Portugal e pseudo-elites

Olham para o dinheiro apenas como um meio para viver. Entendem que já cá estão há centenas e centenas de anos e que, por isso, as odds apontam para que cheguem minimamente bem a velhos.

Em Portugal há três pseudo-elites: a social, a cultural e a endinheirada. É raro alguém pertencer às três ao mesmo tempo. A elite social, por exemplo, tende para não ser especialmente culta ou endinheirada. Quem lhe pertence – aqui será dúbio definir, mas fiquemo-nos pelo que as tias chamam de «bem» – não é ‘possidónio’ ao ponto de a riqueza monetária ser a grande ambição das suas vidas.

Olham para o dinheiro apenas como um meio para viver. Entendem que já cá estão há centenas e centenas de anos e que, por isso, as odds apontam para que cheguem minimamente bem a velhos. Também não são especialmente cultos. Nascem com milhares de livros em casa, o que faz com que vejam a cultura como adquirida e não lhe atribuam importância.

Os livros estão, simplesmente, na parede – «e ficam lindamente!». São tão mundanas como qualquer animal: têm sobretudo pensamentos sobre comer, beber, dormir e sexo – o que, diga-se, não tem qualquer mal. Aliás, só tem é bem: a meu ver, dos três grupos, os pertencentes a este são os que melhor se sabem divertir e que estão sempre na farra. ‘Depressões ficam para a RTP2’. Esta é a pseudo-elite mais difícil entrar, a que tem gente mais bem vestida e, curiosamente, a mais tóxica. Consta que, no NOS Alive, vão sempre para a esquerda do palco (cringe)….

Segue-se a pseudo-elite cultural. Esta poder-se-á cruzar com a ‘social’; contudo, dificilmente com a ‘endinheirada’ (como Portugal é provinciano, é raro haver gente muito rica que seja intelectualmente requintada). Cruza-se com a ‘social’ quando pessoas deste ‘social’ calharam de receber uma educação rica em cultura ou, por si, sentiram que o seu meio era demasiado limitado. Acontece muito (todavia, ouvir Xavier Rudd e ir fazer voluntariado para São Tomé não conta para se ‘sair do meio’).

As pessoas pertencentes à pseudo-elite cultural são geralmente ativistas, consideram tudo «pós-moderno» e adoram dizer coisas como «o Hegel nunca disse isso, o que o Hegel diz é que…». Bichos do Lux ou do Maus, estes lugares tornam-se autênticos banhos romanos em que pessoas ‘como elas’ masturbam egos entre si, musculam supostos virtuosismos morais e explicam porque é que o «Eça também era racista». Ao som de Luís Severo e a beber MUSA, afirmam-se «pelo pensamento livre e plural» para passados dez minutos defenderam a ilegalização do «facho do Chega». 

Por fim, a pior: os ‘endinheirados’. A pseudo-elite endinheirada portuguesa é aquela que encontra menos interseccionalidade com as outras. Havendo-a, será mais com a ‘social’ do que com a ‘cultural’. Estas pessoas normalmente fazem fortunas pelo trabalho, já valendo por isso. Contudo, muitos são os casos em que julgam que, por terem dinheiro, tudo podem – algo que, note-se, não costuma acontecer nos outros dois grupos. São os broncos que tratam o empregado do restaurante por ‘tu’ e que, quando vão ao shopping, deixam o tabuleiro na mesa afirmando «estar a manter empregos».

Como têm de mostrar que têm dinheiro fazem questão de ter os melhores carros ou as melhores marcas: o que interessa é dar nas vistas e ‘pintar nas redes’. Todavia, como só têm dinheiro e não têm gosto, acabam por comprar t-shirts parolas da Kenzo – pagando 100€ por cada letra – ou ir uma vez por ano ao Outlet de Vila do Conde encher-se de camisas da Ralph Lauren para mostrar às outras filhas de empreiteiros que tentam ‘sacar’ no Forte de São João.

Normalmente têm bom coração – mais puros do que os do primeiro grupo –, mas, como são menos polidos, acabam por tratar pior quem os rodeia. Bebem muito vinho, ficam rosados e, depois, vão todos ‘conténtes (sic)’ para os seus Mercedes brancos – que as mulheres só usam para ir aos sábados de manhã ‘fazer as unhas’. 

São isto – e muito mais – as pseudo-elites portuguesas: pelos menos dão para rir.