Por que razão Marcelo Rebelo de Sousa condecora os atletas portugueses que obtêm vitórias além-fronteiras, e a generalidade do país aplaude?
Por uma razão chamada ‘orgulho nacional’.
Que está na massa do sangue dos naturais de qualquer nação (veja-se o que está a acontecer na Ucrânia)
Mas, sendo isto óbvio, que partido nos últimos 20 ou 30 anos falou do ‘orgulho nacional’ e o assumiu?
Apenas um – e mesmo assim recentemente.
Pior: forças políticas, como o BE, empenharam-se não só em demolir esse orgulho como em diabolizar a História de Portugal – apresentando os portugueses como um povo de salteadores que durante séculos saquearam territórios noutros continentes.
E ninguém contestou – até há pouco.
Isto, entre outros fatores, ajuda a explicar o sucesso do Chega.
Nenhum povo gosta de ser amesquinhado.
Além disso, o Chega empenhou-se em exaltar valores como a família, a hierarquia, a autoridade e a ordem.
Dir-se-á que são valores ‘ultrapassados’.
São-no, de facto, numa perspetiva de esquerda.
A esquerda ataca o nacionalismo porque é ideologicamente internacionalista: «Proletários de todos os países, uni-vos!».
A esquerda ataca a família porque quer ter os cidadãos dependentes do Estado – e a família constitui a primeira e mais importante rede de educação e assistência social.
O Estado quer ter o exclusivo da assistência, como quer ter o exclusivo da educação; tudo o que seja libertar as pessoas da tutela do Estado é mal visto pela esquerda.
A esquerda não gosta da hierarquia, porque defende a igualdade – e a hierarquia é o contrário da igualdade.
Nacionalismo, família, hierarquia são três ideias que a esquerda tem combatido nas últimas décadas.
E quem apareceu a defendê-las na direita?
O PSD não, porque é um partido basicamente sem ideologia, defensor da democracia, da liberdade e do liberalismo económico, mas sem uma pauta de valores.
O CDS também não, porque pareceu sempre envergonhado da sua condição de partido mais à direita, complexado, com medo de se assumir.
O Chega foi, assim, o primeiro a ter a coragem de o fazer.
De dizer alto e bom som coisas que muita gente sentia ou pensava mas que nenhum partido verbalizava.
E isto revelou-se determinante.
Mas agora, com o crescimento verificado nas últimas eleições, o que vai acontecer ao Chega? – é a pergunta que muitos fazem.
O partido está numa encruzilhada; e duas coisas, a meu ver, podem acontecer: ou continua a crescer ou afunda-se.
Dificilmente ficará como está.
E atrevo-me a dizer uma coisa escandalosa: o Chega pode substituir o PSD como o principal partido da direita.
Porquê?
Porque, com a maioria absoluta do PS, a política portuguesa evoluirá para a bipolarização, com a existência de dois grandes blocos: um bloco de esquerda, liderado pelo PS, e um bloco de direita, liderado por quem se mostrar mais capaz de o fazer.
Ora, se o PSD revelar a indefinição que tem revelado, não sendo carne nem peixe, pode ter o mesmo destino do CDS – e tornar-se rapidamente um partido pouco atrativo e irrelevante.
Quanto à IL, não a vejo com capacidade para liderar um bloco de direita – pois, além de ser muito elitista, a nível doutrinário não é de direita.
Resta, portanto, o Chega.
Perante uma sociedade em que muitos cidadãos se mostram confusos, em que se perderam as referências, em que os valores tradicionais se afundaram, em que tudo está em causa – desde a pátria, à família, a certas regras ao nível dos costumes – o Chega pode oferecer um porto de abrigo consolador.
E tem um líder forte, capaz de galvanizar muitos eleitores.
Enferma, entretanto, de dois problemas: é demasiado radical, trauliteiro mesmo, e tem falta de massa crítica.
Enquanto o CDS tinha excesso de quadros, o Chega praticamente não os tem.
Assim, o seu desafio é, em primeiro lugar, tornar-se mais moderado sem perder a sua identidade; e em segundo lugar, apresentar um conjunto de propostas consistentes nos diversos campos – na educação, na economia, na fiscalidade, na cultura -, que lhe deem corpo e credibilidade.
Se for capaz de fazer estas duas coisas, poderá cavalgar o PSD e vir a liderar a direita.
Vejo hoje muita gente no PSD a dizer: «Devemos dialogar com todos, menos com o Chega».
Ora, dentro de não muito tempo, podemos estar na situação oposta: ser o Chega a não querer dialogar com o PSD.