O cerco a Moedas…

Sem a maioria do seu lado, Moedas, por muito hábil que seja, está condenado ao bloqueio sistemático dos seus compromissos eleitorais. A menos que dê um ‘murro na mesa’.

Ao trocar o conforto da administração da Fundação Gulbenkian pela candidatura à presidência da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Moedas sabia, de antemão, que estava a apostar numa incerteza sem rede.

Mesmo assim, teimou e ganhou, infligindo uma derrota a Fernando Medina e ao PS com a qual não contavam, e abrindo uma brecha importante na hegemonia socialista.

É de crer, no entanto, que Moedas tenha subavaliado aquilo que o esperava na governação da capital.

Medina entregou-lhe um município inchado de despesa e de funcionários, com um passivo avultado e uma legião de assessores regiamente pagos. Uma cidade abonecada para turistas, vistosa à beira rio, mas desmazelada no interior, caótica no trânsito e armadilhada com radares por todo lado – uma fonte permanente de indignação para os automobilistas, lisboetas ou não.

Para se ter uma ideia, apenas em um mês, depois dos radares entrarem em funcionamento, estes terão rendido, em números redondos, mais de 5 milhões de euros em coimas por excesso de velocidade. Uma mina.

Em contrapartida, as manchas de pobreza aumentaram, a habitação social marcou passo, enquanto os cidadãos com menos posses se ‘exilam’ nas periferias.

Dir-se-á que Moedas conhecia de cor o legado do antecessor, sem lugar para surpresas.

Mas é de suspeitar que tenha exagerado na sua boa fé e não previsse o cerco montado pela oposição, que conta com a maioria dos vereadores.

E sem a maioria do seu lado, Moedas, por muito hábil que seja, está condenado ao bloqueio sistemático dos seus compromissos eleitorais. A menos que dê um ‘murro na mesa’.

Alguns exemplos: por proposta do Livre, as esquerdas impuseram, em maio, a redução em 10kms. da velocidade máxima de circulação na malha urbana e, ainda, a eliminação do trânsito automóvel na Avenida da Liberdade, aos domingos e feriados.

A proposta é ‘dinheiro em caixa’ via radares e multas, além de ser uma patetice em relação à avenida da Liberdade. Mas não se pode esperar mais do partido de Rui Tavares e do seu sortido de assessores, que precisam de justificar a existência.

Em sua defesa, Moedas poderá invocar que a ideia dos novos radares não foi dele, e que até contrapôs uma consulta pública e estudos prévios, em vez da redução da velocidade.

Mas de pouco adiantará. O ónus da revolta dos munícipes, expostos à crueza das multas, recairá sobre Moedas, pois é sob a sua gestão que se circula a ‘passo de caracol’, ou se é vítima do zelo da polícia municipal.

Floresceu, entretanto, com Medina o negócio das trotinetas, bicicletas elétricas e afins, que invadiu a cidade sem ‘rei nem roque’. Andam pelos passeios, desrespeitam semáforos e, até, surgem em contramão, pondo em perigo peões e condutores. É o vale tudo.

Só em 2021, houve registo de quase três centenas de acidentes com estes velocípedes, para os quais não é exigida carta de condução, nem capacete, nem seguro. Uma balda.

De facto, a maioria dos devotos desta ‘mobilidade’ não se confina às ciclovias distribuídas a esmo pela cidade. Acham-se, sim, no direito de circular por onde lhes apetece ou lhes dá jeito.

Moedas ainda tentou corrigir asneiras em matéria de ciclovias – a começar pela Avenida Almirante Reis –, mas depressa intuiu que, para as esquerdas, era uma ‘bandeira’ inegociável. E adiou a ideia sine die.

Na habitação social, «um dos maiores desafios, senão o maior desafio» para Moedas, os resultados palpáveis evoluem, também, em marcha lenta, tal como o trânsito na cidade ou o contrato-programa de reabilitação dos bairros municipais.

A herança de Medina só agora começa a mostrar-se em plenitude, desde o projeto da Feira Popular, em Carnide, lançado em 2015 e que ficou em ‘banho-maria’. Um ‘buraco’ que transitou para Moedas, que prometeu, agora, um novo parque verde, «com equipamentos de lazer e desporto». Uma incógnita.

Até ver, as prioridades de Moedas continuam, em boa parte, no ‘congelador’, desde tornar Lisboa uma cidade «fiscalmente amigável», que não se deu por isso, até à «EMEL mais barata para os lisboetas». Outro tanto.

Aliás, na EMEL, o que se nota é uma sanha persecutória, que não poupa sequer os estacionamentos em zonas onde os parquímetros estão cronicamente avariados. A ‘caça à multa’ é o seu desporto favorito.

Ou seja, decorrido um ano, são poucas as medidas emblemáticas de Moedas que saíram do papel. E quando saíram – caso dos transportes gratuitos para jovens e idosos –, os burocratas de serviço arranjaram forma de complicar o acesso.

E já nem se fala das rasteiras, como a do monumento a Vasco Gonçalves, enquanto o Museu dos Descobrimentos permanece fechado na gaveta e tarda a recuperação do Parque Mayer, uma nódoa no coração de Lisboa.

Pelo ‘andar da carruagem’, se o presidente não for capaz de romper o cerco das esquerdas, acabará mal o mandato.