Messi: Entre tantas saídas, uma é ficar

Enquanto mantém o braço de ferro com o clube e avisou que não se irá treinar, forçando a rescisão, o argentino defronta-se com a vontade da família em permanecer em Barcelona

Messi: Entre tantas saídas, uma é ficar

“Esta muy caliente”, dizem-nos de Barcelona sobre todo o caso criado em redor de Lionel Messi que avisou há dois dias o director-desportivo do Barcelona, Ramons Plantes, de que não se irá apresentar para retomar os treinos com os seus companheiros de equipa. Sabe-se que de Messi ninguém espera uma palavra que seja. Habituámo-nos a que o génio seja mudo. Mas, entretanto, a sua equipa de advogados entrou ao serviço na tentativa de validar a cláusula que lhe permite sair sem custos do clube a cada final de época se for essa a sua vontade, e pelos vistos é. A batalha decorre agora em redor dos prazos. Messi entende que só tinha de anunciar agora a sua opção por a época ter durado até ao final da Liga dos Campeões; a direcção do Barcelona não aceita essa versão e responde, por seu lado, que a cláusula deveria ter sido activada pelo menos até ao dia 10 de Junho.

O caso rebentou e espalhou-se pela imprensa de todo o mundo que, de um dia para o outro, tratou de começar a descobrir clubes que pudessem albergar Messi e as suas exigências financeiras, ou seja, um ordenado na ordem dos 83 milhões de euros por ano e, no caso, de este conseguir libertar-se do Barça, um chorudo prémio de assinatura que não deixará de exigir naturalmente. Manchester City e Paris saint-Germain surgiram desde logo como destinos mais prováveis, não abundassem ambos em dinheiros vindos dos Emirados e do Qatar. Confirma-nos de Barcelona que Messi e Guardiola já conversaram, mas que os ingleses não entrarão na fase negocial antes de saberem ao certo o que irá acontecer. Por outro lado, o dinheiro com que acenam de Paris ao argentino será bem mais do que o City está disposto a desenbolsar.

 

E ficar?

A solução que ninguém parece prever é a da continuação de Messi em Barcelona e que talvez seja, neste momento, pelo que nos disseram, a mais forte de todas. Em primeiro lugar porque o presidente José_Bartomeu, com o qual Lionel Messi entrou em conflito, estará disposto a demitir-se se o jogador vier publicamente dizer algo como – se o presidente sair eu fico.

Por outro lado há a questão familiar com tudo o que ela acarreta para um homem que sempre viveu dentro de uma bolha de relações próximas e não se vê fora dela de um momento para o outro, algo que também explica muitos rumores sobre as conversas que Messi tem tido com jogadores com os quais tem relações de amizade e procura aliciar para o novo projecto que teria em mente.

Lionel Andrés Messi Cuccitini nasceu em Rosário, na Argentina, mas aos 11 anos já estava em La Masia, o centro de formação do Barça. Trouxe consigo os pais e cedo se sentiu em casa, até porque tem um grande grupo de familiares em Lleida, uma cidade catalã a poucos quilómetros a norte de Barcelona. A situação agora criada tem sido motivo de discussão entre os parentes mais próximos de Lionel. Casado com Antonela Roccuzzo, também ela natural de Rosário, com três filhos de ambos, Thiago, Mateo e Ciro, a mudança vai exigir alterações bruscas nas rotinas da família. A pressão que, por exemplo, o pai, Jorge Horacio Messi, tem feito sobre o filho para que continue e termine a carreira em Barcelona vem sendo forte e inoculou dúvidas sérias na cabeça do jogador nas horas mais recentes.

Há um facto indesmentível: o Barça parece disposto a dar a Messi tudo o que ele quer para que fique em Camp Nou. Pelos vistos, até o próprio presidente Bartomeu se predispõe ao sacrifício para que a estrela continue a brilhar no firmamento da Catalunha. A esse facto junta-se o da força feita pelos seus familiares, que vivem em Barcelona há mais de vinte anos, para que não abandone a casa da maior parte da sua vida. Terá sido a derrota frente ao_Bayern (2-8) tão violenta que possa pôr em causa uma declaração de amor que nunca foi quebrada até agora? Ou o problema é conjuntural e muito mais profundo quanto isso?

Lionel Messi sente que o Barcelona tem vindo a perder qualidade individual e colectiva nos últimos anos e não vê que esta direcção esteja preparada para dar a volta à situação, fornecendo-lhe apoios absolutamente necessários dentro de campo e dentro do balneário. Duvida também de que Koeman, o próximo técnico, seja o homem certo para o lugar certo. É capitão, mas nunca foi um líder. E nos tempos mais felizes da sua vida como jogador, olhava em volta e via Xavi e Iniesta, os seus fiéis escudeiros naquela que foi a melhor equipa do mundo. Entretanto, o tiki-taka deixou de surpreender adversários, como Pep Guardiola está a aprender dolorosamente no Manchester City, os treinadores que têm pegado no Barça não conseguiram encontrar fórmulas para uma evolução alicerçada em vitórias, sobretudo internacionais, Messi teve de assistir, na poltrona, à festa de três Ligas dos Campeões conquistadas pelos grandes rivais do Real Madrid. Doloroso? Sem dúvida! E dessa forma se explica o estado de revolta em que se encontra, abrindo um conflito duro com o clube do seu coração.

Os próximos tempos esclarecerão qual o caminho que Lionel Messi vai tomar, ele que cumpriu 33 anos no último dia 24 de Junho. A saída de Barcelona revelar-nos-á uma personalidade que há muito nos tem sido escondida. Provará que o rapaz calado, ensimesmado, continuamente rodeado por uma bolha protectora, afinal é capaz de correr riscos, tal como corre quando pega na bola e enfrenta um mundo de adversários. No caso de ficar, estaremos perante o Messi que sempre conhecemos, mas desta vez, muito provavelmente a última, protagonizando um braço de ferro duríssimo que não apenas servirá para sair dele mais dono do clube como mais interventivo no que refere àqueles que pretende ter como companheiros. Para já, esse braço de ferro ainda se resume à interpretação de um cláusula. Mas será interessante perceber se o Barcelona que se gaba de ser mais do que um clube se pode igualmente gabar de ser mais do que Lionel Messi.