Avanços científicos sem paralelo

Com ajuda da pesquisa prévia, saltando alguns passos, poderemos ter uma vacina mais cedo do que sonhámos.

Sabemos que as vacinas são sujeitas a longos e rigorosos processos de aprovação, comparativamente a outros medicamentos: não é de espantar, porque serão tomadas por milhões e milhões de pessoas saudáveis. No caso da vacina contra o SARS-CoV-2, o vírus que causa a covid-19, o processo teve uma velocidade sem paralelo, quando costuma demorar mais de uma década. Em novembro não conhecíamos a doença, em julho temos três conglomerados farmacêuticos, um britânico, dois chineses, com vacinas na fase 3, a última fase de ensaios clínicos – um quarto conglomerado, liderado pela norte-americana Pfizer, deverá juntar-se até ao final do mês.

Afinal, como foi possível um progresso tão rápido? Por um lado, «permitiram aos cientistas saltar por cima de alguns testes em animais. Ou usar dados de testes em animais muito mais limitados do que tipicamente aceite, e passar imediatamente para testes em humanos», explica Michael Gusmano, investigador de políticas públicas no Centro Hastings e professor na Faculdade de Saúde Pública de Rutgers, ao SOL. «Outro fator é que, dado que isto é um coronavírus, como SARS e o MERS, já havia alguma pesquisa feita», refere. «Não é como se estivessem a começar numa folha em branco, com uma categoria de vírus que não compreendiam, apesar de este ser, obviamente, um coronavírus novo».

Ainda assim, Gusmano mostra alguns receios. «Mesmo entre aqueles que acreditam que as vacinas são uma ferramenta de saúde pública incrivelmente importante, há receios quanto a ir demasiado depressa. Em ciência não se pode saltar passos», avisa.

Por mais amplos que sejam os testes clínicos necessários, com dezenas de milhares de voluntários na fase 3, duas coisas fundamentais continuam por saber: quanto tempo dura a imunidade e qual a eficácia de uma potencial vacina, ambas essenciais para a tão desejada imunidade de grupo.

«Tivemos muito pouco tempo de trabalho experimental, no que diz respeito tanto às vacinas como à infeção natural», nota Pedro Simas, investigador do Instituto de Medicina Molecular, ao SOL. «O que sabemos dos outros coronavírus, que já os conhecemos há mais de 80 anos, é que o espectro de imunidade varia», diz o virulogista. Salientando que, no toca a infeção natural, a resposta imunitária tem sido relacionada com a gravidade da inflamção causada. «Indo ao SARS-Cov, o primeiro SARS que apareceu, há registos de imunidades pouco duradoras, com dois ou três anos, ou de imunidades que duraram cerca de 10 anos», refere Simas.