As dezenas e centenas de votos que mudaram o panorama das eleições

Em Bragança, apenas 15 votos tornaram o PS, pela primeira vez, no partido maioritário nesse círculo eleitoral. Em Portalegre, pouco faltou para o PSD eleger um deputado, e em Lisboa, o CDS-PP falhou a conquista de um mandato por cerca de 2400 votos.

Conheceram-se, na noite de domingo, os resultados eleitorais que ditaram uma maioria absoluta socialista na Assembleia da República (a segunda na história, após a vitória de José Sócrates em 2005), e, de Norte a Sul, PS e PSD lutaram por alcançar lugares no Parlamento – em alguns locais, com uma folgada margem para os socialistas, e noutros, nem por isso. Os pequenos partidos, por sua vez, também lutaram pelos valiosos votos que, após passar pela quase ‘mágica’ fórmula do método de Hondt, ditaram quem irá ocupar os assentos da Assembleia da República.

De Bragança a Portalegre, e de Lisboa a Aveiro, foi por um punhado de votos que muitos candidatos ficaram fora do Parlamento, especialmente devido à forma como funciona este método.

Mas afinal, que regras segue esta ferramenta para eleger os deputados da Assembleia da República? A própria Comissão Nacional de Eleições (CNE) explica: O modelo de Hondt é “um modelo matemático utilizado para converter votos em mandatos com vista à composição de órgãos de natureza colegial”, que se caracteriza “pelo facto de o número de eleitos por cada candidatura concorrente a um determinada eleição ser proporcional ao número de eleitores que escolheram votar nessa mesma candidatura”.

Explicações disponíveis no website da CNE, onde esclarece: “O método aplica-se mediante a divisão sucessiva do número total de votos obtidos por cada candidatura pelos divisores (1, 2, 3, 4, 5 etc.) e pela atribuição dos mandatos em disputa por ordem decrescente aos quocientes mais altos que resultarem das divisões operadas. O processo de divisão prossegue até se esgotarem todos os mandatos e todas as possibilidades de aparecerem quocientes iguais aos quais ainda caiba um mandato”.

Cerca de 2400 votos ditaram fim do CDS por Lisboa Um dos pontos mais marcantes destas eleições legislativas foi a incapacidade do CDS-PP de eleger um único deputado para representar as suas cores na Assembleia da República. No círculo eleitoral lisboeta, segundo os cálculos que o i fez, o partido centrista ficou a cerca de 2.400 votos de conquistar um mandato – que neste caso seria ocupado por Francisco Rodrigues dos Santos, cabeça de lista por Lisboa.

Em termos globais, no círculo eleitoral da capital, onde são eleitos 48 mandatos para o Parlamento, foi Inês Sousa Real a deputada eleita com menos votos. 23.577, mais cerca de 4 mil que Francisco Rodrigues dos Santos.

O distrito onde o partido centrista conquistou o seu melhor resultado foi Viana do Castelo, com uma obtenção global de 3.36% dos votos. Ainda assim, muito longe dos 34.17% do PSD, que, em conjunto com o PS (42.06%), conquistou os seis mandatos elegíveis neste círculo eleitoral.

Aliás, Lisboa foi o sítio onde os centristas estiveram mais perto de conquistar o mandato que lhes fugiu, e que os deixou fora do Parlamento.

“O CDS morreu ontem, sem oportunidade de passar pela última estação”, lamentava ontem António Pires de Lima, ex-dirigente do partido, numa publicação do Facebook.

Bragrança renhida Bragança foi um dos distritos que mais marcou estas eleições legislativas, já que a maioria socialista conquistada neste círculo eleitoral – a primeira da história – foi decidida por… 15 votos. A secretária de Estado das Comunidades Portuguesas, Berta Nunes, segunda na lista de candidatos socialistas pelo distrito transmontano, foi a feliz eleita para ocupar um lugar no Parlamento, graças a esses 15 votos de vantagem.

Os socialistas conquistaram 40.30% dos votos em Bragança (26.495 votos), ao passo que os social-democratas não passaram dos 40.28% (26.480 votos). Uma diferença de 0.02% que significou a inédita vitória ‘rosa’ num distrito tradicionalmente ‘laranja’. Uma vitória que espoletou críticas do lado do PSD, que admitiu mesmo pedir, na Assembleia Geral de Apuramento, um esclarecimento sobre os resultados eleitorais neste círculo eleitoral.

Jorge Fidalgo, do PSD, adiantou à Lusa que “não está a pôr em causa os resultados”, mas sim um “esclarecimento”, procurando “evidenciar que não bate certo, esta informação”.
 
Uma unha negra em Portalegre Uma situação semelhante ocorreu no distrito de Portalegre, onde os socialistas conquistaram os dois mandatos elegíveis neste círculo eleitoral, com 47.21% dos votos. Neste caso, no entanto, a luta pela vitória global no círculo eleitoral não foi renhida, mas sim a conquista do segundo mandato elegível. Não foram 15 os votos que deram aos socialistas esta maioria, mas cerca de 200. Se é verdade que, no resultado total do distrito, o PS conquistou 25.271 votos, mais 12.839 que o PSD, a realidade é que, caso os social-democratas tivessem garantido apenas mais cerca de 200 votos neste círculo eleitoral, teriam conseguido eleger, pelo menos, um deputado, graças à maneira como funciona o método de Hondt.

Leiria socialista Um dos distritos que mudou a sua cor política predominante, entre 2019 e 2022, foi Leiria, onde os socialistas conquistaram cinco deputados, ao passo que o PSD não foi além de quatro. Em termos percentuais, no entanto, o PS – que conquistou 35,73% dos votos – teve apenas 1,05 pontos percentuais de vantagem perante os social-democratas, que alcançaram 34,68%. Uma diferença bruta de 2475 votos que ditou a primeira maioria socialista neste distrito desde que há memória.

Vila Real renhida Se a luta eleitoral entre socialistas e social-democratas foi renhida em Bragança, no distrito vizinho de Vila Real a realidade não foi muito distante. O PS conquistou três dos cinco mandatos elegíveis neste círculo eleitoral, ficando o PSD com os outros dois. A diferença percentual no total de votos foi de apenas 1,28%, entre os 41,29% do PS e os 40,01% do PSD.

Aveiro diz adeus ao BE Um dos grandes derrotados das eleições legislativas de 2022 foi o Bloco de Esquerda, que viu o seu número de deputados eleitos ser reduzido de 19 (eleitos em 2019) para apenas cinco. Os bloquistas foram ‘dizimados’ nestas eleições legislativas, e um dos sítios onde perderam – proporcionalmente – mais deputados foi em Aveiro. A Veneza Portuguesa disse adeus ao Bloco de Esquerda, que em 2019 tinha conseguido eleger dois deputados neste círculo eleitoral, falhando a conquista de qualquer mandato em 2022.

Segundo as contas do i, o Bloco ficou a cerca de 1300 votos de conquistar, no mínimo, um mandato neste distrito. Os aveirenses, por sua vez, que também se despediram do CDS-PP nestas eleições (em 2019 elegeram um deputado centrista), deram um lugar no Parlamento a Jorge Manuel de Valsassina Alveias Rodrigues, cabeça de lista do Chega neste distrito do litoral português.