Os ‘democratas’ que transformaram a liberdade de expressão em crime

Sejamos lúcidos, não vivemos em democracia, mas num totalitarismo insidioso em que os escravos amam a sua liberdade, empanturrados de objetos e noções miseráveis de desejo e felicidade

Por João Maurício Brás

Foi promulgada a ‘Carta dos Direitos Humanos na Era Digital’, podem chamar-lhe o que quiserem, mas é uma subtil peça ideológica que institui doravante um pensamento único, oficializa e legitima os censores e impõe um único modo de pensar, particularmente no artigo quinto. 

Impor o pensamento único de modo ardiloso é um dos aspectos determinantes das sociedades hiperliberais progressistas. Com a caução do liberalismo cultural o pensamento tem donos que detêm a verdade, seja sobre género, raças, sexos, clima, democracia, liberdade, etc.. Ser crítico e pensar é crime. 

Vivemos um novo totalitarismo com um poder inédito. A capacidade tecnológica e a grande obra de uniformização disfarçada de democracia são incontestadas. O controlo e a vigilância são ímpares e os políticos legislam em uníssono sobre o pensamento único. O fim da já limitada liberdade é agora oficial. 

As democracias reais ensinam a pensar livremente, a ser critico, a preferir a informação, o bom conhecimento e a contestar as opiniões superficiais, a desinformação e as falsidades. A liberdade de opinião tem de ser ilimitada, já os factos são factos. Não tenhamos medo da liberdade. Opinião não é conhecimento nem facto e palavras não são atos. 

A liberdade de expressão foi o pilar fundamental das sociedades democráticas e uma das peças mais valiosas do nosso melhor tesouro que foi a cultura Ocidental. Mas é passado, já ninguém a adopta como o pilar central das sociedades decentes. Estamos a destruir metodicamente conquistas que demoraram séculos a ser edificadas e são o nosso melhor.
Aniquilamos a liberdade de expressão, mas claro, embrulhada no meio de boas intenções. Pois quem pode ser contra o bem? O direito ao esquecimento, o direito à proteção contra a geolocalização abusiva ou ainda o direito de reunião, manifestação, associação e participação em ambiente digital, a criação de uma tarifa social de acesso à internet para desfavorecidos, a existência de «pontos de acesso gratuito» em espaços públicos, a garantia da conectividade de qualidade em banda larga e a preço acessível em todo o território nacional, etc.. A cenoura é a bondade inclusiva e em contrapartida o fim da liberdade de expressão é democrático e oficial. 

Dizem-nos que nos querem proteger contra a desinformação. Mas que KGB ou PIDE estabelecerá o que é a informação legítima? Os sábios de nomeação estatal e partidária? Comissões de jornalistas de agências de, elas sim, desinformação, que policiam o pensamento, colocando o selo de conforme o pensamento lícito, ou desconforme e criminoso?

Há uma entidade reguladora. Será um Santo Ofício, uma mesa censória ou uma polícia política com autonomia do poder judicial?

Digam-nos então como pensar, o que devemos dizer e tudo o que temos que assentir. Já sabemos que ser homem é tóxico, que somos racistas e colonialistas. 

Sejamos lúcidos, não vivemos em democracia, mas num totalitarismo insidioso em que os escravos amam a sua liberdade, empanturrados de objetos e noções miseráveis de desejo e felicidade. 

O mundo Ocidental do século XXI está transformado num supermercado e num manicómio. Não há alternativa lucida, a contestação que surge mais audível está repleta de teorias conspiracionistas e negacionismos bizarros. Tempos terríveis para os lúcidos e os livres.

Nem um partido político votou contra a sinistra carta.