Anglicismos

A verdade é que tenho vergonha de viver em ‘Oeiras Valley’, em vez de simplesmente no ‘concelho de Oeiras’.

Devo reconhecer que, durante os cerca de 14 anos que vivi em Espanha, me irritava a propensão espanhola para traduzir todas as palavras, e orgulharem-se de não usarem galicismos nem anglicismos. As palavras difíceis ou impossíveis de traduzir, eram simplesmente a-espanholadas. Por exemplo, em vez de ‘snob’ diziam e escreviam ‘esnobe’ ou ‘esnobar’ (verbo dali tirado).

Por cá há um costume contrário, que pretende sobretudo demonstrar uma ‘snobeira’ cosmopolita. Por exemplo, agora que vim viver para Miraflores, reparo nos cartazes da Câmara que não vivo no ‘concelho de Oeiras’, mas em ‘Oeiras Valley’. Isto faz lembrar os artistas plásticos e as galarias que vivem deles e escreverem quase tudo em inglês. Num inglês mínimo e facilmente compreensível, mas mesmo assim em inglês. Claro que nunca atingirão a universalidade genial, mas uma mediocridade cosmopolita. Talvez seja no fundo o máximo a que pode aspirar a maioria deles.

Na verdade, os galicismos ainda são da minha juventude, e no fundo acho-lhes mais graça.

Mas não estou a ver o Nobel Saramago a escrever em inglês nos seus livros. Preferia um português, mesmo ‘castigado’ (para usar a expressão que tanto agradava ao Dr. Mário Soares). E Fernando Pessoa só deixou escritos em inglês, porque essa foi a sua primeira língua, quando viveu pequeno na África do Sul. Mas depois de adoptar o português ficou-se por ele, que designava ‘asua língua’.

A verdade é que tenho vergonha de viver em ‘Oeiras Valley’, em vez de simplesmente no ‘concelho de Oeiras’. Ainda por cima, olhando para o presidente de Câmara, meu vizinho, nada parece ter de cosmopolita. Porquê então?

Enfim, tenho de resolver este problema – provavelmente mudando-me outra vez para um concelho.