópica e sem prazo do metro quadrado de praia, das filas do cinema, das mesas dos restaurantes, das entradas nas lojas ou da lotação dos aviões – tem que considerar a premissa do combate às desigualdades como prioritário.

O PSD já veio garantir a aprovação do Orçamento Suplementar socialista e anunciou mesmo e sem condições o apoio ao Orçamento de Estado do próximo ano, em nome da governabilidade. Infelizmente, mais uma vez, a oposição não está à altura das circunstâncias.

Vale-nos a narrativa europeia que, para lá da agenda ecológica e digital, preconiza uma transição justa que inclui a coesão social e o combate à pobreza como marcas desta nova Europa pós-Covid.

Nos últimos 45 anos, passámos da 22ª maior economia do mundo para a 45ª. Seremos, este ano, ultrapassados pela Etiópia.

Durante a 3º República estivemos capturados pela corrupção, que nos diminuiu o potencial de crescimento económico, e apenas convergimos com o resto da Europa no período imediatamente antes e imediatamente depois da Integração Europeia.

Pode ser que os fundos que agora se alinham, propostos pela Comissão Europeia, criem um segundo momento de convergência.

Queria ser otimista e contar que a economia atingisse todo o seu potencial de crescimento com estes investimentos.

Mas os sinais de que tudo vai continuar na mesma estão aí: no circo mediático de uma justiça que vai aumentar, já este verão, a visibilidade dos grandes processos judiciais – de Sócrates a Salgado, passando pelo futebol – e dos mais que aparecerão no pós-Covid 19, como antes aconteceu com o pós-Pedrogão Grande. Tudo para entreter um povo com fome e graças aos instrumentos ideológicos controlados pelo PS.

E sei fazer contas também: se a propensão marginal para a corrupção se mantiver em cerca de 5% do total do investimento público (como era no tempo do governo Sócrates), então o montante da corrupção em jogo, apenas com o choque keynesiano da Comissão Europeia para a recuperação pós-Covid 19, em Portugal, andará pelos 1.315 milhões de euros. Provavelmente, para dividir em “acordos de regime” ou para encobrir pelos interesses de um eventual e prudente “Bloco Central” parlamentar.

Dá, seguramente, para muitos ficarem ricos…

 

Professor universitário