Quando a matéria para as boas notícias por que ansiamos?

A procura pelas boas notícias é crescente. Todos anseiam por elas. Mas quando chegará aos jornalistas a matéria para as poderem dar?

1.Negro ou branco, gordo ou magro, mulher ou homem, homossexual ou heterossexual, alto ou baixo, todos os seres humanos são pessoas. E a todos o direito moral confere na ordem jurídica a mesma dignidade, os mesmos direitos e deveres.

A primeira das liberdades é a liberdade de consciência. O fundamento das liberdades e o seu último reduto é a consciência moral. Num Estado democrático, o Governo tem de proteger a liberdade de consciência e consagrar a consciência moral. Se condicionar (ou deixar condicionar) o seu exercício deixa de ser um governo de um Estado democrático.

2. Quando um governo da democracia abre a porta a uma crise política absolutamente indesejável, colocando a sua continuidade nas mãos de partidos que se reivindicam de ideologias que feriram, violaram, os axiomas mais inquestionáveis da dignidade e dos direitos humanos, um homem livre não pode deixar de sentir esse facto como uma aberração.

3.«A dor é mais feroz quando nos acerta no peito. Desde que o novo coronavírus entrou nas nossas vidas, o tempo parece em suspenso. Vivemos um dia de cada vez. São dias sem promessa de dia seguinte. E as coisas tendem a piorar.» (Jorge Aráujo, no Expresso Curto). Eu não diria melhor o que sinto.

Falta dizer que estamos cercados pelas notícias do mau e do mal. Autocercados pelo sentimento da impossibilidade de nos alhearmos da indignação e do temor… com fundamento.

4. Pensando que o microfone estava desligado, António Costa disse à Rádio Observador que «o jornalismo vive sempre da desgraça alheia». Se tivesse introduzido um ‘muito’ em vez do ‘sempre’, teria razão. Seria mesmo uma observação banal. E teria prestado um serviço ao país… se o próprio Governo e os políticos o ouvissem. Porque a pergunta que as elites políticas devem colocar a si próprias é se há realmente matéria para as boas notícias.

Nas sociedades liberais, habituadas nos últimos 50 anos ao progresso e à criação de riqueza, as boas notícias tinham deixado de ser notícia. Mas a realidade mudou – e hoje o problema é não haver matéria para boas notícias (que, de novo, passariam a ser notícia…).

O esquecimento dos políticos da expectativa criada pelo progresso em vastas camadas de população, com o deslizamento dos partidos e dos Governos para causas absurdas de grupos políticos residuais mas com capacidade de se infiltrarem nas universidades, nos media e nos centros do poder, confunde os eleitores e corrói a confiança nas instituições democráticas. E esta expectativa frustrada faz estranhamente com que o sucesso das sociedades liberais seja hoje razão da sua fragilidade.

5. A pergunta que se impõe a António Costa é, portanto, a seguinte: haverá matéria para as boas notícias? Se houver, e quando houver, Costa verá que as boas notícias passarão de novo a ser notícia, voltarão a vender jornais.

A procura pelas boas notícias é crescente. Todos anseiam por elas. Mas quando chegará aos jornalistas a matéria para as poderem dar? Quando serão colocados perante o dever ético, moral, de inteligência – e certamente a satisfação –, de as difundirem?

E a quem cumpre dar o primeiro passo nesse sentido?