D. Manuel Clemente diz que “só podemos rejeitar o aborto e a eutanásia e tudo quanto a tal possa levar”

Durante a missa do Corpo de Deus, o Cardeal Patriarca de Lisboa voltou a condenar a legalização da morte medicamente assistida e a interrupção voluntária da gravidez.

No decorrer da missa do Corpo de Deus, ontem, D. Manuel Clemente condenou mais uma vez a legalização da morte medicamente assistida e a interrupção voluntária da gravidez, defendendo a integralidade da vida, da conceção à morte natural.

Começando por esclarecer que “nesta solenidade do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo há muito a considerar, meditar e aprender. Tanto que nunca se abarca duma vez e cada ano nos revela algo de novo e mais profundo”.

“Correspondendo na prática ao que proclamamos, compreendemos também que celebrar a solenidade de hoje é levá-la à consequência necessária em tudo quanto cada pessoa nos requer, da vida à saúde, do pão à morada, do trabalho ao descanso”, explicou, adiantando que “estas mesmas circunstâncias humanas são também divinas, pela presença de Cristo que nos incorpora”. 

“É por isso que, juntando de novo a nossa voz à de tantas pessoas e instituições da sociedade civil e diversos credos, que requerem respeito legal e apoio concreto à vida mais frágil, só podemos e devemos rejeitar o aborto e a eutanásia e tudo quanto a tal possa levar, por falta de resposta solidária e pública a quem precisar de apoio e companhia”, frisou, sendo que, no passado dia 9 de junho, a proposta socialista da eutanásia foi aprovada no Parlamento após um debate acesso. 

Quem vai ao encontro da opinião de D. Manuel Clemente é José Maria Seabra Duque, membro da comissão política distrital do CDS e secretário da Federação Portuguesa Pela Vida, que disse, na passada segunda-feira, em entrevista ao i, que “não se tomaram medidas” quanto às urgências hospitalares “e, de repente, cada vez que o Parlamento abre, a grande urgência é a eutanásia!”. Na Suíça, entre os anos de 2009 e 2020, a associação Dignitas ajudou a morrer oito pessoas com residência em território português.

Para além disso, destacou que “aquilo que entretém o BE é a objeção de consciência à prática do aborto e parecem viver mais interessados nas suas batalhas ideológicas do que nos problemas concretos”, sendo que “os deputados vivem muito mais preocupados em discutir a morte do que a vida”.

Recorde-se que, no início deste mês, dados provisórios da Direção-Geral da Saúde (DGS) indicaram que Portugal registou em 2021 o número mais reduzido de abortos desde que a interrupção voluntária da gravidez (IVG) foi legalizada, em 2007.

Foram realizados 11.640 abortos no ano passado, uma média de 32 por dia, e os números agora divulgados representam uma descida de 15,5% em relação ao ano anterior. Deste modo, o relatório de Análise Preliminar dos Registos das Interrupções da Gravidez mostra uma tendência decrescente do número de interrupções da gravidez até às 10 semanas desde 2011, quando foram registados quase 20 mil abortos.

“Ninguém desistirá de viver se não desistirmos de quem sofre” “Contrariamente ao que se diz, mais como os antigos gnósticos do que como cristãos autênticos, ninguém tem propriamente um corpo, porque já é em si mesmo um corpo, como polo de relação com os outros. Sabê-lo é também evitar muita distorção, no que se faça a si mesmo ou a quem quer que seja”, lembrou D. Manuel Clemente durante a missa que foi celebrada na Sé Catedral de Lisboa, de onde arrancou a tradicional procissão, que seguiu depois pelas ruas da Baixa.

“Porque dizer ‘corpo’ é dizermo-nos a nós e dizermos os outros, com toda a dignidade pessoal de cada um, da conceção à morte natural, saudável ou mais carente de cuidados, inviolável sempre. Ninguém desistirá de viver se nós todos, pessoal e comunitariamente, não desistirmos de quem sofre”, alegou o dirigente que, já no passado mês de abril, defendera que a sociedade deve assumir como prioridade a “promoção da vida”, defendendo-a em todas as etapas da existência.

“Nem em relação ao aborto nem em relação à eutanásia, caso se venha a aprovar, a sociedade pode desistir de caminhar no sentido da vida e de ser consequente. Não são batalhas perdidas, a causa da vida é uma frente constante”, referiu o convidado da entrevista semanal conjunta Renascença/Ecclesia, publicada e emitida em cada domingo.

“É sempre do realismo cristão que falamos, nas várias aceções que comporta. Corresponder-lhe mais e concretizá-lo melhor é o sentido da solenidade de hoje, como esta tarde a levaremos à cidade”, observou.