O ‘herói’ Rashford

A melhor resposta aos ataques racistas a Rashford era o silêncio; responder-lhes só lhes aumentou a importância. 

Na final do campeonato da Europa de futebol, o jogo terminou empatado e foi necessário recorrer a penaltis. A Itália falhou um mas a Inglaterra desperdiçou três, entregando o troféu ao adversário.

Logo por azar, os três jogadores que falharam os penaltis eram negros. Ou, com mais propriedade, não eram ‘brancos’, pois dois deles tinham a pele bastante clara. Ora, pegando na coincidência, racistas de todas as latitudes despejaram insultos sobre os infelizes futebolistas, associando a cor da pele aos falhanços.

Era, evidentemente, um disparate. Uma parvoíce. Uma infantilidade. Futebolistas de todas as cores falham penaltis em momentos críticos.

Perante isto, a melhor estratégia a adotar seria o desprezo. O silêncio. Há certos ataques que, por tão desprovidos de senso (e mesmo de educação), não merecem resposta. Responder-lhes é atribuir-lhes importância. 

Mas muita gente, levada mais pela emoção do que pela razão, entrou na dança e começou a responder aos ataques. E as organizações antirracistas envolveram-se e deram toda a publicidade ao assunto. Os insultos racistas a Marcus Rashford, Jadon Sancho e Bukayo Saka tornaram-se de repente o assunto mais importante do mundo. Na prática, essas organizações fizeram o que os racistas pretendiam: transformaram uma estupidez num caso sério de repercussão planetária.

Racistas e antirracistas combateram-se então ferozmente. Existe num café de Manchester, cidade onde Rashford joga, um mural em sua homenagem. Ora, a obra tornou-se subitamente objeto de polémica: os racistas vandalizaram-na (num ato semelhante à vandalização de estátuas levada a cabo pelo Black Lives Matter) e os antirracistas transformaram-na em local de culto, colocando lá objetos e mensagens de apoio ao jogador. 

Tudo isto é ridículo!

Ridículo bem expresso no facto extraordinário de um jogador tornar-se herói por falhar um penalti. Qualquer dia, os jogadores negros ou de outras geografias até falharão propositadamente penaltis para serem atacados – e gerarem a seguir ondas de apoio…

A atuação dos movimentos antirracistas no Ocidente custa-me muito a perceber. Será que não veem que este tipo de episódios, cuja importância ampliam enormemente, só contribui para exacerbar a guerra entre as raças e estimular o racismo?

Quando não queremos que uma criança faça determinado disparate, o que devemos fazer? Devemos dizer-lhe: «Olha, não deves mexer aqui»?. Se o fizermos, é certo e sabido que, na primeira oportunidade, a criança vai mesmo lá mexer. Com as sociedades, que em boa parte têm comportamentos infantis, passa-se o mesmo: chamar a atenção para algo que não deve fazer-se é meio caminho andado para muita gente o querer experimentar. 

Mas sendo isto mais ou menos evidente, por que razão – sobretudo ultimamente – se chama tanto a atenção para o tema?

A explicação só pode ser uma: algumas organizações antirracistas estão interessadas em promover o racismo para justificarem a sua existência. E para aumentarem os apoios que recebem dos Estados em muitos países da Europa.

Quanto mais se falar de racismo, quanto mais se chamar a atenção para atos racistas, mais meios serão empregues no combate ao racismo – e mais subsídios essas organizações receberão. Isto sim, percebe-se. E depois, claro, há sempre os idiotas úteis prontos a secundar estes movimentos.

Neste caso dos jogadores ingleses, existe outra vertente de que não se falou.

É facto assente que não deve misturar-se política com futebol. O futebol tem sido uma zona livre de política, e nos estádios – como tenho escrito – sentam-se lado a lado ricos e pobres, novos e velhos, comunistas e fascistas. E todos celebram em uníssono os golos das suas equipas. Ora, se começarmos a meter a política no futebol, rapidamente os estádios se transformarão em campos de batalha, com as consequências desastrosas que é fácil adivinhar. 

Toda a gente condena os políticos que usam o futebol para se promover. A promiscuidade entre política e futebol é, de uma forma geral, considerada indesejável. Mas quando se trata de causas ‘boas’ já não é assim. Para defender Rashford, já é legítimo misturar futebol e política… 

E que dizer de uma prática generalizada nos estádios de futebol ingleses, que consiste em os jogadores se ajoelharem antes dos jogos (num gesto que se diz ser contra o racismo)? Confesso que não sei donde vem este gesto. No meu imaginário, os crentes ajoelham-se perante o seu deus. Ora, ali, brancos e negros ajoelham-se perante quem?

Claro que, como era de prever, este ritual já proporcionou conflitos, com uns a assobiar e outros a aplaudir. E uma ministra que teve a ‘ousadia’ de afirmar que as pessoas tinham liberdade para assobiar, foi enxovalhada.

Deixemo-nos de exibicionismos tolos. Não misturemos futebol e política. Não aproveitemos o futebol para fazer propaganda política. 

Contribuamos para o respeito pelos seres humanos, sejam brancos, pretos ou amarelos, e não embarquemos em campanhas que só acicatam os ânimos e não ajudam ninguém.

Deixemos o Rashford sossegado. Deixemo-lo fazer o que melhor sabe, jogar futebol, e não o envolvamos em lutas para as quais muito provavelmente não tem vocação. E tenhamos consciência do ridículo que é transformar um jogador em herói por ter falhado um penalti, contribuindo para a derrota da sua equipa.