Nova Zelândia proíbe tabaco a nascidos depois de 2008

O país quer limitar o tabagismo, tendo em vista criar uma geração livre de fumo. Mas a meta de abolir a venda legal de tabaco pode resultar no aumento do contrabando.

Na Nova Zelândia, todas as pessoas que hoje tenham 14 anos ou menos nunca poderão comprar tabaco legalmente. A nova legislação anunciada pelo Governo neozelandês estabelece ainda que a idade legal para fumar irá aumentar todos os anos. O objetivo é criar uma geração completamente não fumadora, de forma a reduzir a taxa nacional de fumadores para 5% até 2025, tendo como meta principal a sua eliminação por completo até 2050.

“Queremos garantir que os jovens nunca comecem a fumar, assim vamos constituir como crime a venda ou fornecimento de produtos de tabaco para fumar para as novas camadas de jovens. Quando a lei entrar em vigor, pessoas que ao momento tenham 14 anos nunca poderão comprar tabaco legalmente”, esclareceu Ayesha Verrall, representante do Ministério da Saúde neozelandês.

A medida já tinha sido revelada em abril deste ano, contudo será apenas oficializada com a introdução da legislação em 2022, sendo que as limitações de idade só se começam a aplicar a partir de 2023.

Com a nova lei, a idade legal para fumar, que é atualmente aos 18 anos, sofrerá todos os anos um aumento de um ano, a partir de 2027, o que significa que quem nasceu depois de 2008 nunca poderá comprar tabaco de forma legal, dado que será sempre um ano mais novo do que o limite legal.

Além do aumento gradual da idade legal para comprar tabaco, o Governo neozelandês anunciou outras medidas para tornar o hábito de fumar mais caro e inacessível, tendo em vista atingir a meta de um país totalmente livre do fumo. Entre essas medidas incluem-se a redução da quantidade legal de nicotina nos produtos de tabaco para níveis muito baixos, redução dos pontos de venda de tabaco e, ainda, o aumento do financiamento para os serviços de apoio à dependência. À margem das novas leis fica o vaping, também chamado cigarro eletrónico.

Facto é que as taxas diárias de tabagismo na Nova Zelândia têm caído ao longo do tempo — entre 2008 e 2018 passaram de 18% para 11,6% — e os hábitos de consumo têm sido substituídos por estas novas modalidades a vapor entre as gerações mais jovens.

De acordo com um inquérito realizado este ano a 19 mil estudantes do ensino secundário, quase 20% fumavam diariamente ou várias vezes ao dia, e a maioria com altas doses de nicotina, cita o The Guardian.

RISCO DE UM MERCADO PARALELO Apesar de o projeto legislativo ter sido amplamente saudado por especialistas em saúde pública neozelandeses, também foi alvo de críticas. Na ótica do partido liberal de direita ACT, a redução da nicotina poderá fazer com que as pessoas com menos possibilidades financeiras comprem mais cigarros e, consequentemente, fumem mais. O partido levantou também a preocupação de que, com a meta de abolir a comercialização legal de tabaco, seja criado um mercado negro para o tabaco, problemática que a proposta também acautela.

“As evidências indicam que a quantidade de produtos de tabaco contrabandeados para a Nova Zelândia aumentou substancialmente nos últimos anos e que grupos criminosos organizados estão envolvidos no contrabando em grande escala”, lê-se no documento, que acrescenta que “a alfândega precisará de mais recursos para fazer cumprir o controlo nas fronteiras”.

Em declarações ao i, o diretor de Assuntos Institucionais da Tabaqueira, Rui Minhós, também admite que a proibição da venda legal de tabaco “poderá criar condições favoráveis ao desenvolvimento de formas ilícitas de comércio de produtos de tabaco”. Neste sentido, defende que todas as medidas legislativas a adotar no futuro “deverão ser trabalhadas de uma forma proporcional e integrada, como por exemplo aumentar as restrições regulamentares para as formas mais nocivas de consumo de nicotina, fomentando a inovação e desenvolvimento tecnológico e científico de alternativas de risco modificado que permitam consumir a nicotina de forma menos nociva”.

SOLUÇÕES MENOS NOCIVAS De acordo com Rui Minhós, esta é também a estratégia das empresas da indústria tabaqueira. “A Tabaqueira e o grupo Philip Morris International, conscientes de que a melhor alternativa para os fumadores é deixar de fumar, assumiram, em 2016, a sua ambição de substituir os cigarros convencionais por melhores alternativas que permitam àqueles que decidem continuar a fumar aceder a soluções que reduzem a nocividade”, revela.

A Tabaqueira, empresa subsidiária da Philip Morris International (PMI), que emprega em Portugal aproximadamente 1.200 pessoas e é um dos maiores exportadores nacionais, quer, a prazo, deixar de comercializar cigarros e apostar na substituição de cigarros por alternativas cientificamente substanciadas como sendo menos nocivas, e que se acredita serem uma opção melhor para fumadores adultos.

Tendo em vista esta transformação, nos últimos meses a PMI adquiriu empresas do setor farmacêutico por forma a expandir as suas competências nas áreas das ciências biológicas e da experiência clínica.

“Isto permite continuar a inovar e a ir para além do tabaco e nicotina, procurando dar resposta a outras necessidades médicas. Já é possível aos decisores políticos e às entidades públicas atuarem sobre a extensa evidência científica que existe e, dessa forma, construírem um quadro regulamentar que acelere a eliminação dos cigarros e promova alternativas menos nocivas”, defende o responsável.

No seu entender, é preciso diferenciar estas soluções dos cigarros tradicionais, com vista à proteção e promoção da saúde pública. “Foi precisamente o que fez a FDA, nos Estados Unidos, quando autorizou a comercialização do IQOS como ‘Produto de Tabaco de Risco Modificado’”, dá como exemplo, referindo-se ao dispositivo eletrónico revolucionário que aquece tabaco em vez de o queimar.

O grande objetivo da PMI é, até 2025, garantir que mais de metade da receita líquida do grupo provenha de produtos livres de fumo.

A Nova Zelândia tem liderado o mundo em matéria legislativa referente ao desenvolvimento de políticas públicas que assentam em abordagens de risco reduzido que permitam aos fumadores adultos aceder a soluções de menor nocividade. Mas aquele país não está sozinho no que se refere ao combate do tabagismo.

Em 2017, o Ministério da Saúde da Rússia também disse querer erradicar o tabagismo no país e, para tal, queria proibir qualquer pessoa nascida depois de 2014 de fumar. A medida só deverá entrar em vigor em 2033 e, supostamente, essa será a primeira geração de russos livre de fumo. Atualmente, cerca de um terço da população russa fuma.

Uns anos antes, já tinha sido restringida a publicidade ao tabaco, bem como reduzidos os pontos de venda e os espaços onde era permitido fumar.

Até 2022, a Rússia pretendia ainda igualar as vendas dos cigarros eletrónicos aos cigarros comuns; aumentar a lista de locais onde é proibido fumar e obrigar os trabalhadores fumadores a cumprir mais horas.

Em Portugal, o Governo optou por apertar a lei para restringir o tabaco nos restaurantes, bares e discotecas. Agora, os estabelecimentos que que queiram manter zonas exclusivas para fumadores têm que ter um pé-direito mínimo de três metros e essas zonas são obrigadas a ter mais de cem metros quadrados, que não podem ultrapassar 20% da área total, além de terem de ficar separadas por uma antecâmara ventilada e com portas automáticas. Segundo o último Inquérito Nacional de Saúde, em 2019, 16,8% da população portuguesa com 15 ou mais anos era fumadora, 14% dos quais fumadora diária.

Segundo a Organização Mundial da Saúde, a nível mundial, a China lidera enquanto produtor e consumidor de tabaco. Naquele país há mais de 300 milhões de fumadores, o equivalente a 25,2% da população com mais de 15 anos e a cerca de um terço do total de fumadores do mundo.