Union: a força do ferro!

Só há duas equipas da antiga Alemanha Oriental na Bundesliga. Uma delas, de Berlim Leste, sofreu muito para continuar a manter-se viva.

Union: a força do ferro!

Köpenick é um dos mais populares bairros de Berlim, entalado entre os rios Spree e Dahme, durante o final do século XIX e início do século XX tornou-se famoso por um tratante chamado Friedrich Wilhelm Voigt, um mamífero que, disfarçado de oficial prussiano e rodeado de um grupo de meliantes, tratou de desviar mais de 4000 marcos do tesouro municipal. A imprensa não perdeu tempo a arranjar-lhe um nome de guerra, Hauptmann von Köpenick, o Capitão de Köpenick, dando ao bairro uma conotação pouco simpática até que o Kaiser Guilherme II, num gesto de inusitada bondade, perdoou a Friedrich as suas trapalhadas, deixando-o à míngua da miséria que se seguiu ao final da I Grande Guerra e possibilitando-lhe a oportunidade de ir morrer de fome para o Luxemburgo.

Mais ou menos pela época em que Voigt andava entretido a esvaziar os cofres municipais, um grupo de rapazes do bairro vizinho de Oberschöneweide disputavam acesas partidas de futebol vestidos com camisolas e calções de ganga, o que lhes valeu a alcunha de Schlosserjungs, Jovens Metalúrgicos, de tal forma se assemelhavam aos operários das fábricas em redor. FC Olympia Oberschöneweide, era o nome da equipa. E o seu grito de guerra «Eisern Union!» – União de Ferro. Union que não tardou a tornar-se, igualmente, nome de um clube de futebol, dissidente do primeiro: 1. Fußballclub Union Berlin, nome que adotou em 1906. Hoje em dia ocupa um honroso sétimo lugar na Bundesliga e desloca-se esta tarde ao campo do Bayer Leverkusen.

 

Trinta e dois anos depois

Já se passaram trinta e dois aos sobre a queda do Muro de Berlim, que se espapaçou no chão como se fosse um dióspiro maduro. Recebendo fortes apoios estatais, os clubes da Alemanha de Leste, ou República Democrática Alemã, encontraram-se perante a nova realidade de serem obrigados a ganharem competitividade suficiente para acederem à Bundesliga. Vamos deixar, por hoje, de lado esse fenómeno de marketing socioeconómico que é o Red Bull Leipzig. E o que sobra? A realidade de o Union Berlim ser, para além dos Touros Vermelhos de Leipzig, o único clube da velha Alemanha de Leste a participar na Bundesliga desta época. Outros clubes, de nomeada, vegetam nas divisões secundárias, tal como o Hansa Rostock (II), Dínamo de Dresden (II) ou Magdeburgo (III).

No Stadion An der Alten Försterei (O Estádio da Velha Casa do Homem da Floresta) há tudo para se escrever uma história com o seu quê de apaixonante. O Union cumpriu a sua primeira época na Bundesliga em 2019-20. Aguentou-se bravamente, a despeito de todas as fragilidades de um clube menor.

A reorganização do futebol da Alemanha Oriental levou ao nascimento de nada menos de 10 novos clubes. Essa reorganização não contemplou a existência do Union, que acabou por desaparecer de forma a ser possível surgirem o ASK Vorwärts Berlin e o SC Dynamo Berlin, associados ao exército e à polícia secreta, respetivamente. Foi necessária uma grande união proletária, levada a cabo pelos seguidores de Karl Paul August Friedrich Liebknecht, um dos fundadores, juntamente com Rosa Luxemburgo, da Liga Spartacista e do Partido Comunista da RDA, para que o Union ressuscitasse a 26 e janeiro de 1966, numa cerimónia imponente na VEB Transformatorenwerk Oberschöneheide e comandada por um dos mais próximos camaradas de Liebknecht, Hans Modrow, primeiro-secretário do município de Köpenick que, mais tarde, ficaria para a História como o último primeiro-ministro da República Democrática da Alemanha.

Muitas figuras poderosas, a começar por Kabel Werner Otto, o presidente de uma das maiores vendedoras a retalho do mundo, a Otto GmbH, e da VVB Hochspannungsgeräte, uma metalúrgica em franco movimento, resolveram dedicar o seu tempo e o seu dinheiro ao Union que, de forma absolutamente frustrante viram o seu inimigo de estimação, o Dínamo de Berlim, o clube da Stasi, ganhar 10 campeonatos consecutivos. Em 2019, o pesadelo acabou e a vingança foi dura. O Union tornou-se na primeira equipa de Berlim Leste a chegar à Bundesliga, libertando-se da medíocre rivalidade com o Dínamo. Agora atingiu um ponto em que já nem rivalidade há. Apenas uma superioridade esmagadoraa.