A propalada Carta de Direitos Humanos na Era Digital; a censura imposta pelo Google, Twitter, etc. a certos textos; o banimento de certas pessoas das respetivas redes; os processos instituídos a alguns autores pela Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (de que já fui vítima) – tudo isto faz parte da mesma lógica: a tentativa de imposição de uma censura em nome do politicamente correto.
Claro que é impossível fazê-lo de uma forma generalizada.
Há todos os dias nas redes sociais pelo mundo fora biliões de comentários, notícias, informações, etc., pelo que tentar controlar tudo seria materialmente impraticável.
Mesmo um jornal não consegue controlar eficazmente no seu site todos os comentários aos artigos e notícias.
Há, pois, muita liberdade de opinião.
Mas atenção: se esta liberdade existe para o comum dos mortais – em relação aos quais só pode ainda haver restrições de natureza geral, como a censura de certas palavras ‘proibidas’ –, não existe para algumas pessoas públicas.
Com a internet e as redes sociais, toda a gente pode escrever o que quiser e disponibilizá-lo em segundos a milhares ou milhões de pessoas.
Mas com certas figuras públicas é diferente.
Essas estão sob vigilância apertada – e são objeto de censura permanente, tanto maior quanto maior for a sua importância.
Vejam-se os casos de Trump e de Ventura.
Começaram por ser censurados pontualmente e depois as suas contas foram simplesmente cortadas.
Foram banidos.
E Trump foi banido porquê?
Supostamente por fazer acusações de fraude eleitoral nas últimas eleições americanas, sem apresentar provas.
Mas os democráticos, durante quatro anos, não puseram em causa os resultados das eleições em que Trump foi eleito, falando de uma «ingerência russa» que nunca foi provada?
Num caso pode falar-se em eleições fraudulentas e noutro não?
Estamos em presença de uma censura à la carte.
Certas pessoas consideradas ‘politicamente perigosas’ ficam sob suspeita e são objeto de censura.
E certos textos que a esquerda rotule de ‘fake news’ ou acuse de ‘racismo’, ‘xenofobia’, ‘homofobia’, ataque à ‘igualdade de género’, etc., são retirados.
Ora, isto é o oposto de uma informação livre.
Isto é tratar os cidadãos como criancinhas desmioladas, que não podem ler certas coisas porque lhes fazem mal à mente.
Uma informação livre parte exatamente do princípio contrário: são os cidadãos, e não qualquer organismo público ou privado, que devem selecionar aquilo que pretendem ler, ver ou ouvir.
São os cidadãos que devem escolher os jornais que querem ler, os políticos que querem seguir, as notícias em que acreditam.
Durante algum tempo – e ainda hoje, em certos casos – muitas pessoas não acreditavam no holocausto.
Diziam que era uma mentira.
E foi a informação livre, as notícias livremente elaboradas, a favor ou contra, que permitiram à maioria formar uma opinião mais próxima da realidade.
E o mesmo aconteceu com o estalinismo.
Durante muito tempo – e ainda hoje, nalguns casos – muitas pessoas não acreditavam nos crimes de Estaline.
Diziam que era uma mentira forjada para desacreditar o socialismo.
E foi a informação livre, as notícias livremente elaboradas, a favor ou contra, que permitiram à maioria formar uma opinião mais próxima da realidade.
É evidente que nem todos acreditam da mesma maneira nas mesmas coisas.
Em Portugal, por exemplo, uma pessoa de direita tende a dar mais crédito às notícias contra o Governo do que àquelas que o favorecem; e o contrário também é verdade: uma pessoa do PS tende a desvalorizar as notícias que comprometem o Governo ou os ministros.
A informação não tem o mesmo valor para toda a gente nem é percecionada do mesmo modo por toda a gente.
Mas é mesmo por isso que existe liberdade de informação.
E qualquer instrumento que procure restringi-la ou mesmo ‘orientá-la’ é terrivelmente perigoso.
As chamadas fake news são fake para uns e não para outros, porque por vezes não há uma só ‘verdade’.
Veja-se a questão da covid.
O vice-almirante Melo Gouveia, que tem feito um ótimo trabalho, chamava recentemente «obscurantistas» às pessoas que não se queriam vacinar.
Ou seja: para ele, existia uma ‘certeza científica’ sobre as vacinas, e quem não acreditava nela era obscurantista, negacionista, anticiência.
Pois veja-se o que se tem passado com a AstraZeneca: primeiro era só para menores de 60 anos, e agora é só para maiores de 60 anos; o prazo entre as doses era de três meses, e agora é de dois meses… E há países que a aceitam e outros que a rejeitam.
Estamos, pois, muito longe de uma ‘verdade científica’.
E só com opiniões livres as ‘verdades absolutas’ podem ser questionadas.
Já foi gente queimada que, tendo toda a razão no que dizia, tinha o azar de pôr em causa os dogmas da época; já foi gente presa, torturada e morta que, tendo toda a razão no que dizia, tinha o azar de questionar o que a maioria julgava ser a verdade; sejamos, pois, humildes e deixemos que sejam os cidadãos a escolher o que querem e não querem ler, aquilo em que querem ou não acreditar.
Essa história do fact cheking é uma treta – porque frequentemente analisa as notícias à luz de uma determinada lógica e mesmo à luz de uma ideologia.
E participa do mesmo vício do politicamente correto.
No horizonte perfila-se uma censura. Há muitos sinais.
Até há pouco, uma das vantagens do capitalismo era não ter ideologia.
A lógica do dinheiro sobrepunha-se a tudo.
Se um produto vendesse era comercializado, independentemente de outras considerações.
Se um livro vendesse era reeditado, mesmo que fosse ‘mentiroso’ ou ‘perigoso’.
O capitalismo, pela sua própria natureza, defendia a liberdade – ao contrário de outros sistemas, de direita ou esquerda, que a restringiam em nome de princípios ideológicos.
O que é assustador no mundo de hoje é que grandes organizações capitalistas começaram a adotar, também elas, critérios de natureza ideológica.
Esta é a novidade.
Capitalismo e ideologia unem-se.
Quando o Google ou o Twitter censuram Trump não o fazem à luz de razões económicas mas de motivos ideológicos.
Ele tinha milhões de seguidores e dava às redes muito dinheiro.
Este, no nosso tempo, constitui a maior ameaça à liberdade.
Impõe-se nas universidades.
Esconde-se por trás de milhares de organizações que dizem defender a ‘igualdade de género’, combater o ‘racismo’, lutar contra a ‘xenofobia’ e a ‘homofobia’, etc., mas visam todas o mesmo: impor uma só verdade e calar os seus opositores.
E muitos Estados e organizações globais já adotaram a sua cartilha.
Espanta-me que muita gente ainda não tenha entendido isto.
Mas vai entender – em muitos casos, à sua própria custa.