Miami. Trabalhos nos escombros parados por receio de colapso

Nesta corrida contra o tempo a esperança é pouca. Teme-se que até o ADN das vítimas se degrade, impossibilitando que as famílias as enterrem condignamente, como aconteceu no 11 de setembro.

Quinta-feira, uma semana depois do colapso de uma das Champlain Towers, um condomínio à beira-mar em Surfside, na Florida, os trabalhos de resgate tiveram de ser suspensos, devido ao risco de colapso do resto do edifício. Com somente 18 mortos confirmados e 145 desaparecidos, a comunidade desespera por notícias dos seus entes queridos, sabendo que a cada dia que passa fica mais difícil alguma vez identificar as vítimas, devido à decomposição dos cadáveres, quanto mais encontrar algum sobrevivente.

O problema é que há uma enorme coluna pendurada, que pode cair a qualquer momento e danificar a garagem subterrânea, tendo sido detetados movimentos de entre 15 a 30 cm na estrutura, o que “pode causar falhas adicionais no edifício”, explicou o responsável por resgates dos bombeiros de Miami-Dade, Alan Cominsky, citado pela CNBC. A equipa de salvamento – que inclui especialistas vindos do México e de Israel – sabe que a sua perigosa tarefa requer cautela, e teme a chegada da tempestade tropical Elsa, que poderá dificultar ainda mais os trabalhos, com a Florida em plena época dos ciclones.

Olhando para os destroços, sabendo que já se passou uma semana, poucos têm expectativa de encontrar alguém vivo debaixo destas gigantescas pilhas de betão e metal retorcido. O que se pede é quase um milagre, mas mesmo ali ao lado, na praia junto às Champlain Towers, continua escrito “esperança”, em letras enormes, na areia.

“Talvez haja um espaço confinado com alguém lá”, desejou o coronel Golan Vach, líder da unidade das Forças de Defesa de Israel especializada em operações de resgate e salvamento. Vach viu muitos desastres na vida, ao longo de duas décadas de carreira, mas poucos como este. “É uma das mais difíceis e complicadas situações que alguma vez vi”, admitiu, à Reuters.

Ainda antes de partir de Israel, a sua equipa já estudava a estrutura do condomínio, através de modelos 3D, tentado depois perceber, através de entrevistas a familiares, quem estava em casa e onde ficavam os quartos, dado que maioria estava a dormir à hora do desastre, para perceber onde escavar. Não são conversas nada fáceis – “às vezes choramos. É natural”, contou Vach – e, de momento, as hipóteses de encontrar gente viva são baixas. “Mas não diria que não há hipótese”, adiantou o coronel.

Contudo, mesmo identificar os cadáveres que vão encontrando tem sido uma desafio. Muitas vítimas foram esmagadas para lá do reconhecimento e boa parte estava de pijama, sem documentos consigo ou roupa facilmente identificável.

Registos dentários e impressões digitais podem ajudar. Mas muitos cadáveres ficaram com os maxilares desfeitos, outros perderam as impressões digitais, devido ao incêndio ou por estarem dias expostos à humidade da Florida, à chuva e à água despejada pelos bombeiros. Pouco depois do desastre, familiares ansiosos colocavam cotonetes na boca, para comparar o seu ADN com o das vítimas – mas até o ADN pode degradar-se com a exposição aos elementos.

É impossível não nos vir à memória o esforço traumático para identificar as vítimas do 11 de setembro – e não lembrar que mais de mil ainda não foram identificadas.