Turismo. Quebras históricas no setor ao atingir quase os 100%

Em abril, a atividade turística foi “praticamente nula”. Os dados agora confirmados pelo INE vão ao encontro do cenário já avançado pela hotelaria que apontava para quebras de receitas entre 1,28 a 1,44 mil milhões em 4 meses. Valor médio por quarto fixou-se nos 4,5 euros.

Os dados já eram previsíveis. O turismo esteve praticamente parado no nosso país, mas foram agora oficializados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) ao afirmar que a atividade turística esteve “praticamente nula” em abril, com os hóspedes em alojamento turístico a diminuírem 97,4% e as dormidas 97% face a igual período do ano passado devido à pandemia. Trata-se de quebras “históricas” já que, nesse mês, os estabelecimentos de alojamento turístico receberam apenas cerca de 60 mil hóspedes, responsáveis por 175 mil dormidas, números ainda mais baixos do que aqueles que tinham sido estimados.

Na estimativa rápida publicada em 29 de maio, o INE tinha estimado um recuo de 97,1% nos hóspedes em alojamento turístico (hotelaria, alojamento local com 10 ou mais camas e turismo no espaço rural/de habitação) e de 96,7% das dormidas em abril face ao mês homólogo do ano passado. “A informação deste destaque, respeitante a abril, reflete efeitos da pandemia covid-19, quer no comportamento da atividade turística, quer na quantidade de informação primária disponível para a compilação dos resultados apresentados”, refere.

“O perfil dos poucos turistas que pernoitaram nos estabelecimentos de alojamento turístico neste mês foi diferente do habitual, tendo sido reportadas ao INE diversas situações, como por exemplo de hóspedes que ficaram retidos em Portugal sem possibilidade de regressarem ao seu país de residência, ou de pessoas que, por motivos profissionais, tiveram de se deslocar no país e pernoitar fora do seu local de residência”, sinaliza.

Além disso, em abril, no contexto do estado de emergência, cerca de 83,1% dos estabelecimentos de alojamento turístico estiveram encerrados ou não registaram movimento de hóspedes, refere. Face a esse cenário, os proveitos totais caíram 98,3% (-59,9% em março), situando-se em 5,7 milhões de euros, enquanto os proveitos de aposento fixaram-se em 5 milhões de euros, diminuindo 98% (-59,7% no mês anterior).

No conjunto dos estabelecimentos de alojamento turístico, o rendimento médio por quarto disponível (RevPAR) situou-se em 4,5 euros em abril, o que correspondeu a um decréscimo de 90,1% (-57% em março).

Uns dados que vão ao encontro do que já tinha sido indicado pela Associação da Hotelaria de Portugal (AHP) ao garantir que as perdas das receitas turísticas em Portugal deverão atingir entre os 1,28 e os 1,44 mil milhões de euros entre 1 de março e 30 de junho. 

Maior exposição à pandemia

Mas se os dados não são animadores, as perspetivas também não o são. Portugal está entre os países da zona euro mais expostos à redução das exportações no setor do turismo devido à covid-19, juntamente com Chipre, Malta e Grécia. A garantia foi dada pelo Banco Central Europeu (BCE).

O artigo, assinado pelo economista Tobias Schuler, assinala que Espanha, Áustria, Luxemburgo e Eslovénia “também deverão sofrer um impacto significativo em termos de exportações líquidas nas viagens”, mas “em contraste, Alemanha e Bélgica deverão beneficiar ligeiramente em termos de exportações líquidas, dado que são grandes importadores de serviços de viagens”.

O turismo internacional é contabilizado como exportação quando, por exemplo, um visitante estrangeiro gasta dinheiro num dado país, sendo a lógica invertida para a contabilização das importações, ao passo que as despesas com viagens são registadas como serviços de transporte.

O documento nota que “os maiores exportadores em termos de receitas são a Espanha, França, Itália e a Alemanha, com mais de metade das suas exportações de viagens para países de fora da zona euro”, sendo “a Áustria, a Holanda, Grécia e Portugal também grandes destinos de viagens na zona euro, com a Áustria e a Holanda a registarem maiores percentagens em exportações dentro da zona euro.

“Em termos relativos, as exportações do turismos ão também significativas para Chipre, Malta, Grécia e Portugal”, segundo o artigo do BCE, que dá conta que “a maioria dos países da zona euro gastam entre 2% e 4% do PIB [Produto Interno Bruto] no estrangeiro, o que é registado como importação de serviços de viagens”.

Nos países importadores, “a Alemanha é, de longe, o maior importador de serviços de viagens em termos absolutos”, e a “Bélgica, Luxemburgo e Chipre são importadores relativamente grandes de serviços de viagens em relação ao seu PIB, dada a sua interconexão com outras economias vizinhas”.

O artigo do BCE relembra que o comércio de viagens contribuiu em 42 mil milhões de euros para um excedente de 68 mil milhões na balança comercial de serviços da zona euro em 2019, com as exportações para fora do bloco a representarem 988 mil milhões de euros, dos quis 124 mil milhões através de serviços de viagens, representando 17% do total.

Assim, “a zona euro está exposta ao comércio em setores dos serviços altamente afetados” pela pandemia de covid-19, dada a contribuição para o excedente no setor das viagens de países como o Reino Unido, Suíça ou Estados Unidos. “O transporte aéreo, que conta para, de longe, a maior fatia do valor de exportações e importações no transporte de passageiros, está particularmente afetado” pela pandemia, numa paralisação “sem precedentes” do setor.

“As receitas de voos caíram aproximadamente 15% depois dos ataques terroristas de setembro de 2001 e necessitaram de dois a três anos para recuperar completamente nos Estados Unidos e na Europa”, lembra o BCE, que lembra também o surto de SARS em 2002/03, em que as receitas caíram “aproximadamente dois terços e não recuperaram até um ano depois”.