Crédito à habitação: BdP rejeita incumprimento

Mário Centeno acena com a redução dos preços no mercado imobiliário residencial como um dos riscos para a estabilidade financeira. Redução do peso da dívida pública pesa.

O Banco de Portugal (BdP) rejeitou a perspetiva de aumento significativo do incumprimento no crédito habitação, com subida das taxas de juro, mas apontou a degradação das condições económicas das famílias como um dos riscos para a estabilidade financeira. A garantia foi dada por Mário Centeno, em conferência de imprensa, no Museu do Dinheiro, em Lisboa, na apresentação do relatório semestral de Estabilidade Financeira.

Já quando questionado se espera um aumento do incumprimento das famílias no crédito habitação, devido ao aumento das taxas de juro, uma vez que a maioria daquele tipo de crédito em Portugal é contratualizado com taxas variáveis, o governador do Banco de Portugal disse apenas que «a resposta breve é não». E acrescentou: «As questões de incumprimento, em especial de crédito à habitação estão muito relacionadas com o mercado de trabalho e o mercado de trabalho tem demonstrado uma capacidade de resiliência que poucos antecipavam». 

E a instituição apontou ainda para «uma redução dos preços no mercado imobiliário residencial, decorrente de alterações nas condições de financiamento», bem como o risco de o «rácio de dívida das administrações públicas em percentagem do PIB [Produto Interno Bruto] não prosseguir a trajetória de redução prevista, derivado da incerteza sobre a atividade económica e do aumento dos custos de financiamento». 

Em relação ao aumento das taxas de juro, nos próximos anos, tal deverá traduzir-se numa «melhoria da margem financeira dos bancos e num aumento do reconhecimento de imparidades e de perdas potenciais decorrentes da desvalorização dos títulos de dívida a justo valor».

Mário Centeno disse ainda que as projeções para a economia portuguesa «mostram uma evolução compatível com resiliência do mercado de trabalho, o que é muito positivo».

No relatório que foi divulgado esta sexta-feira, o banco central alertou para o risco de uma degradação das condições económicas das famílias, devido à «redução do rendimento disponível real devido à inflação e o efeito do aumento das taxas de juro sobre o serviço de dívida, aos quais acresce a incerteza relativa à evolução da atividade económica e do emprego».

O governador disse ainda que não ignorava que a normalização da política monetária, iniciada pelo Banco Central Europeu em dezembro de 2021, envolve um ciclo de subida de taxas de juro, «porque taxas de juro muito negativas não constituíam um ambiente favorável ao crescimento da economia e à estabilidade financeira, em particular se se perpetuasse durante um tempo longo», apontando, que é preciso garantir que existem «os instrumentos suficientes para suportar esta inversão no ciclo da política monetária».

Já em relação às empresas, o regulador destacou o aumento da probabilidade de incumprimento das empresas, devido ao enquadramento macroeconómico com pressões inflacionistas, como um dos principais riscos para a estabilidade financeira, «refletindo o efeito conjunto da vulnerabilidade financeira de algumas empresas, da recuperação incompleta da atividade e da rendibilidade de alguns setores no pós-pandemia, bem como o enquadramento macroeconómico e financeiro atual».

O documento publicado semestralmente aponta também algumas medidas que podem mitigar os riscos apontados, como a atuação dos bancos centrais, em particular do Banco Central Europeu (BCE) que já anunciou uma nova ferramenta anti-fragmentação, para evitar uma grande diferença das taxas de juro entre países.