Várias regiões do Norte em risco de seca severa

Setor agrícola afetado pela falta de chuva. Mas não só: tem sido “maltratado” pelo Governo, diz CAP. É preciso “corrigir erros do passado” e não esquecer as alterações climáticas. 

O fim de semana trouxe alguns aguaceiros dispersos e nalgumas regiões o céu passou de azul a nublado. É época de chuva, sim, mas quase não chove. E a continuar assim até ao final deste mês, algumas regiões do Norte do país podem ficar numa situação de seca severa, alerta o Instituto Português do Mar e da Atmosfera. A chuva que caiu em dezembro foi escassa. “Era preciso muito mais para retirar grande parte do território do continente da situação de seca meteorológica”, diz ao i o IPMA. Janeiro está no mesmo caminho e não parece dar sinais do contrário.
A falta de água, em particular nas barragens, causa problemas ao setor agrícola e a todos os trabalhadores da área, assim como no setor energético. Mas não é a única dificuldade.

Agricultura foi “maltratada” Luís Mira, da Confederação dos Agricultores em Portugal (CAP), queixa-se de que o Governo abandonou o setor. As temperaturas são um problema. Mas também são a ponta do icebergue. “A realidade é que tem havido falta de chuva e essa situação tem sempre um impacto nas atividades agrícolas. Estamos a meio de janeiro. À medida que que as semanas passam e não chove, o problema só se agrava, porque a altura da chuva seria agora. Não é em maio ou em junho que irá chover, certamente. Não posso dizer que há um grande problema com algum caso específico, mas é verdade que há falta de água nas barragens”, afirma o secretário-geral da CAP, que espera – em nome de todos os agricultores e de todos os que ficam afetados com a questão – que a situação mude nas próximas semanas, visto que é um tema que preocupa todos os trabalhadores da área.

A CAP convidou os partidos a juntarem-se na sede da organização, na quarta-feira passada, para debater o que cada um defende para o setor. Abriu, porém, duas exceções: o PAN e o Bloco de Esquerda. “Não convidámos esses dois partidos porque as propostas que têm nos seus programas eleitorais para a área são contra o setor agrícola, contra a pecuária e são contra tudo. O tempo de debate iria ser perdido. E não era esse o objetivo”, justifica Luís Mira. 

Outros problemas do setor Aquilo que neste momento preocupa mais os agricultores que estão espalhados por todo o país, diz o responsável, é a falta de iniciativa do Governo para a aprovação de projetos de investimento destinados para toda a política agrícola comum e a falta de preocupação pela agricultura e pelo mundo rural. “Não se ouve os líderes dos partidos a falar sobre estes temas. Contam os votos nas cidades e esquecem-se do interior do país”. Para não falar das alterações climáticas, que “não podem ser esquecidas”, defende. “É preciso haver uma estratégia para a água a médio e a longo prazo – o que não existe. Aquilo que o Governo prevê no Plano Nacional de Água é uma coisa insignificante para as necessidades que há hoje em dia”. De uma forma geral, o secretário-geral da CAP conclui que os agricultores “sentem-se abandonados pela ministra da Agricultura”. A burocracia, continua, “é enorme” e a área foi “maltratada em todas as perspetivas”.

O que é preciso fazer Para haver mudança é necessário começar pelo início. Luís Mira defende ser essencial refletir e corrigir “os erros” que foram cometidos por este Governo, como “a retirada das florestas do Ministério da Agricultura, a retirada dos animais da CAP, e a retirada da gestão da água do setor agrícola”. São matérias que, do ponto de vista da Confederação dos Agricultores de Portugal, têm de ser corrigidas. “Todos os partidos que estiveram presentes na conferência clarificaram que irão corrigir estes erros – se forem Governo”, salienta. À exceção do PS, que “não disse nada”.

Olhar para trás O secretário-geral da CAP olha ainda para o passado e compara a situação atual com o período da Revolução dos Cravos. “Desde o 25 de abril que o Ministério da Agricultura não tinha uma representação tão diminuída e tão enfraquecida. O Ministério chegou a ter três secretarias de estado: a da Agricultura, a da Pesca e a do Desenvolvimento Rural e a das Florestas”, lembra. Há, portanto, uma distribuição de áreas entre o Ministério da Agricultura e do Ministério do Ambiente que considera não ser justa. “O Governo tem uma estratégia de dar mais poder ao Ministério do Ambiente e não perceber que, no que diz respeito às questões ambientais e quem mais pode construir para melhorar a biodiversidade, não é esse ministério, mas sim o da Agricultura – com uma diretriz e com uma política construtiva”, continua Luís Mira. Hoje, o que o Governo fez foi “retirar essas competências para o ministério ambiente”. O resultado? “A desflorestação em Portugal praticada nos últimos anos é maior do que era antes”, aponta.

E seguir em frente Para salvaguardar os interesses do setor agrícola e melhorar a política ambiental nacional, “é necessário colocar os fundos comunitários à disposição dos agricultores”, defende. O secretário-geral da CAP conclui dizendo que “nunca existiu um desinteresse tão grande em encontrar soluções”. E as decisões são tomadas “sem se ouvirem as organizações”.

Luís Mira toca também na importância da digitalização para a evolução do setor agrícola e alerta que o Plano de Recuperação e Resiliência “deixa toda essa fatia para os Serviços do Estado”. 

Altas temperaturas Numa altura em que se vive pleno verão no hemisfério sul, praticamente toda a Argentina e países vizinhos estão a atravessar os dias mais quentes alguma vez registados, avisou Cindy Fernandez, do Serviço Meteorológico Nacional argentino. E não são apenas os seres humanos que notam as diferenças de temperaturas: uma praga de besouros invadiu a cidade de Santa Isabel. Os insetos reproduziram-se de forma muito rápida depois dos termómetros não estarem a querer baixar. As altas temperaturas, dizem os especialistas, ajudam na reprodução de insetos durante esta época do ano.