Mais nascimentos em janeiro depois do ano com a menor natalidade de sempre

Há mais nascimentos nas maternidades do SNS e uma subida de 15% nos testes do pezinho, mas subida pode não ser tão expressiva. “Historicamente, sabemos que depois de uma crise existe um boom. Se poderá ser isso ainda não sabemos”, diz ao i o obstetra Diogo Ayres de Campos.

Depois de 2021 ter sido o ano com menos nascimentos de sempre em Portugal, pela primeira vez menos de 80 mil, os primeiros dados de janeiro apontam para alguma recuperação, para já vista com cautela mas mais animadora do que o cenário com que fechou o último ano. O primeiro barómetro da natalidade costuma ser o balanço dos testes do pezinho, a análise genética feita nos primeiros dias de vida dos recém-nascidos, já que dados oficiais de nascimentos são conhecidos com maior desfasamento. E são esses os dados nacionais disponíveis: em janeiro foram estudados 6482 recém-nascidos no âmbito do Programa Nacional de Rastreio Neonatal do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, mais 836 do que em janeiro de 2021, o janeiro com menos nascimentos de sempre em Portugal – o que viria acontecer noutros meses do ano ao ponto de, somados os 12 meses do ano passado, terem nascido quase menos 7 mil crianças no país do que no ano anterior.

Ao i, o INSA, que sublinha sempre que estes são dados de bebés estudados e não um balanço dos nascimentos, explica por que motivo é preciso cautela na análise: é que este primeiro balanço do ano inclui ainda bebés que nasceram nos últimos dias de 2021 e só fizeram o teste do pezinho em 2022, por isso a subida real do número de nascimentos pode não ser tão expressiva – e será preciso que se mantenha para trazer um balanço melhor do que o do ano passou, sendo que os números de janeiro ainda ficam aquém dos anos anteriores.

Mas os sinais de uma primeira recuperação da natalidade no arranque de 2022 sentem-se também nas maternidades, diz ao i Diogo Ayres de Campos, diretor do Serviço de Obstetrícia do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte e presidente da Federação das Sociedades Portuguesas de Obstetrícia e Ginecologia. Por agora sem dados globais dos nascimentos, o médico remete para uma boa amostra: os dados do Consórcio Português de Dados Obstétricos, que não cobrindo a atividade de todas as maternidades do país, engloba 13, entre as quais as maiores no SNS, e faz uma análise detalhada mensal de cerca de 30% dos nascimentos que ocorrem em Portugal.

Os números de janeiro de 2022, ontem disponibilizados, confirmam que neste universo de 13 maternidades de Norte a Sul do país houve um aumento significativo dos nascimentos face ao primeiro mês de 2021. Contam-se ao todo 2090 nascimentos, quando em janeiro de 2021 tinham sido apenas 1388. Diogo Ayres de Campos concorda que é cedo para conclusões, até porque há flutuações mensais que podem não coincidir todos os anos. “Os últimos meses do ano passado foram francamente maus e temos tido mais partos agora. Sabemos historicamente que depois de um período bélico e de uma situação de pandemia há um boom de nascimentos. Se este janeiro pode ser reflexo disso ou coincidência ou não sabemos. Mas sabendo que os partos de janeiro dizem respeito a bebés de nove meses anteriores, finais de março e abril, quando tinha passado a fase mais difícil da pandemia, pode haver essa ligação, mas é precoce tirar conclusões apenas com um mês”.

Antes de 2021, com um mínimo histórico de 79.692 nascimentos em Portugal, o ano com menos nascimentos tinha sido 2014, no auge da crise económica, quando caíram para 82 mil. Depois foi um iô-iô, sem nunca voltarem a ser mais de 90 mil, barreira ultrapassada pela última vez em 2011. Os nascimentos subiram ligeiramente em 2015 e 2016, voltaram a baixar em 2017, subiram em 2018 e os últimos dois anos foram sempre a descer, com renovados alertas sobre o inverno demográfico no país, trajetória que levará Portugal a perder nas próximas décadas dois milhões de habitantes, aumentando o rácio de idosos por jovens. Segundo as projeções do INE, feitas pela última vez antes da quebra de natalidade dos últimos anos, Portugal poderá ficar pela primeira vez abaixo dos 10 milhões de habitantes no início da década de 40, realidade que os dados dos últimos Censos indiciam que pode chegar mais cedo. Para que a reposição populacional seja assegurada, a taxa de fecundidade não pode ser inferior a 2,1 filhos por mulher em idade fértil, patamar atingido pela última vez em Portugal em 1982.